Terrorismo policial de Estado
contra a população
trabalhadora negra
Mais uma chacina de negros, trabalhadores e filhos de
trabalhadores. 5 jovens negros que comemoravam o primeiro salário que um deles
havia recebido foram metralhados covardemente, sem chance sequer de se
identificarem, pela Polícia Militar do Rio de Janeiro. Não importava quem eram,
eram negros e pobres. Isso bastava para que fossem condenados ao fuzilamento
sumário. Em seguida, a polícia não deixou que as pessoas que se encontravam no
local prestassem socorro, e fabricaram, como de hábito, os famosos “autos de
resistência” para justificar seus crimes. “‘Eles alteraram a cena do crime,
pegaram a chave do carro da mão do motorista morto, colocaram lá dentro uma
pistola para dizer que aqueles jovens eram bandidos’, disse um morador”. Em
seguida, também como de costume, diante da indignação nacional, principalmente
da população trabalhadora, o Estado capitalista mandante responsabiliza os
executores pelo crime.
Poucos dias antes, ganhou publicidade o massacre de 11
negros pobres por outro grupo de extermínio policial na capital do Ceará. Mas,
a maioria dos casos cotidianos, que ceifa anualmente vida de milhares de
jovens, não ganha qualquer popularidade e, pelo contrário, “torna-se natural”, e
é “justificado” pela mídia e pela classe média reacionária como uma reação
contra a “violência urbana”, e o genocídio se amplia com a redução da
maioridade penal, como uma instituição tácita da pena de morte sobretudo para
esse setor da população explorada e oprimida. As vítimas são as mesmas “de
sempre”. Os assassinos, também: a polícia, o Estado terrorista capitalista. A juventude rebela-se como pode, rolezinhos, ocupações de escola, protestos de rua, ... e aprende durante o combate. O
aparato repressivo policial não pode ser reformado,
"desmilitarizado", precisa ser extinto para que exista paz nos
bairros proletários, para que exista futuro para a juventude negra e
trabalhadora.
Abaixo reproduzimos um artigo do camarada Edimilson Rosário, publicado
no Folha do Trabalhador 25, acerca do genocídio negro.
O Estado atira, mas
quem legitima é a sociedade
Edimilson Rosário
De acordo com o Mapa da Violência, o Brasil tem mais de 56
mil assassinatos por ano. 77% das pessoas assassinadas são negras e 90% são
homens. Não se pode dizer que essas mortes ocorram por algum comportamento das
vítimas, pois o principal responsável por essa violência são as forças do
Estado que nos locais de moradia invadem atirando para todos os lados e
alvejando aqueles que eles consideram "criminosos em potencial". Por
esse motivo também não se pode dizer que trata-se de uma "guerra aos
pobres", como dizem alguns setores da esquerda, pois os escolhidos como
alvo não são pobres em geral, são os negros. Essa é uma política racial de
Estado. Um verdadeiro genocídio.
Outra vertente dessa política de extermínio é o
encarceramento em massa. O Brasil possui aproximadamente 700.000 pessoas
encarceradas, a terceira maior população carcerária do planeta. Quase 70% das
pessoas em condição de encarramento são negros, 60% homens. A maioria por
delitos de menor potencial ou sem sequer sem terem alguma condenação ou ainda
por uma suposta "guerra às drogas" que, na verdade, tem o objetivo de
legitimar uma política de fazer desaparecer a população negra pelo uso da
violência .
Encarceraento em massa além do puro e simples extermínio são
faces da política de genocídio racial que ocorre no Brasil de forma
naturalizada. E essa naturalização ocorre através do incentivo à cultura de
violência e culpabilização cotidiana contra negros de forma a legitimar as
ações racistas do Estado. Essa cultura permeia toda a sociedade e contamina até
mesmo os movimentos sociais.
A persistência das ideias lombrosianas
Lombroso foi um médico e criminologista italiano que
defendia o desaparecimento dos negros. No no final do século XIX ele formulou a
tese de que os criminosos teriam uma propensão genética para a prática da
violência. O perfil do criminoso nato descrito por ele era de características
negras. Apesar de essa tese ter se mostrado sem quaquer fundamento, acabou
criando raízes tão profundas na cultura que produz efeitos até os dias de hoje
através da prática policial e através do medo negro disseminado na sociedade.
No dia a dia da sociedade o negro é visto como um elemento
perigoso que deva ser afastado. Ao ver um homem negro pessoas atravessam a rua,
muitas vezes para perto de alguém branco, e reclamam da falta de policiamento;
Empresas raramente contratam negros para o desempenho de determinadas funções
que requeiram lidar com o público; jovens negros na rua são vistos como
potenciais criminosos... toda essa visão é estimulada pela pelo Estado e pela
grande imprensa. Recentemente a Polícia Militar de São Paulo divulgou uma
cartilha orientando as pessoas a tomarem cuidado com assaltos e o perfil do
assaltante típico, conforme descrito nessa cartilha, era o homem negro. Na
mesma época uma empresa de táxi do Rio de Janeiro lançou uma peça de
publicidade tentando convencer principalmente as mulheres de que andar de táxi
seria uma maneira segura de se precaver contra estupros e assaltos. O perfil do
assaltante estuprador em potencial era o homem negro.
