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terça-feira, 20 de outubro de 2015

MARXISMO E ANARQUISMO II

O golpe militar na fortaleza de Kronstadt 
Reproduzimos abaixo uma elaboração do camarada turco Zuo Lecra, a qual consideramos a mais completa refutação marxista dos mitos anarquistas e liberais sobre Kronstadt e Makhno fabricados contra o bolchevismo
A rebelião de Kronstadt é, sem dúvida, um dos episódios mais explorados pelos oportunistas de todos os matizes políticos para atacar Lênin e Trotsky e assemelhá-los à figura grotesca de Stálin. Os críticos identificam os elementos desmoralizados que tomaram parte na rebelião como "revolucionários", porém, não é o que confirma as centenas de documentos encontrados por diversos historiadores - entre eles burgueses e anarquistas. Esses indivíduos tomaram o poder de uma fortaleza fortemente armada e fizeram numerosos reféns, encarcerando-os e ameaçando-os de morte; mantiveram até mesmo contato com as forças Brancas situadas no estrangeiro. A maioria dos anarquistas proclamou a rebelião como uma "Terceira Revolução", não há dúvida que se os bolcheviques tivessem esperado um pouco mais para sufocá-la haveria a "Quarta Revolução" e, diante da situação incontrolável, o retorno inevitável ao antigo regime - só que desta vez ainda mais cruel e brutal. Como na Espanha, os anarquistas chorariam o sangue derramado e passariam os anos seguintes lamentado-se do fracasso dessa suposta "Terceira Revolução".

Antes de qualquer coisa, cabe fazer a pergunta: teria sido a rebelião de Kronstadt um movimento legitimamente "anarquista", no sentido subjetivo da palavra? Os bakuninistas da UNIPA (União Popular Anarquista) são induzidos a crer o contrário:

"Com relação a Kronstadt, é interessante observar que na realidade não se trata de uma experiência anarquista; os marinheiros eram quase na totalidade membros do Partido Bolchevique, e reivindicavam apenas as bandeiras de 1917. A metamorfose de 'Kronstadt' em um 'levante anarquista' não tem o menor embasamento histórico" (UNIPA, "Anarquismo e Ecletismo, em geral e Particularmente no Brasil", Comunicado da União Popular Anarquista - UNIPA # nº 15; Rio de Janeiro, Setembro de 2006).

Devemos concordar que nem Kronstadt nem o movimento makhnovista representaram uma "experiência anarquista" na prática. Mas diferentemente do que diz a UNIPA e outras organizações - sejam anarquistas ou não - o levantamento de Kronstadt não reivindicava as bandeiras de 1917, seu lema foi "sovietes sem bolcheviques" e os valentes marinheiros de 1917 nunca se expressaram de tal maneira, muito pelo contrário, apoiaram o Partido Bolchevique e sua participação nos conselhos em todo o processo revolucionário. Na verdade, a rebelião expressava o desespero das camadas pequeno-burguesas recém-chegadas à fortaleza que não queriam se submeter à ditadura do proletariado e aos sacrifícios impostos pela guerra civil. E apesar das avaliações baseadas na emoção, a rebelião de Kronstadt tinha sim seus representantes "anarquistas" (assim como o movimento de Makhno); mas não só eles, como também social-revolucionários, ex-oficiais czaristas, liberais-burgueses (kadetes), etc. Os membros do Partido Bolchevique contrários ao golpe foram todos encarcerados e ameaçados com julgamentos sumários.

Aproveitando o momento de penúria, a reacionária rebelião de Kronstadt eclodia num momento crítico para a República Soviética, arrasada pela sangrenta guerra civil. A situação era extremamente grave, pois além do bloqueio econômico a renda nacional havia sido reduzida de forma drástica, a indústria e o transporte estavam em completo colapso, a epidemia de cólera e tifo fazia estragos arrasadores na população, não havia combustível suficiente para aquecer as cidades, etc. Ademais, apesar dos fronts terem sido liquidados em dezembro de 1920 e a guerra ter finalizado na primavera de 1921, ainda havia o perigo da contra-revolução triunfar. O Exército Branco havia sido parcialmente derrotado, mas não completamente; muitos núcleos ainda estavam dispersos por toda a Rússia. O general Wrangel ainda possuía unidades com cerca de 80.000 homens estacionados na Turquia e outros contingentes na Sérvia e Bulgária. Wrangel estava sendo protegido e financiado diretamente pela França, o único país que reconheceu seu regime como o "verdadeiro governo da Rússia Sulista". Sem mencionar que pequenas rebeliões lideradas por Guardas Brancos eclodiam por toda Rússia:

"Em janeiro-março de 1921 ocorreu o motim de Tumensk na região de Tobolsk na Sibéria. Os insurgentes contavam com 20.000 homens. Em maio de 1921, destacamentos do Exército Branco foram apoiados pelos descendentes de japoneses em Vladivostok, que mantiveram o controle por um curto período de tempo. Após a assinatura da Paz de Riga (18 de março de 1921), grupos de Guardas Brancos, alguns somando milhares, outros pouco menos que isso, invadiram a Ucrânia e outros pontos do território soviético. Outra série de incursões ocorreu na Karelia que se iniciou em 23 de outubro de 1921, e só foi liquidado em fevereiro de 1922 (!). Pouco tempo depois, em outubro de 1922, o território soviético foi infestado com bandos guerrilheiros da contra-revolução" (J. G. Wright, "A Verdade Sobre Kronstadt", New International, publicado em fevereiro de 1938).

É inegável que a base naval de Kronstadt desempenhou um papel fundamental durante a Revolução Russa, tendo sido responsável por rebeliões contra o governo czarista em 26-27 de outubro, mas nesta época os marinheiros estavam sob o comando do Partido Bolchevique: "A direção dos sovietes de Kronstadt no verão de 1917 pertencia ao Partido Bolchevique, que se apoiava nas melhores seções dos marinheiros e incluía em suas fileiras muitos revolucionários do movimento clandestino, que haviam sido libertados dos campos de trabalhos forçados" (Trotsky, "Muito Barulho por Kronstadt"; New International, abril de 1938). Os anarquistas que estavam na fortaleza eram intimamente ligados aos bolcheviques (como Yarchuk e Zhelezniakov) e coordenavam suas ações em conjunto com o Partido Bolchevique, não sem ele. Durante a guerra civil, esta base naval de primeira classe forneceu aos fronts de combate os melhores marinheiros revolucionários, os mais experientes e abnegados, que lutaram pela salvaguarda da revolução e pela manutenção do poder soviético com um heroísmo inaudito, sem precedentes na história da luta de classes - nem mesmo a Revolução Francesa conheceu tamanho exemplo de auto-sacrifício. Cerca de 40.000 marinheiros da frota, durante toda a guerra civil de 1918-1920, lançaram-se na luta contra os Brancos. Os dirigentes de 1905-1917 já não estavam mais em Kronstadt no ano de 1921, quando rebentou a rebelião. A maioria dos marinheiros ligados ao poder soviético tombaram na guerra civil, outros dispersaram-se por todo o país exercendo funções no governo soviético. Foi exatamente desse modo que uma grande quantidade de marinheiros recém-chegados da luta política, sem a mínima instrução e disposição revolucionária, inundaram a fortaleza substituindo os antigos marinheiros revolucionários. Uma grande parte era proveniente da Ucrânia e do Suldeste da Rússia, territórios fortemente influenciados por Makhno. Este processo gradual mudaria radicalmente o caráter político da fortaleza:

"Conscientemente ou não, os bolcheviques enviaram para a fortaleza soldados desacreditados. Entre eles antigos desertores, indisciplinados, e assim por diante. Ou seja, o Exército Vermelho enviou aqueles que eram inúteis e indesejáveis entre as unidades reservas. E a frota foi obrigada a aceitar estes 'habilidosos' reforços porque havia muita reclamação em torno deles" (A. S. Pukhov, "Kronstadt e a Frota do Báltico Antes do Motim de 1921", Krasnaia Letopis', 1930, No.6).

Durante o ano de 1920, Kronstadt foi submersa com mais de dez mil recrutas novos, elevando o total para mais de dezessete mil, de toda esta esfera numérica apenas cinco mil tomaram parte na rebelião.[44] Ainda segundo estimativas, a tripulação do encouraçado Petropavlovsky havia sido reduzida de aproximadamente 1.400 para apenas 200 no final de 1918; e a maioria dos substitutos não eram veteranos de Kronstadt, mas conscritos, entre os quais muitos deles haviam servido na Frota do Mar Negro, onde, em comparação à Frota do Báltico, a influência dos social-revolucionários e dos anarquistas era notavelmente grande.[45] Em relação ao caráter de classe da fortaleza, o anarquista Paul Avrich é obrigado a admitir que "Em 1921, de acordo com cifras oficiais, mais de três quartos dos marinheiros eram de origem camponesa, proporção substancialmente maior que a de 1917, ano na qual uma parte considerável da frota estava constituída por operários industriais provenientes do setor de Petrogrado. O próprio Petrichenko reconheceu mais tarde que muitos de seus camaradas de armas eram camponeses do Sul movidos pela situação dos aldeões de sua região" (Paul Avrich, "Kronstadt 1921").

