Esperanto e Marxismo
Alexandre Magalhães
La Permanenta Revolucio - Jornal trotskista em Esperanto publicado entre 1935-36. Orgão da propaganda bolchevique-leninista e da IV Internacional [ 1 ] |
Os revolucionários marxistas sempre tiveram um princípio
inabalável: o internacionalismo. Trotsky a vida toda lutou contra a
pseudo-teoria stalinista do "socialismo num só país", visto
que, por sua própria natureza, tanto econômica quanto política, o socialismo
precisa ser implantado no mundo todo. Não é por nada que o lema final do
Manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels é "proletários de todos os países,
uni-vos".
Marx prenunciou no Manifesto que, com o avanço da
tecnologia, particularmente dos meios de comunicação, criariam uma contradição
para a burguesia, pois os operários adquiririam meios de entrar em contato uns
com os outros com mais facilidade e em distância cada vez maiores. Esta
previsão se cumpriu de forma absolutamente fidedigna, com as redes sociais,
celulares, televisão e toda profusão enorme de meios eletro-eletrônicos de
comunicação em massa.
Um dos maiores, senão o maior, obstáculo ao intercâmbio de
relações de militantes de diversos países é o fator linguístico. As diferentes
línguas muitas vezes criam barreiras intransponíveis entre as pessoas, o que
causa um grande prejuízo, não só às questões do movimento operário, mas no
âmbito da cultura, das artes, das relações humanas em geral.
As diferentes línguas criam "barreiras", termo que
se tornou usual. Mas em cada época, a potência econômica exerceu o domínio da
"língua internacional". Sempre houve, em particular para o comércio,
a necessidade de uma língua de entendimento comum para a realização dos
negócios; a potência militar-econômica acaba impondo sua língua, e com ela
aspectos de sua cultura e modo de vida. Assim foi com o grego
"koiné", com o latim, com francês e atualmente com o inglês.
Pululam argumentos sofismáticos para defender o inglês como
língua de intercâmbio mundial.
O primeiro é de que ela é a "língua mais fácil do
Ocidente". Pode até ser que o inglês seja uma língua pobre, mas não é
fácil; a suposta facilidade vem do fato que estamos constantemente imersos em
um mundo anglófono, com filmes e músicas neste idioma, o que facilita em muito
o aprendizado. Para nós brasileiros, seria muito mais fácil utilizar espanhol
ou italiano, por exemplo. Resta por evidente que o inglês é a língua dominante
no mundo porque os Estados Unidos são a grande potência mundial, impondo
hegemonia econômica e também cultural.
O sonho de uma língua "neutra", isto é, que
não fosse imposta pela questão econômica ou militar, é antigo, sempre soou como
uma "utopia". Não se acreditava na possibilidade de, de forma "artificial"
ou "inventada" seria possível criar um idioma funcional.
Esta realidade caiu por queda pelas mão de um homem com
habilidades especiais para com línguas, o médico judeu polonês Ludwik Zamenhof.
Essa personalidade singular conseguiu um feito que parecia impossível: criou,
sistematizou e popularizou uma língua de sua autoria, que ganhou o apelido de
"Esperanto", que quer dizer "esperança".
Desde os primeiros dias o Esperanto foi alvo de ataques, às
vezes violentos, de pessoas interessadas em manter o domínio cultural da
potência política hegemônica. Naquela época, final do século XIX, o inglês
despontava o mas o francês mantinha-se como língua mundial.
O argumento de que o Esperanto é uma língua "artificial"
é facilmente desmontável. Ele não é "artificial", mas um idioma
PLANEJADO, o que é razoavelmente diferente. Zamenhof chegou a tentar uma língua
artificial baseada em monossílabos; não deu NADA certo. Foi então que ele
baseou-se em um sistema que ele mesmo inventou, com 16 regras fixas e
imutáveis.
Se há uma crítica se fazer ao Esperanto é seu eurocentrismo.
Infelizmente, Zamenhof tinha que partir de algum lugar, e partiu daquilo que
sabia: línguas europeias. Por isso o Esperanto vem de radicais latinos, gregos,
eslavos e anglo-saxões. Mesmo assim, para um oriental, é 10 vezes mais fácil
aprender Esperanto do que inglês. Esperanto não tem conjugação verbal; inglês
tem. Esperanto não tem variação fonética; inglês tem.
Agora existe o grande argumento do "inglês
fácil". Esse argumento é derrubado em si mesmo e também ajuda a
espancar mais ainda a tese da "artificialidade" do Esperanto.
Primeiro teve se ter em conta que existem vários "inglêses"
e não um só. Existe aquele - ou aqueles - que são falados nos Estados Unidos.
Existe os falados na Grã Bretanha, cujo mais famoso é o da Inglaterra, mas há
as variantes escocesas e irlandesas. Esses são idiomas NACIONAIS, NATURAIS.
Mesmo assim, possuem diferenças grandes entre si, mesmo que não são dialetos,
pois há mútua compreensão.
O fato mais "atípico" é que, sendo o inglês a
língua franca internacional, surgiu "mais um inglês", o chamado
"Simple English", que é o inglês que aprendemos nos cursos
de idiomas, e aquele que usamos quando dois estrangeiros falam inglês. E este
fato empírico comprova algumas coisas. Dois estrangeiros que falam o "Simple
English", cheios do seus sotaques nacionais, compreendem-se melhor
que um estrangeiro falando com um norte-americano ou britânico. Isto é, surgiu,
TAMBÉM COM PLANEJAMENTO, uma língua franca que não tem uma raiz FIXA nacional;
nenhum país fala Simple English; ELE É O INGLÊS INTERNACIONAL. Os outros são
tão nacionais como qualquer língua, e muitas vezes, para o falante de uma
língua neolatina, é praticamente impossível compreender um norte-americano,
visto que as nossas línguas são silábicas, e o inglês nativo dos EUA
absolutamente não. Os estrangeiros "sibilizam" o inglês, como
também fizeram os falantes anglófonos na Índia.
Mais argumentos desmontam a tese da inviabilidade de uma
língua planejada. O idioma oficial da República Federal da Alemanha é conhecido
internacionalmente somente como "alemão". O que muitos não sabem
é que esse "alemão" é UM TIPO DE ALEMÃO, conhecido como o "Alemão
Oficial", ou Hochdeutsch, o chamado "Alto Alemão". Esse
idioma até é falado desde criança por algumas regiões alemães, mas são minoria
diante da profusão de dialetos. Sua "base" é a Bíblia de Lutero, ou
seja, foi de onde foram tirados os "paradigmas de planificação do Hochdeutsch".
Nem por isso ninguém critica o alemão.
O uso sistemático de uma língua fanca como o Esperanto não é
um ato "revolucionário" em si mesmo, como poderiam pensar alguns
pseudo gramscianos. Ele é uma ferramenta de comunicação entre
internacionalistas, que poderia ser ensinada nos partidos, pois são necessários
em média oito meses para um domínio razoável da língua.
Nota:
1. https://www.marxists.org/esperanto/sat/permanenta-revolucio/index.htm
Nota:
1. https://www.marxists.org/esperanto/sat/permanenta-revolucio/index.htm