Nos movimentos sociais, que deveriam ter uma prática
progressista, o lombrosianismo se observa através das manifestações do
punitivismo. Em cerca de 40 casos acompanhados em todo o Brasil de acusações
morais e expulsão dos fóruns do movimento, 32 dos acusados eram homens negros,
mesmo estes sendo minoria nos espaços do movimento. Nos casos acompanhados as
acusações eram todas graves, mas sem qualquer indício de serem verdadeiras.
Ainda assim foram suficientes para legitimar punições sumárias. Essa tendência
de até mesmo os movimentos sociais a todo momento culpabilizarem e condenarem
os negros sem sequer qualquer chance de defesa demonstra o quanto as idéias do
lombroso e o mito da raça perigosa, ou até mesmo o puro e simples desejo de ver
negros distantes e sem qualquer condição de assumir qualquer protagonismo,
criou profundas raízes na esquerda pequeno burguesa.
Essa cultura geral que permeia a sociedade é o que dá
legitimidade para que o Estado pratique a política de genocídio racial. Portanto,
a reivindicação pelo fim do genocídio deve ser dirigida contra o Estado,
inclusive através da disseminação de uma cultura de auto defesa negra, mas deve
ser também cobrada de cada pessoa que pratique ações legitimadoras do genocídio
na sociedade, principalmente nos fóruns de esquerda.
A responsabilidade da esquerda pequeno burguesa
Nesse aspecto, a esquerda pequeno burguesa possui uma
responsabilidade extra pois tem sucumbido completamente às reivindicação pelo
fortalecimento do aparato genocida.
O pretexto sustentado por essa esquerda de que existem
inúmeras "opressões" e todas elas iguais ao racismo, ou seja, sem
hierarquia entre si, tem duas consequêncais criminosas. A primeira delas é
fazer renascer o mito da democracia racial que o movimento negro desmascarou a
duras penas. De acordo com esse mito, no Brasil não haveria diferença de raças
e todos seriam iguais. Essa ideia está a serviço de esconder a existência do
racismo. A falácia da existência de infinitas opressões sem qualquer hierarquia
entre si acaba igualmente jogando o racismo para de baixo do tapete na medida
em que iguala o negro a um infinito número de setores que se apresentam como
igualmente oprimidos. De acordo com essa tese qualquer pessoa poderia se
enquadrar em alguma categoria de "oprimido" sendo que todos teriam
poder para ao mesmo tempo praticar ou sofrer opressão. Para sustentar essa tese
desvirtuam o conceito de opressão igualando-a a a qualquer preconceito. Assim,
o negro teria poder na sociedade de oprimir a mulher, o gay, o portador de
alguma limitação física, o que tem cabelo verde, o que tem dificuldade de fala
... Ocorre, porém, que racismo é algo muito pior do que qualquer preconceito.
Apenas para exemplificar, racismo leva e está levando ao extermínio. Não
existe, porém, extermínio de nenhum outro setor social que não o negro, por
mais que esses outros segmentos possam sofrer algum tipo de violência
diferenciada. Na verdade quem é exterminado e é maioria em todos os indicadores
de desvantagem social é apenas o negro. É uma realidade que joga por terra o
conceito de inexistência de hierarquia de opressões que tem os mesmos efeitos
que o mito da democracia racial.
A segunda consequência dessa falácia que ganhou força na
esquerda pequeno burguesa está diretamente relacionada ao genocídio.
A tese de que existem múltiplas opressões, tem sido usada
para legitimar que o Estado combata essas opressões usando o seu aparato
genocida. Por isso, quase todos os movimentos dessa esquerda, dizendo querer
combater a sua "opressão" particular, revindicam a criação de mais
leis criminalizadoras e o fortalecimento do aparato policial. Ou seja,
reivindicam mais armas para a polícia e mais leis penais que serão usadas única
e exclusivamente para que existam mais e mais desculpas para se encarcerar e
matar injustamente aqueles que sofrem o genocídio,os negros. Tudo isso é
elemento de legitimação do genocídio e é o que acontece invariavelmente quando
setores brancos começam a tentar se passar por tão oprimidos quanto os negros.
A maior violência que existe hoje na sociedade é o genocído
negro. Maior em dados estatísticos e maior também por ser a morte uma violência
incomparável a qualquer outro tipo. Porém o genocídio negro também é a maior
violência porque para que ele seja legitimado, impõe uma cultura que leva a
sociedade a praticar de forma generalizada diversas outras formas de violência
contra o negro. Tudo isso invisibilizado e tratado como algo tão normal que a
sociedade tem dificuldades até mesmo de enxergar que ocorra um genocídio racial
no Brasil, ainda que o número de negros vítimados seja maior do que o número de
mortos na maioria das guerras que ocorrem pelo mundo. Se o racismo da sociedade
lhe impede de enxergar o genocídio, muito mais não será capaz de ver outras
formas de violência diária contra negros, com a violência psicológica, o terror
da culpabilização e acusação constante.
Se essa violência toda ocorre até mesmo dentro dos
movimentos que discutem a sociedade de forma crítica... Imagine o que ocorre
nos outros espaços.