A rebelião de Kronstadt só teve tamanha importância por se tratar de uma fortaleza que desempenhou um papel notável no processo revolucionário de 1917. No entanto, apesar da mitologia criada durante quase um século inteiro, é fato incontestável que a composição política de Kronstadt mudou radicalmente com o desenvolvimento da guerra civil. A fortaleza havia perdido o brilho que reluzia em 1917, tendo sido submergida por social-revolucionários, anarco-populistas e ex-oficiais czaristas. A grande parte desses elementos espalhava falsos rumores na guarnição sobre os bolcheviques e a situação em Petrogrado, muitos foram arrastados pela rebelião por meio de mentiras e calúnias:

"Mesclada com os informes iniciais seguia-se uma variedade de falsos rumores que logo incendiaram as paixões dos marinheiros. Dizia-se, por exemplo, que as tropas governamentais haviam disparado fogo sobre os manifestantes da ilha Vasili e que os líderes da greve haviam sido fuzilados nas masmorras da Cheka (...) Mas foi o informe falso de que os comunistas estavam preparando-se para atacar a assembléia que precipitou realmente a formação do Comitê Revolucionário Provisório (CRP), passo pelo qual os marinheiros cruzaram a fronteira da insurreição. Quem foi o responsável por este rumor? Segundo Petrichenko, foi obra dos próprios comunistas, com o objetivo de dissolver a conferência. Embora seja provável, não há nenhuma prova de que tenham sido eles. É igualmente provável que o marinheiro responsável por ter berrado a notícia desejasse agitar as coisas contra os comunistas. E vale a pena notar que o próprio Petrichenko deu crédito ao rumor e anunciou que era verdade, ou seja, que estava a caminho um destacamento de 2.000 comunistas que iriam dispersar a assembléia" (Paul Avrich, idem).

Para se ter mais ou menos uma idéia da composição política dos principais responsáveis pelo golpe, vejamos algumas figuras mais importantes:

1) Stepan Petrichenko: nacionalista ucraniano de origem kulak, simpatizante anarquista, foi a principal figura do levantamento nomeando-se presidente absoluto do fictício "Comitê Revolucionário Provisório" (CRP);

2) Anatoly Lamanov: maximalista social-revolucionário, um dos editores responsáveis pelo diário Izvestia de Kronstadt;

3) Vershinin: social-revolucionário, kulak e antigo especulador - membro do CRP;

4) Ivan Oreshin: democrata-constitucionalista do principal partido burguês KDT, também foi membro do CRP;

5) Vladislav Valk: menchevique germânico, um defensor resoluto do parlamento burguês; como membro do CRP tornou-se responsável pelos assuntos civis na fortaleza;

6) Perepelkin: anarquista e marujo do encouraçado Sevastopol, membro do CRP responsável pela agitação e propaganda;

7) Sergei Putilin: um padre reacionário católico-ortodoxo que antes havia prestado enormes serviços à catedral de Kronstadt; simpatizante do partido KDT e editor-chefe do diário Izvestia de Kronstadt;

8) Tukin: ex-policial czarista proprietário de SEIS casas e TRÊS oficinas em Petrogrado, como membro do CRP ficou encarregado do abastecimento alimentício na fortaleza;

10) Stanislav Shustov: anarquista e chefe da prisão de Kronstadt;

Entre os ex-oficiais czaristas (ou seja, os "especialistas militares") estavam: Solovianov (ex-capitão), Kozlovsky (ex-general), Arkannikov (ex-tenente-coronel) e Dmitriev (ex-contra-almirante), todos eles fizeram parte do chamado "Comitê de Defesa da Fortaleza de Kronstadt", tendo Solovianov como manda-chuva principal.

Mas apesar de toda essa "heterogeneidade", as reivindicações nas assembléias eram as mesmas: novas eleições nos sovietes sem a participação do Partido Bolchevique; liberdade de palavra e de imprensa aos partidos social-revolucionários e anarco-terroristas (mesmo que clamassem pelo assassinato de dirigentes bolcheviques e pelo fim da poder soviético); liberdade aos prisioneiros social-revolucionários e anarquistas condenados por diversas atividades contra-revolucionárias como atentados, terrorismo e sabotagem; supressão dos destacamentos comunistas de inspeção encarregados de combater a especulação; abolição dos comissários políticos no Exército Vermelho (este ponto da resolução provavelmente teve o dedo dos ex-oficiais czaristas); e ?dar aos camponeses TOTAL liberdade de ação em suas terras, bem como o direito de manter o gado, em condições nas quais administrem com seus próprios meios; ou seja, sem empregar trabalho assalariado?, etc. De todos estes pontos, apenas o último representava nada mais nada menos que os interesses econômicos das massas rurais pequeno-burguesas de "comércio livre". Mas se caso a ditadura do proletariado tivesse se sujeitado a este programa pequeno-burguês de oposição à economia planificada e em benefício do "comércio ilimitado e irrestrito" (escondido por detrás do eufemismo de "total liberdade de ação"), rapidamente teria surgido uma nova classe capitalista entre os camponeses mais bem-sucedidos e teria aberto às portas, sem muitas dificuldades, para a restauração do capitalismo. De resto, a resolução tinha nitidamente o dedo e a tinta dos Guardas Brancos e seus aliados mencheviques, social-revolucionários e nacional-anarquistas, dispostos a derrubar o poder soviético.

Se os especialistas militares estavam antes sob a estrita supervisão dos comissários políticos, após o golpe todos os comissários haviam sido encarcerados pelos amotinados. O ex-general czarista Kozlovsky sentiu-se livre para dizer ao comissário comunista Gromov que o seu tempo "havia acabado" e agora era ele "quem ditava as ordens". Kozlovsky exerceu um posto importante no Comitê de Defesa da cidadela após a rebelião. Foi um dos que propuseram, entre outras coisas, que se desse início à ofensiva sobre os povoados o mais depressa possível, a fim de estabelecer contato com a Finlândia que estava sob a batuta do ditador Mannerheim. Este ex-general czarista estava muito longe de sentir qualquer simpatia pelo anarquismo ou comunismo, declarava-se abertamente defensor de uma "monarquia-constitucional".

Os anarquistas não podem negar que os rebeldes kronstadinos tinham à disposição seus próprios especialistas militares, que os aconselhavam e elaboravam planos minuciosos para um ataque bem-sucedido contra o governo soviético. O ex-oficial czarista Solovianov foi nomeado "Chefe de Defesa" pelos rebeldes. Segundo o testemunho de um velho oficial-marinheiro que havia sido preso: "O Presidente do Comitê Revolucionário Provisório (Petrichenko) subordinava-se completamente à decisão do Chefe de Defesa (o ex-comandante czarista Solovianov) e não fazia objeções às atividades operacionais ulteriores" (P.A Zelenoi, "Minutos de Interrogatório à Cheka", 26 de março de 1921).[46]

Entre os planos propostos pelos especialistas militares de Kronstadt estavam:

1º) O desembarque imediato em Oranienbaum com a intenção de apoderar-se da força militar desta cidade e estabelecer contato com unidades favoráveis do exército;

2º) Avançar imediatamente contra Petrogrado antes que o governo soviético pudesse reunir uma posição efetiva;

3º) Realizar um ataque surpresa aos moinhos de trigo de Oranienbaum para obter suprimentos;

4º) Utilizar os canhões da fortaleza para destruir o gelo ao redor da ilha (a fim de torná-la inacessível a qualquer invasão da infantaria soviética) e dos encouraçados Petropavlovsk e Sevastopol, que estavam encalhados sobre o gelo;

5º) Formar barricadas nas ruas na parte leste da cidade próxima à Porta de Petrogrado.

Os rebeldes chegaram de fato a enviar um destacamento de 250 homens armados a Oraniebaum através do gelo na noite do dia 02 e 03 de março para tomar de assalto a Esquadra Aérea Naval. Entretanto, foram recebidos à bala pelos trabalhadores leais à revolução. Os golpistas deixaram-se levar por mais uma quantidade de falsos rumores de que a Esquadra Aérea Naval de Oranienbaum havia votado em massa a favor do golpe e que tinha nomeado seu próprio "Comitê Revolucionário Provisório". Na verdade, apenas três insurretos haviam simpatizado com as resoluções dos rebeldes, a massa de Oranienbaum era completamente indiferente para com o motim, como os resto dos trabalhadores da República Soviética.

Embora os anarquistas tratem este episódio com puro romantismo, afirmando que o movimento foi "espontâneo, despreparado e pacífico", e jogando toda a culpa nos dirigentes bolcheviques (sobretudo em Trotsky), a história real mostra-se bem diferente das fábulas e mitos criados pela literatura anarquista. Em Kronstadt ocorreu uma rebelião e, como toda rebelião, houve excessos, repressão e violência. Os rebeldes não pensaram duas vezes antes de descer o tacão na cabeça dos comunistas e da população pacífica. Já no dia 2 de março, 200 trabalhadores leais ao Partido Bolchevique armaram-se contra os rebeldes, mas como estavam em menor número decidiram fugir para Krasnaya Gorka através do gelo. Temendo uma fuga em massa, os rebeldes estabeleceram o toque de recolher às onze horas da noite, impedindo a saída da fortaleza de quem quer que fosse, sem permissão especial.[47] Ao contrário do que dizem os anarquistas, o comando dos rebeldes não estava baseado nos sovietes, mas no "Comitê de Defesa da Fortaleza de Kronstadt", onde seus principais dirigentes nada mais eram do que os ex-oficiais czaristas. Os rebeldes, por sua vez, aderiram de corpo e alma às prisões generalizadas: "No terceiro dia de março de 1921, 170 comunistas foram presos em Kronstadt. No dia 15 de março, muitos dos velhos marinheiros revolucionários também estavam presos. Mas não foram apenas os comunistas que sofreram repressão. Um rapaz de 17 anos de idade (!) foi enviado ao cárcere por perguntar por que os membros do Comitê Revolucionário Provisório receberam melhores comidas e porções maiores que os trabalhadores comuns" (Krondshtadskaia tragediia 1921 goda. Dokumenti v dvuch knigach. Moskva, ROSSPEN, 1999, vol. 02, p. 632; citado por A. Kramer).

Paul Avrich afirma que cerca de 300 comunistas foram presos durante o curso da insurreição. Sem mencionar que os rebeldes instigavam a população a dedurar os inimigos comunistas para fazer justiça "sem tribunal algum, de acordo com as leis ditadas pelo momento" (Paul Avrich, idem). Os delegados bolcheviques Kuzmin (comissário da Frota do Báltico), Vassiliev (presidente do soviete de Kronstadt) e Kroskunov (comissário da esquadra de guerra de Kronstadt), eleitos por ampla maioria popular nos sovietes, foram todos encarcerados e impedidos de exercerem suas funções. Paradoxalmente, os insurretos nomearam delegados sem eleição alguma, tendo como caudilho principal Stepan Petrichenko. No dia seguinte, o bolchevique Batis (chefe do diretório político) também foi preso por uma patrulha rebelde enquanto tentava cruzar o gelo para dirigir-se ao forte Totleben. Outro bolchevique encarcerado foi o doutor Bregman, um veterano de Kronstadt e secretário do comitê partidário do distrito. Estas medidas causaram uma grande revolta entre os velhos marinheiros revolucionários que ainda encontravam-se estacionados na fortaleza:

"Dentro de Kronstadt houve enfrentamentos entre os velhos marinheiros revolucionários e os novos recrutas que procediam de famílias camponesas e pequeno-burguesas. No informe de inteligência militar do Sétimo Exército podemos ver que muitos marinheiros e soldados rebeldes queriam passar para o lado dos bolcheviques, mas foram ameaçados por seus comandantes. Em 15 de março, o Comitê Revolucionário Provisório de Kronstadt ordenou a prisão de todos os velhos marinheiros que se recusavam a 'obedecer ordens'" (A. Kramer, "Kronstadt: Trotsky tinha razão! - O Novo Material dos Arquivos Soviéticos Confirma a Postura dos Bolcheviques").

Segundo um informe de Agranov ao Presidium da Cheka: "A repressão levada a cabo pelo Comitê Revolucionário Provisório contra os comunistas que permanecem fiéis à revolução refuta as intenções supostamente pacíficas dos rebeldes. Praticamente em todo o momento as sessões do CRP demonstram que a luta contra os comunistas que ainda estão em liberdade, e contra os que ainda estão presos, continuam sendo o foco de sua atenção. Em última instância, recorrem até mesmo a ameaças de cortes marciais, apesar de sua declarada revogação da pena de morte" (Agranov, Informe ao Presidium da Cheka, 5 de abril de 1921). O anarquista Stanislav Shustov (chefe da prisão de Kronstadt) foi um dos que propuseram o fuzilamento de todos os comunistas. No entanto, Kuzmin demonstrou uma coragem notável diante de todas as ameaças. Na conferência realizada pelos rebeldes no auditório da "Casa da Educação", Kuzmin respondeu: "Vocês me têm à vossa mercê, podem até me fuzilar, mas se atreverem a levantar a mão contra o governo soviético, os bolcheviques lutarão até o extremo de suas forças!". Os revoltosos só recuaram na sua decisão de fuzilar os comunistas porque o Comitê de Defesa de Petrogrado, que estava sob a jurisdição de Zinoviev, tomou a família dos rebeldes sob custódia e aplicou a lei sobre os reféns, dando o seguinte aviso: "O Comitê de Defesa declara que os presos são mantidos como reféns para o Comissário da Frota do Báltico, N. N. Kuzmin, o Presidente do Soviete de Kronstadt, T. Vassiliev, e outros comunistas. Se o menor dano for sofrido por um de nossos camaradas detidos, os reféns pagarão com suas próprias vidas".

Como se sabe, o Partido Bolchevique não tinha experiência militar na arte da guerra, e um exército moderno necessitava de técnicos especializados. Foi então necessário recrutar especialistas militares cuja maioria haviam pertencido ao antigo regime, ex-oficiais czaristas. Mas é óbvio que esses "especialistas militares" não ingressaram nas fileiras do Exército Vermelho gratuitamente. Além de Trotsky ter estabelecido seu controle e vigilância pelos comissários operários, o velho dirigente bolchevique instituiu um decreto de guerra em 1919 que ficou conhecido como "a lei sobre os reféns", onde as famílias dos traidores seriam tomadas sob custódia em caso de deserção. Isto serviu como advertência aos oficiais reacionários caso aderissem ao bando inimigo da contra-revolução. Foi uma medida necessária durante a guerra civil, já que a traição e a deserção representavam um sério obstáculo para a vitória da República Soviética na guerra.[48] Apesar dos anarquistas estrebucharem contra a aplicação deste decreto no episódio de Kronstadt, não havia outra saída para salvar a cabeça daqueles que haviam sido detidos pelos rebeldes; lembremos que estes últimos, em união com os seus próprios especialistas militares, também fizeram reféns, encarcerando inclusive os comissários operários responsáveis pelo controle e vigilância dos ex-oficiais czaristas, e estavam decididamente dispostos a fuzilá-los. Kuzmin descreve como a ameaça das execuções em massa por parte dos golpistas quase foi levada a cabo por Shustov: "Na manhã do dia 18 de março, Shustov armou uma metralhadora fora da cela que continha 23 prisioneiros, e ele só foi impedido de matar os comunistas pelo avanço do Exército Vermelho sobre o gelo" (Kuzmin, "Informe à sessão do soviete de Petrogrado", 25 de março de 1921).

A suspeita de Lênin e Trotsky em relação a uma conspiração internacional confirmara-se na prática. Os órgãos da imprensa burguesa situados no estrangeiro já relatavam com antecipação, duas semanas antes da revolta, que alguns marinheiros já estavam organizando uma rebelião em Kronstadt contra o governo soviético. No dia 13 de fevereiro apareceu uma matéria no "Le Matin" sob o título "Moscou toma medidas contra os rebeldes de Kronstadt", o artigo afirmava que havia estourado uma rebelião na fortaleza e que as autoridades bolcheviques haviam-na reprimido para que não se estendesse a Petrogrado. No dia 14 de fevereiro o mesmo periódico publicou um segundo artigo onde afirmava que uma delegação de marinheiros haviam sido encarcerados enquanto dirigiam-se a Moscou para pedir melhores rações, o órgão dizia que "a situação em Kronstadt havia se deteriorado, e os rebeldes dirigiram seus canhões contra Petrogrado". No mesmo dia, apareceu um outro relato num órgão parisiense chamado "L?Echo de Paris", no qual afirmava que os marinheiros haviam prendido o comissário principal da frota (Kuzmin) e despachado vários encouraçados contra Petrogrado. O periódico norte-americano "New York Times" chegou ao extremo absurdo de afirmar que os marinheiros haviam tomado pleno controle de Petrogrado e estavam derrotando todas as tropas enviadas por Trotsky, uma a uma (!). Tudo isso duas semanas antes da rebelião! Como a imprensa burguesa internacional prenunciava pormenorizadamente algo que aconteceria semanas mais tarde? Trotsky, na época, deu a seguinte resposta:

"Os centros da conspiração contra-revolucionária estão situados no estrangeiro. Entre estes centros, os emigrantes russos e certos grupos do imperialismo europeu e a imprensa européia há um laço muito íntimo que, evidentemente, não é de forma alguma platônico em caráter. Os contra-revolucionários russos prometeram organizar um motim no momento propício, mas o impaciente bulevar e os periódicos da bolsa de valores escreveram sobre isto como se já fosse um fato" (Leon Trotsky, "Sobre os Acontecimentos em Kronstadt - Entrevista à Imprensa Estrangeira"; Pravda, 16 de março de 1921, Nº 57).

O velho bolchevique estava correto! Os rumores, de acordo com Paul Avrich, surgiram de uma única fonte: um correspondente da agência de notícias "Russunion", que tinha sua sede em Helsinque (Finlândia), centro notório de propaganda anti-soviética. A agência "Russunion" era uma organização de periodistas russos que estavam em estreito vínculo com o Centro Nacional - uma coalizão contra-revolucionária entre kadetes, mencheviques e social-revolucionários na emigração. Nos Arquivos Russos do Centro Nacional da Universidade de Columbia foram descobertos manuscritos datados de 1921 que tratam dessa questão com maiores detalhes. Estes documentos estão carimbados com o famoso "Top Secret" e levam o sugestivo título de "Memorando Sobre a Questão da Organização de um Levantamento em Kronstadt". O memorando apresenta um plano detalhado sobre uma eventual rebelião na fortaleza que ocorreria na "próxima primavera", além de informações sobre a situação da guarnição, recursos materiais, quantidade de armas e planos minuciosos para um golpe contra-revolucionário bem-sucedido. O Memorando expõe qual atitude deveria ser tomada pelas potências estrangeiras se caso "um pequeno grupo de pessoas, mediante uma ação rápida e decisiva, tomasse o poder na fortaleza". Paul Avrich, o principal responsável pela descoberta deste material, fez uma revelação que pegou todos de surpresa:

"A julgar pela evidência que contém, é bastante claro que o plano descrito no memorando foi traçado em janeiro ou início de fevereiro de 1921 por um agente do Centro Nacional localizado em Viborg ou Helsinque. Ele prediz que ocorrerá uma sublevação dos marinheiros durante a 'próxima primavera' (...) O autor obviamente está muito familiarizado com a situação de Kronstadt. Há uma extensa e bem informada análise das fortificações da base, na qual avalia-se cuidadosamente o perigo do bombardeio da artilharia desde Krasnaya Gorka, mas não se considera como ameaça séria para a rebelião. Além disso, o documento acentua a necessidade de preparar abastecimentos de provisões para os rebeldes com bastante antecipação no início do levantamento. O autor acentua muito este aspecto. Com a ajuda da França, diz, é possível aportar navios de transporte carregados de alimentos no Báltico, que esperarão ordens para seguir até Kronstadt. Como contingente militar operativo, continua, deve-se mobilizar o Exército Russo do general Wrangel, apoiado por uma esquadra francesa e unidade da frota do Mar Negro aportadas em Bizerta (...) Assim, com a chegada do Exército Russo, toda a autoridade de Kronstadt passaria imediatamente para as mãos de seu comandante-em-chefe (Wrangel). A fortaleza serviria então como 'uma base invulnerável' para desembarcar no continente 'com o intuito de derrubar a autoridade soviética na Rússia'. Entretanto, o êxito da operação dependeria da disposição dos franceses em proporcionar dinheiro, alimentos e apoio naval. De outra forma, ocorreria igualmente uma revolta e estaria destinada ao fracasso. Se o governo francês estivesse de acordo, conclui o memorando, seria então desejável que designasse 'uma pessoa com a qual pudesse entrar em acordos mais detalhados sobre este assunto com os representantes dos organizadores da rebelião e à qual pudessem comunicar os detalhes do plano da revolta e ações posteriores, assim como facilitar informações mais precisas a respeito dos fundos que necessitam para a organização e demais aspectos financeiros do levantamento'" (idem).

A preocupação principal dos imperialistas era de que a revolta não acontecesse antes do degelo, momento em que Kronstadt ficaria imune a um ataque bolchevique. Por que então, perguntam os anarquistas, os rebeldes kronstadinos não esperaram o degelo para aplicar o golpe? O general Elvengren (representante de Wrangel na Finlândia) afirma que realmente havia uma operação organizada dos Guardas Brancos em Kronstadt e explica porque os rebeldes decidiram estourar o motim antes do degelo:

"Todo o segredo está no fato de que os marinheiros de Kronstadt (a organização local conectada com a organização mais ampla), ao inteirar-se do início de um movimento em Petrogrado (ou seja, falsos rumores) e de sua escala, tomaram este movimento por um levantamento geral. Não querendo ficar passivamente à margem dos acontecimentos, decidiram, apesar do calendário acordado, ir até Petrogrado, mas rapidamente se orientaram e viram que as coisas não estavam como eles esperavam. Tiveram que regressar a Kronstadt rapidamente. O movimento em Petrogrado já havia acabado faz tempo, as coisas estavam tranqüilas, mas eles - os marinheiros - que já estavam comprometidos diante dos comissários, sabiam perfeitamente que seriam reprimidos e decidiram dar o passo adiante, usando o isolamento de Kronstadt para anunciar sua ruptura com o poder soviético e, de forma independente, levar a cabo o levantamento que haviam sido forçados a iniciar" (Elvengren, Informe ao Comitê de Evacuação Russa na Polônia; citado por Israël Getzler, "O Destino da Democracia Soviética").

De fato, Petrogrado encontrava-se em crise devido à devastação deixada pela guerra civil, os sistemas de transportes estavam deteriorados e desarticulados, faltava combustível e o inverno era cruel, os trabalhadores iniciaram greves em algumas fábricas de Petrogrado (influenciados, sobretudo, pela agitação de dirigentes mencheviques), mas os bolcheviques não se desesperaram: os sovietes da região realizaram assembléias, explicaram a situação em que se encontrava o país, alertou contra a provocação dos agitadores contra-revolucionários e o protesto extinguiu-se por si só, sem derramar uma única gota de sangue. Não houve repressão nem ameaças, mas diálogo - algo que os rebeldes de Kronstadt desconheciam completamente.

Após o ribombar da rebelião, a tarefa imediata da contra-revolução internacional consistiu em reunir ajuda suficiente para os rebeldes a fim de manter seu moral elevado: "A sublevação de Kronstadt - diz uma circular confidencial dos arquivos do Centro - encontrou uma resposta no coração de todos os exilados russos. Devemos enviar alimentos e produtos médicos imediatamente, sob a bandeira da Cruz Vermelha; além disso, devemos proporcionar aos insurgentes aviões, lanchas a motor, petróleo e roupas para ajudá-los a difundir a revolta no continente antes que os bolcheviques possam reunir suas forças" (Paul Avrich, idem). O órgão "Obshchee Delo" ("A Causa Comum"), situado em Paris e dirigido pelo veterano populista Vladimir Burtsev, publicou um chamado no dia 6 de março a todos os grupos contra-revolucionários de emigrantes para que se unissem em apoio à rebelião, com o intenção de não perder a preciosa oportunidade de retomar a guerra civil:

"Estamos vivendo um momento que não se repetirá. Não cabe manter-se na atitude de testemunha ociosa dos eventos. Fazemos um chamado urgente a todos os russos - e através deles a nossos aliados - para que proporcionem aos revolucionários de Kronstadt um apoio material ativo. Para que seja entregue armas aos insurgentes e que se assegure comida para Petrogrado. A luta contra os bolcheviques é nossa causa comum! Se nos restringirmos apenas às palavras nestes terríveis dias, se ainda não nos atermos à tempestade dos debates e das resoluções, pobres de nós, pobre da Rússia! Se a Europa, que já perdeu tantas oportunidades, perder também esta, então pobre dela, pobre do mundo inteiro!".

Os imperialistas tinham plena consciência da importância que a fortaleza de Kronstadt representava, e não mediram esforços para ajudar os rebeldes. O diretor do Banco Internacional de Paris, Kokovtzov - que antes havia trabalhado como ministro das finanças e primeiro-ministro durante o regime czarista -, chegou a depositar 5.000 libras inglesas nas contas do Centro Nacional para que fossem enviados de imediato aos rebeldes. Já o Banco Russo-Asiático transferiu 225.000 francos. Em Paris, Berlim e Praga, os mais renomados líderes dos social-revolucionários de direita, como Alexander Kerensky e Viktor Chernov, entregaram-se de corpo e alma à tarefa de recolher fundos para comprar alimentos e outros abastecimentos necessários para "manter viva a insurreição". Duas cartas de Zenzinov, escritas em Praga e dirigidas a um membro do Centro Nacional de Paris, mencionam quantias que ultrapassam os 100.000 francos franceses. O mesmo Centro Nacional recebeu de Boris Bakhmetiev (embaixador de Kerensky nos Estados Unidos) mais 25.000 dólares. As cartas indicam ainda que foram reunidos cerca de 50.000 sacos de farinha em Amsterdã para embarcá-los à fortaleza. Dentre os países Aliados, a França foi quem mais apoiou a rebelião, devido à sua rígida oposição ao regime bolchevique. Há provas documentais de que o Centro Nacional entrou em contato com o primeiro-ministro francês de relações exteriores, Briand, durante todo o levantamento. Numa reunião com Malachov, ex-embaixador do antigo Governo Provisório, Briand prometeu "qualquer ajuda necessária a Kronstadt". O diário de Kerensky em Berlim informava que uma esquadra francesa havia recebido ordem de partir para o porto de Reval no Báltico com a missão de "ajudar Kronstadt a qualquer custo". Um correspondente diplomático do jornal trabalhista "Daily Herald" escrevia em março de 1921: "Posso afirmar decididamente que o governo francês está interessado no assunto de Kronstadt, e que enviou uma grande soma de dinheiro para uso dos amotinados a um certo professor (Tseidler) que reside em Viborg. Também enviaram abastecimentos com a cumplicidade da Cruz Vermelha" (Daily Herald, 14 de março de 1921). A União Russa do Comércio e Indústria de Paris enviou um radiograma ao CRP de Kronstadt assegurando seu pleno apoio e a intenção de enviar "suprimentos e outros abastecimentos necessários". O radiograma declarava que os imperialistas haviam se comprometido a ajudar os rebeldes com uma soma inicial de dois milhões de marcos finlandeses para a "sagrada causa de libertar a Rússia". Fundos adicionais foram doados por outros bancos russos, companhias de seguros e pela astuta Cruz Vermelha. Kokovtzov informou ao Comitê dos Bancos Russos em Paris que os depósitos para Kronstadt já excediam a faixa dos 775.000 francos (!), ou dois milhões de marcos finlandeses, prometidos aos rebeldes pela União de Comércio e Indústria. Não por acaso, a Bolsa de Valores encontrava-se excitada com o desenrolar dos acontecimentos, a ponto de quase ter um orgasmo financeiro: "Em Petrogrado os mencheviques estão causando um alvoroço; as ações da 'Putiov Works' subiram a um valor de 10 francos. Chernov promete abrir a Assembléia Constituinte; outros 5 francos marcaram em alta. Em Kronstadt a artilharia falou em nome dos sovietes contra os comunistas; isso significa que os capitalistas belgas poderão voltar aos seus trabalhos e minas no Donbas - uma alta para essas ações de 20-30 francos" (Boletins da Bolsa de Valores da Europa de fevereiro-março de 1921).

Mas além da ajuda financeira também houve propostas de ajuda militar. Viktor Chernov (dirigente dos social-revolucionários de direita e ex-ministro da agricultura durante o Governo Provisório) propôs uma inestimável ajuda e colocou-se como mediador nas negociações diante das potências imperialistas para enviar suprimentos aos insurretos. Durante a primeira semana do golpe, Chernov enviou o seguinte radiograma ao CRP de Kronstadt: "O presidente da Assembléia Constituinte, Viktor Chernov, envia suas fraternas saudações aos heróicos camaradas marinheiros, aos homens do Exército Vermelho e aos operários, que pela terceira vez desde 1905 estão tentando livrar-se do jugo da tirania, e lhes oferece ajuda com homens e provisões através das cooperativas russas do exterior. Nos informem do que necessitam e a quantidade. Estou preparado para ajudar em pessoa e dar-lhes minhas energias e autoridade à serviço da revolução do povo", Chernov conclui: "Tenho fé na vitória final das massas trabalhadoras. Glória ao primeiro a levantar a bandeira da libertação do povo! Abaixo o despotismo de Direita e de Esquerda!".[49] Contudo, o CRP de Kronstadt rechaçou momentaneamente a ajuda de Chernov por razões táticas e não de princípios: "O Comitê Revolucionário Provisório agradece a oferta de Chernov, mas o recusa no momento, até que a situação esteja mais clara. Entretanto, tudo será levado em consideração" (Assinado por Petrichenko, presidente do CRP de Kronstadt).[50] É evidente que os rebeldes avaliaram a situação de um ponto de vista racional: se tivessem aceitado a ajuda dos social-revolucionários naquele momento teriam conquistado ainda mais a hostilidade das massas trabalhadoras, que já não viam com bons olhos o estouro de uma rebelião no nascente Estado operário - e, sobretudo, contra aqueles que haviam repelido a contra-revolução na guerra civil, ou seja, os bolcheviques. Por sinal, uma das causas do inevitável fracasso do levantamento de Kronstadt foi seu isolamento, pois a grande massa dos trabalhadores não lhe prestou nenhum apoio. Até mesmo o líder menchevique Fyodor Dan admitiu em 1922 que "o motim de Kronstadt não teve nenhum apoio dos trabalhadores de Petrogrado" (Fyodor Dan, "Os Mencheviques no Motim de Kronstadt", Krasnaia Letopis', 1931, No. 2). De acordo com Trotsky: "os trabalhadores sentiram imediatamente que os amotinados de Kronstadt estavam colocados ao lado oposto das barricadas... e apoiaram o poder soviético. O isolamento político da fortaleza foi a causa de sua vacilação interna e sua derrota militar" (Leon Trotsky, "Muito Barulho por Kronstadt").

Outro notório personagem que propôs ajuda aos rebeldes foi o Barão Vilken (ex-comandante da Armada Imperial que havia servido no encouraçado Sevastopol), ele sugeriu uma ajuda a Kronstadt de 800 oficiais armados e permaneceu na cidade durante a revolta como representante da Cruz Vermelha Russa na Finlândia. Vilken também se comprometeu em oferecer ao CRP alimentos e produtos médicos. Ao ser interrogado pela Cheka, o anarquista Perepelkin deu o seguinte depoimento a Komarov (Presidente Regional da Cheka de Petrogrado):

"E aqui eu dei de cara com o antigo comandante do Sevastopol, Barão Vilken, com o qual eu tinha navegado logo cedo. Ele ficou reconhecido pelo CRP como representante da delegação que nos ofereceu aliança. Eu fiquei ultrajado com isto. Chamei todos os membros do CRP e disse: 'então essa é a situação em que nos encontramos, a quem somos forçados a manter conversações...' Petrichenko e os outros pularam sobre mim, dizendo: 'Nós não temos comida e remédios - a escassez iniciou-se em março de 1921 - devemos então ser obrigados a nos render aos conquistadores? Não há outro caminho!'. Eu parei de argumentar e disse que aceitaria a proposta. E, no segundo dia, nós recebemos 400 puds (1 pud=16,8 kilos) de alimentos e cigarros. Aqueles que aceitaram a amizade mútua com o Barão dos Guardas Brancos disseram que ele estava a favor do poder soviético" (Interrogatório de Perepelkin a Komarov, Presidente Regional da Cheka de Petrogrado - informe taquigráfico, 25 de março de 1921).

O Barão Vilken ainda sugeriu ao CRP que emitisse publicamente uma adesão formal em favor da Assembléia Constituinte. No mesmo interrogatório, Komarov indagou a Perepelkin se no dia seguinte após as negociações o Barão Vilken tivesse exigido não uma Assembléia Constituinte mas uma ditadura militar, qual seria a posições dos insurretos? Perepelkin deu sua resposta: "Hoje eu admito com toda a franqueza que nós teríamos adotado tal medida - nós não tínhamos outra saída!". Vale ressaltar que as propostas de negociações com o Barão Vilken vieram diretamente de Petrichenko, que telegrafou a David Grimm (chefe do Centro Nacional e representante oficial de Wrangel na Finlândia) no dia 13 de março.

Como já analisamos no princípio, a maioria dos amotinados que formaram uma nova composição social em Kronstadt eram camponeses provenientes do Sul da Rússia e da Ucrânia, territórios que possuíam uma rica classe camponesa (kulaks) e eram profundamente afetados pelo anti-semitismo. Paul Avrich afirma que "embora os rebeldes kronstadinos negassem alguns preconceitos anti-semitas, não há dúvida que havia sentimentos de ódio contra os judeus entre os marinheiros, muitos deles vieram da Ucrânia e dos confins ocidentais, as clássicas regiões de virulento anti-semitismo na Rússia (...) Os habitantes de Kronstadt mostravam uma forte veia de nacionalismo eslavo, que não resulta surpreendente em vista de suas origens predominantemente camponesas, embora se proclamassem internacionalistas, os marinheiros mostraram pouco interesse pelo movimento revolucionário mundial" (idem).

Entre os nomes mais importantes na rebelião encontrava-se Vershinin (membro do CRP), um antigo especulador que havia sido transferido como marinheiro para o encouraçado Sevastopol. Este elemento degenerado fez o seguinte chamamento aos soldados do Exército Vermelho para jogá-los contra os bolcheviques e unir-se à causa dos rebeldes: "Basta de 'hurrás', juntem-se a nós para derrotar os judeus. Vamos acabar com essa maldita dominação que nós, operários e camponeses, temos que suportar!" (Paul Avrich, idem). Outras evidências de anti-semitismo apareceram nas memórias de um marinheiro envolvido na rebelião. Paul Avrich aborda que este referido marinheiro demonstrava asco pelo governo soviético, o qual, segundo suas próprias palavras, foi "o principal responsável por ter transformado a Rússia na primeira república judia"; ele também denomina o ultimato que os bolcheviques enviaram à fortaleza para que os rebeldes se rendessem imediatamente como "o ultimato do judeu Trotsky". Mas pior ainda foi a descoberta de uma carta que o marinheiro Dmitry Urin enviou a seu pai, na província de Kherson, no dia 5 de março de 1921, o conteúdo deste bilhete é um tiro de misericórdia na nuca dos falsificadores que tentam colocar uma auréola sobre a cabeça dos rebeldes: "Nós rejeitamos completamente a comuna, nesse momento não temos mais comuna alguma, agora só temos poder soviético. Fizemos uma resolução em Kronstadt para enviar todos os judeus à Palestina, para que não haja mais na Rússia tal escória, todos os marinheiros gritaram: 'FORA JUDEUS!'" (Krondshtadskaia tragediia 1921 goda. Dokumenti v dvuch knigach., Moskva, ROSSPEN, 1999, vol. 01, doc. 58, pág. 119).

Afinal, deveria o governo bolchevique dar de mão beijada uma base naval fortemente armada, de primeira classe, a esses elementos atrasados e desmoralizados? Os anarquistas ainda têm a cara-de-pau de afirmar que os elementos supracitados não representavam o conjunto geral dos rebeldes kronstadinos, mas grande parte dos que foram citados representou posições de destaque no CRP, e alguns são mencionados inclusive por autores anarquistas que vangloriam o motim - como Alexandre Berkman, por exemplo, que no seu livro sobre a rebelião de Kronstadt destaca Vershinin como um dos mais importantes membros do CRP e coloca-o no rol dos "trabalhadores de conhecida história revolucionária" (sic).

Esses sentimentos anti-semitas refletiam o caráter reacionário da rebelião. Não foi à toa que o governo bolchevique emitiu um comunicado no dia 2 de março de 1921 afirmando que os rebeldes estavam aprovando "resoluções que refletiam o espírito das Centúrias Negras". O social-revolucionário Lamanov, que tomou parte no levantamento, afirmou que o veneno do anti-semitismo era tão forte que se sentiu no dever de "bloqueá-lo" através de artigos no órgão oficial dos rebeldes, o diário "Izvestia de Kronstadt". É exatamente por isso que as manifestações de anti-semitismo nunca estiveram presentes no periódico da fortaleza. Por incrível que pareça, esses artigos de Lamanov foram tomados como "provas definitivas" por Volin para demonstrar as supostas "intenções revolucionárias" dos rebeldes e sua luta contra os "preconceitos anti-semitas". Seria cômico se não fosse trágico! O próprio Lamanov arrepender-se-á mais tarde de ter participado da rebelião, pois, segundo suas próprias palavras, "a participação dos Guardas Brancos confirmara-se de fato após a fuga para a Finlândia".

Sobre a declaração fanática dos rebeldes aos sovietes (como a demonstrada por Dmitry Urin, por exemplo), o general czarista Elvengern escreveu um extenso relatório em março de 1921 que diz o seguinte: "De um ponto de vista tático, eles (o Comitê Revolucionário Provisório) declararam-se partidários fanáticos do poder soviético, e diziam que só se opunham à ditadura do Partido Comunista com a esperança de que, com tal plataforma, tornar-se-ia difícil aos comunistas mobilizarem suas defesas e unidades soviéticas para esmagá-los" (Krondshtadskaia tragediia 1921 goda. Dokumenti v dvuch knigach., Moskva, ROSSPEN, 1999, vol. 02, doc. 535, pág. 61). No exílio, Ivan Oreshin também afirmou que: "A questão do sufrágio universal, estendendo o voto também à burguesia, foi cuidadosamente evitada pelos oradores da manifestação (do 1º de março). Eles não queriam provocar uma oposição entre os mesmos insurgentes que os bolcheviques pudessem aproveitar. Não falaram da Assembléia Constituinte (parlamento burguês), mas se assumiram favoráveis e que se chegaria a ela gradualmente, via a livre eleição de sovietes" (Ivan Oreshin, Volia Rossii, abril-maio de 1921; citado por Shetinov, idem).

Devemos admitir que a solidariedade internacional para com a rebelião era realmente extraordinária, mas não vinha da classe trabalhadora nem dos movimentos revolucionários, e sim da burguesia reacionária. Para Kerensky, "a rebelião de Kronstadt anunciava o colapso iminente do bolchevismo" (Golos Rossi, 13 de março de 1921). O multimilionário Pavel Milyukov (principal dirigente do partido KDT e ex-ministro das relações exteriores do antigo Governo Provisório) também entoou loas no exílio aos insurretos e, sobretudo, ao slogan de "sovietes sem comunistas". No seu periódico "Poslednia Novosti" ("Últimas Noticias"), ele abordou a questão da seguinte forma: "Este programa precisa ser manifestado no seguinte slogan: 'Abaixo os Bolcheviques! Longa Vida aos Sovietes!' (...) No presente momento, 'Viva os Sovietes!' significa que o poder passará dos bolcheviques para os socialistas moderados, que irão receber a maioria nos sovietes (...) É necessário então utilizar a consigna de apartidarismo nos sovietes para destruir o próprio poder soviético" (Pavel Milyukov, "Poslednia Novosti", 11-18 de março de 1921). Em uma entrevista com o correspondente em Paris do "New York Times", Milyukov ainda afirmou que "os dias do regime de Lênin e Trotsky estavam contados" e pediu ao governo norte-americano que enviasse alimentos aos rebeldes. É preciso ser muito cego para não enxergar que a consigna de "sovietes sem comunistas" satisfazia a burguesia mundial e representava o próprio derrocamento da República Soviética. Todos tinham a absoluta certeza que uma vez os bolcheviques fora do poder seria muito fácil o triunfo da contra-revolução internacional. A consigna de "apartidarismo" foi demagogicamente explorada pelos principais dirigentes do golpe. Agranov notificou ao Presidium da Cheka que praticamente "todos os participantes do motim encobriram cuidadosamente a fisionomia de seus respectivos partidos sob a bandeira apartidária".

Kronstadt estava ligada diretamente pelo gelo, durante o inverno podia-se irromper seus portões e escalar suas muralha, porém, após o degelo, a fortaleza tornar-se-ia inexpugnável e serviria como uma ponte para os imperialistas ocupar Petrogrado. No Memorando da Universidade de Columbia há notas informando sobre a importância do degelo, pois só assim a fortaleza ficaria imune aos ataques soviéticos a partir do continente; sendo assim, as forças do general Wrangel já estariam abastecidas e prontas para o ataque. O governo bolchevique tinha plena consciência do perigo que o Estado operário estava correndo, por isso não tiveram outra alternativa senão atacar a fortaleza o mais depressa possível. Para os críticos, Lênin e Trotsky deveriam ter feito o mesmo que o social-revolucionário chinês Mao Tsé-Tung, que permitiu a Chiang Kai-Chek apoderar-se da Ilha de Formosa (Taiwan) e formar tranqüilamente um governo contra-revolucionário do Kuomintang naquela região. Como expõe perfeitamente Leon Trotsky: "Naturalmente, o governo revolucionário não poderia ?dar de presente? a fortaleza que protegia Petrogrado aos marinheiros insurretos só porque uns tantos duvidosos anarquistas e social-revolucionários protegiam um punhado de camponeses reacionários e soldados amotinados, empenhados numa rebelião". Os bolcheviques pertenciam a uma outra escola do marxismo-revolucionário, muito mais avançada diga-se de passagem. Mas isto não quer dizer que o governo soviético não tenha feito todo um sacrifício (gigantesco, por sinal) para convencer os rebeldes de seus equívocos. Uma dessas tentativas veio através de um ultimato (do "judeu Trotsky") para que os amotinados se rendessem imediatamente, a fim de evitar uma batalha sangrenta e poupar a população pacífica de mais sofrimentos. Alguns trechos do ultimato diziam o seguinte:

"(...) ordenamos a todos que ergueram suas mãos contra a pátria socialista a depor suas armas imediatamente. Os recalcitrantes devem ser desarmados e entregues às autoridades soviéticas. Os comissários detidos e outros representantes do governo devem ser libertados imediatamente (...) aqueles que se renderem incondicionalmente poderão contar com a clemência da República Soviética" ("A Última Advertência", ultimato do governo bolchevique aos rebeldes de Kronstadt, enviado a 5 de março de 1921).

Os falsificadores ainda tentam imputar a Trotsky uma ordem insinuando que caso os rebeldes não se rendessem seriam "caçados como perdizes" (ou como "faisões", dependendo do paladar dos anarquistas). Na verdade, foi Zinoviev através do Comitê de Defesa de Petrogrado que emitiu tal mensagem, como aborda Paul Avrich:

"Embora a ameaça de caçar os rebeldes 'como perdizes' tenha sido atribuída erroneamente a Trotsky, seu verdadeiro perpetrador foi o Comitê de Defesa de Zinoviev (...) No dia 05 de março, o Comitê de Defesa de Petrogrado editou um novo panfleto e lançou sobre Kronstadt através de aeroplanos (...) O panfleto concluía suas palavras com uma advertência profética: 'no último minuto, os 'Kozlovskys' e 'Petrichenkos' os deixarão plantados e fugirão para a Finlândia. O que vocês farão então? Se os seguirem, acreditam realmente que encontrarão alimento na Finlândia? Não ouviram o que aconteceu com os homens de Wrangel, que estão morrendo como moscas de fome e doenças? O mesmo destino os aguarda, a menos que se rendam no prazo de 24 horas. Se o fizerem, serão perdoados; mas se resistirem, serão caçados como perdizes'".

Devemos admitir que o conteúdo do panfleto era de fato profético, pois tanto Kozlovsky (um ex-general czarista) como Petrichenko (um kulak nacionalista pequeno-burguês) abandonaram seus "camaradas" à própria sorte e fugiram no último instante para a Finlândia, onde se uniram às tropas do Barão Wrangel para lutar por uma "ditadura militar temporária" na Rússia.

Sem dúvida, Zinoviev era conhecido por seus palavrórios excessivos e demagogia colossal, entretanto, cabe a pergunta: se os amotinados estavam ameaçando judeus e comunistas, se os mantinham presos sob a mira de armas, que direito tinham eles de reclamar das frivolidades de Zinoviev? Além do mais, foi dado mais um prazo de 24 horas e, apesar do tom áspero de Zinoviev no último parágrafo, mais uma vez declarava-se a clemência da República Soviética para com rebeldes, caso se rendessem, evidentemente. Porém, a intransigência reinava na fortaleza, e outra prova desta inflexibilidade ocorreu no dia 06 de março. Alexandre Berkman e Emma Goldman (por sinal, os dois maiores falsificadores deste episódio) enviaram um telegrama ao Soviete de Petrogrado apresentando uma proposta que dizia:

"Deixem uma Comissão ser selecionada consistindo de cinco pessoas, incluindo dois anarquistas. A Comissão deve ir para Kronstadt assentar a disputa por meios pacíficos. Na dada situação, este é o método mais radical. Será de um significado revolucionário internacional" (Alexandre Berkman, Emma Goldman, Perkus e Petrovksy, "Ao Soviete do Trabalho e Defesa de Petrogrado - Coordenador Zinoviev", 05 de março de 1921).

Pois no dia seguinte o Soviete de Petrogrado telegrafou ao CRP de Kronstadt perguntando aos rebeldes se uma delegação de membros do soviete, filiados e não-filiados ao Partido Bolchevique, poderiam dirigir-se à fortaleza para um diálogo pacífico. Qual foi a resposta dos rebeldes? Na sua intransigente fúria apartidária, afirmaram não confiar no "status apartidário de vossos representantes partidários" (Paul Avrich, idem). Isto prova que não faltou boa vontade do governo soviético em dialogar com os rebeldes e procurar um resultado pacífico da situação. Infelizmente, Alexandre Berkman e seus companheiros omitem todos estes fatos, induzindo o leitor a acreditar que os bolcheviques foram inflexíveis ao diálogo, quando, na verdade, foram os rebeldes que rechaçaram todas as soluções pacíficas vindas do governo. Decerto que os bolcheviques não podiam esperar o degelo e deixar que os imperialistas tomassem a fortaleza.

Kronstadt era uma fortaleza altamente fortificada localizada sobre a Ilha de Kotlin, no Golfo da Finlândia, a 30 quilômetros de Petrogrado. Foi fundada por Pedro ?O Grande? no séc. XVIII com a intenção de proteger a nova capital (na época com o nome de "São Petersburgo"). Kronstadt tinha cerca de 135 canhões e 68 metralhadoras, já os encouraçados Petropavlovsk e Sevastopol possuíam, cada um deles, uma dúzia de canhões de 12 polegadas e dezesseis canhões de 129 milímetros. A preocupação principal dos bolcheviques era que os Brancos tomassem a fortaleza e a utilizasse como uma nova base para colocar-se de pé em todo o continente, provocando uma nova e sangrenta guerra civil. Em vista do esgotamento geral do país, o regime soviético poderia ter se extinguido sem muitas dificuldades, dando lugar ao regime monárquico-fascista dos Guardas Brancos. No dia 7 de março havia vencido o prazo dado pelo regime soviético. O primeiro assalto empreendido na noite do dia 07 a 08 de março não teve êxito, e o resultado foi terrível para os soldados do Exército Vermelho. Dybenko (um ex-membro da tripulação do Petropavlosk e proeminente bolchevique na frota durante a revolução) enviou um panfleto a seus "velhos camaradas marinheiros de Kronstadt", denunciando Petrichenko como um "Poltava kulak" (cidade ucraniana onde Petlyura havia nascido) e pediu aos rebeldes para depor as armas. Mais uma vez não houve uma resposta positiva por parte dos rebeldes.

Segundo o periódico de Kronstadt, a neve nas ruas da cidade estava começando a desaparecer já no dia 15 de março, portanto, não havia tempo para cerimônias. No mesmo dia, Mikhail Tukhachevsky (comandante das tropas do Sétimo Exército) deu a ordem de começar novamente o ataque à fortaleza. Após uma poderosa preparação da artilharia, as unidades do Exército Vermelho avançaram sobre o gelo. Cerca de 50.000 homens do Exército Vermelho e das forças especiais da Cheka, camuflados de branco e cantando a "Internacional", atacaram a fortaleza em três direções; após uma batalha espantosa, conseguiram escalar suas muralhas e controlar a guarnição. Os comunistas que estavam nos encouraçados Petropavlovsk e Sevastopol, unidos com a parte consciente dos marinheiros, prenderam alguns rebeldes do CRP e entregaram os encouraçados às tropas Vermelhas que avançavam sobre a fortaleza. Infelizmente, a maioria dos dirigentes rebeldes não teve um julgamento merecido, pois no último momento fugiram para a Finlândia do ditador Mannerheim. Entre eles estavam onze membros do CRP (incluindo Petrichenko) e os diversos "especialistas militares" (como Kozlovsky e Solovianov).

Em relação ao número de mortos, a manipulação anarquista não tem limites. Ante Ciliga afirma em seu livro, "No País da Grande Mentira", que Trotsky fuzilou "mais de dez mil marinheiros". O velho bolchevique deu a resposta: "duvido muito que a frota inteira do Báltico tivesse toda essa quantidade naquele momento".[51] Antes de mais nada é necessário esclarecer que em qualquer guerra sempre haverá vítimas e feridos; é sempre bom lembrar que os rebeldes rejeitaram os apelos do governo soviético em se render, portanto, tinham que arcar com todas as conseqüências que uma guerra produz. Cinicamente, Ante Ciliga faz uma inversão de papéis, pois a batalha foi sangrenta principalmente para os bolcheviques. Os amotinados (que detinham o poder de uma fortaleza fortemente armada) dispararam tiros de canhões e de fuzis do alto da fortaleza, muitos soldados do Exército Vermelho caíram no mar pelos buracos criados no gelo. Segundo estimativas, perderam-se cerca de 10.000 soldados do Exército Vermelho na luta contra os golpistas. Por outro lado, os mortos entre os rebeldes, incluindo os fuzilados depois da tomada da base, somaram-se 600 (sim, seiscentos!).[52] Dez mil soldados do Exército Vermelho pereceram durante a batalha, exatamente a cifra que a nossa "Alice" dá ao número de rebeldes mortos. O título de seu livro, "No País da Grande Mentira", é realmente um grande jogo de palavras, só resta saber quem é a Rainha de Copas nesse mundo imaginário criado por Ciliga: Petrichenko, Kozlovsky ou o Barão Vilken?

Quanto à repressão aos que ficaram na fortaleza, Trotsky diz: "Até onde recordo, Dzerzhinsky estava pessoalmente encarregado dela e não podia tolerar a menor interferência em suas funções (apropriadamente). Se houve vítimas desnecessárias não o sei. A respeito disto confio mais em Dzerzhinsky do que em seus irrequietos críticos" (idem). Em novembro de 1921, na comemoração do quarto aniversário da Revolução de Outubro, o governo bolchevique libertou de todo o castigo os trabalhadores inconscientes arrastados pela rebelião. Em 1922, o Comitê Executivo Central da URSS promulgou a segunda anistia, que se estendeu a todos que participaram do golpe. Para aqueles que haviam buscado exílio nos países estrangeiros lhes foram concedido à possibilidade de regressar à República Soviética. Apenas os principais dirigentes da rebelião continuaram na emigração, e há provas suficientes de que estes indivíduos estabeleceram um acordo com o Centro Nacional elaborando planos para a derrubada do governo soviético.

Em maio de 1921, Petrichenko e vários de seus companheiros refugiados no acampamento do forte "Ino" decidiram oferecer seus serviços como voluntários ao general Branco Wrangel. No final do mês, escreveram uma carta a David Grimm oferecendo suas forças numa nova campanha anti-bolchevique. Com a vitória na mão, os rebeldes e os Brancos instalariam uma "ditadura militar temporária" para impedir que o país se afundasse na anarquia. Petrichenko só exigiu um pequeno pedido a Wrangel: que num futuro remoto "o povo russo decidisse por si só que classe de governo desejaria ter".[53] Não é preciso dizer que David Grimm e Wrangel enviaram de imediato uma resposta favorável aos rebeldes, já que sabiam perfeitamente que uma vez instalada a "ditadura militar" ela, com certeza, não seria "temporária". No verão de 1921, Petrichenko colaborou com Grimm e o Barão Vilken no recrutamento de um grupo de marinheiros refugiados e os introduziu de contrabando em Petrogrado. Uma vez dentro da cidade, os marinheiros trabalhariam sob a direção da "Organização de Luta de Petrogrado", grupo clandestino afiliado ao Centro Nacional e encabeçado por Tagantsev (ex-professor de geografia da Universidade de Petrogrado), tendo como ajuda militar as tropas "voluntárias" do Barão Wrangel. O complô foi descoberto e a Organização de Luta foi imediatamente liquidada pela Cheka.

O ucraniano Stepan Petrichenko era, sem dúvida, um camaleão político profissional. Principal protagonista da rebelião de Kronstadt e líder dos rebeldes na emigração, este marinheiro anti-bolchevique já havia sido preso mais de uma vez antes do golpe por tentar estabelecer contato com as forças Brancas, entretanto, havia sido rechaçado pelos oficiais sob o pretexto de ter sido um "ex-comunista". Os sentimentos nacionalistas deste indivíduo eram tão fortes que seus próprios camaradas puseram-lhe o apelido de "Petlyura". Petrichenko viveu quase 25 anos na Finlândia após a supressão da revolta, onde prestou enormes serviços aos Brancos anti-semitas. Apesar disso, ele mudaria novamente de cor em 1927: trabalhou para Stálin como agente secreto na Finlândia até 1944, quando foi descoberto e preso pelas autoridades finlandesas durante a Segunda Guerra Mundial. No ano seguinte, foi repatriado à Rússia e morreu num gulag em 1947.

Por outro lado, não foram poucos os que compreenderam que a rebelião abria nitidamente um caminho à contra-revolução. O social-revolucionário Lamanov, por exemplo, arrependeu-se amargamente de sua participação e deu o seguinte depoimento:

"Mudei de opinião a respeito do movimento, e já não o considero mais como espontâneo. Até a tomada de Kronstadt pelas tropas soviéticas eu pensava que o movimento havia sido organizado por social-revolucionários de esquerda. Após ter me convencido que o movimento não era de forma alguma espontâneo deixei de simpatizar com ele. Segui tomando parte na Izvestia somente devido aos meus temores de que o movimento precipitasse à direita. Agora estou firmemente convencido, sem sombra de dúvida, de que os Guardas Brancos, tanto russos como estrangeiros, tomaram parte no movimento. A fuga para a Finlândia me convenceu disto. Agora considero que minha participação no movimento foi um erro estúpido e imperdoável" (Anatoly Lamanov, 19 de março de 1921. Kronshtadtskaia tragediia).

O mais irônico é que para defender a suposta "espontaneidade" do levantamento, o anarco-falsificador Israël Getzler faz uma breve citação desta declaração de Lamanov tomando apenas alguns parágrafos: "O motim de Kronstadt me pegou de surpresa. Considerei de imediato um movimento espontâneo" (idem). O pior é que Getzler não se restringe apenas ao interrogatório de Lamanov, mas a muitos outros documentos dos Arquivos Soviéticos que são citados apenas em partes. Devemos admitir que esses senhores aprenderam muito bem com o stalinismo como falsificar a história!

Victor Serge, um anarquista convicto na época, repudiou o assalto à fortaleza, mas reconheceu que o levantamento não caminhava em direção a um sentido revolucionário: "A contra-revolução popular transformou a reivindicação de sovietes livres pela de 'sovietes sem comunistas'. Se a ditadura bolchevique caísse, seria apenas um passo muito curto em direção ao caos e, através do caos, à insurreição camponesa geral, ao massacre dos comunistas, ao retorno dos emigrantes com suas políticas estéreis e antiquadas, e, no final, pela força incontrolável dos acontecimentos, à outra ditadura, desta vez anti-proletária" (Victor Serge, "Memórias de um Revolucionário", 1901-1941). A decisão em atacar a fortaleza foi adotada por unanimidade por meio de uma votação no Décimo Congresso do Partido Bolchevique, onde até a Oposição Operária (Shlyapnikov, Lutovinov, Alexandra Kollontai, Medvedev) e os Decemistas (centralistas democráticos), que possuíam críticas semelhantes aos dos anarquistas e faziam exigências anarco-sindicalistas, apoiaram a decisão de sufocar o motim e ainda por cima apresentaram-se como voluntários, enviando uma seção ao Sétimo Exército para lutar contra os rebeldes. A maioria da fração dos "anarco-soviéticos" (entre eles Roshchin e Shatov) apoiou totalmente o assalto à fortaleza. O anarquista Efim Yarchuk (que outrora havia pertencido a Kronstadt e, no momento da rebelião, encontrava-se em Moscou) chegou a escrever um livro sobre a atuação dos anarquistas na fortaleza durante o período revolucionário onde sequer dedica páginas ao golpe e aos rebeldes. No exterior, o Partido Comunista Operário Alemão, o KAPD (espartaquista), que também criticava certas medidas adotadas pelos bolcheviques, apoiou totalmente a ação militar do governo soviético contra os golpistas. O mais irônico é que certos anarquistas de hoje que reivindicam o legado do KAPD (como é o caso da Federação Anarquista da Grã-Bretanha) continuam a defender com unhas e dentes a rebelião de Kronstadt e sua tentativa de golpe militar. Algumas recalcitrantes realmente nunca aprendem com a história!

A rebelião de Kronstadt foi um movimento pequeno-burguês de natureza objetivamente contra-revolucionária, nada mais do que isso. Em relação às reivindicações, é necessário dizer que a requisição dos excedentes agrícolas havia sido necessária para manter o exército de pé e abastecer as cidades durante a guerra civil. Os bolcheviques (e, sobretudo, Trotsky) já haviam discutido a possibilidade de mudar a lei sobre as requisições acompanhada por um imposto em espécie, o que resultou na NEP. Uma rebelião como a de Kronstadt, num momento crítico da revolução e numa área estrategicamente importante, só poderia levar às piores conseqüências, conduzindo a República Soviética ao inevitável derrocamento. Por outra parte, a ideologia dominante entre os rebeldes era explicitamente reacionária, com nítidas manifestações de anti-semitismo e nacionalismo eslavo. Não foi à toa que o Guarda Branco do final do séc. XX, Boris Yeltsin, reabilitou esses degenerados em 1994, afinal de contas, seus anseios contra-revolucionários haviam sido finalmente atingidos. Basta mencionar também que um dos primeiros atos dos rebeldes kronstadinos foi o enviar um radiograma congratulando a posse do conservador republicano Warren G. Harring como presidente dos Estados Unidos (!!!).[54] Mas quem pensa que a simpatia da burguesia reacionária pela rebelião se extinguiu engana-se completamente. No site "Mídia Sem Máscara", organizado pelo astrólogo e dublê de filosofo Olavo de Carvalho, podemos observar um texto depreciativo contra Trotsky abordando o seu suposto papel "autoritário" no episódio:

"Trotsky foi o general-chefe que conduziu a repressão contra os marinheiros, os operários e os camponeses da ilha de Kronstadt, revoltados contra a 'autocracia bolchevique', em março de 1921. Depois de violentos combates, os rebeldes foram esmagados na manhã de 18 de março, exatamente 50 anos depois da proclamação da Comuna de Paris. Cerca de mil prisioneiros e feridos foram fuzilados no local (sic), 2.103 outros foram condenados à morte (sic), 6.459 foram levados às prisões e campos de concentração (dos quais apenas 1.500 ainda estavam vivos um ano depois) (sic)".[55]

A falsificação numérica muito mal-intencionada carece de comentários, mas em relação à participação direta de Trotsky no ataque à fortaleza, é necessário dizer que ele sequer tomou parte nas operações militares. Trotsky estava em Moscou exercendo seu trabalho político, as negociações com os marinheiros ficou inteiramente a cargo do Comitê de Defesa de Petrogrado, já que Zinoviev havia levado uma campanha demagógica contra Trotsky no debate sobre a questão sindical:

"A esmagadora maioria dos marinheiros que apoiaram a resolução de Zinoviev tomaram parte na rebelião. Considerei, e o Bureau Político não teve objeções, que as negociações com os marinheiros, e no caso de necessidade, sua pacificação, deveriam estar nas mãos dos dirigentes que até ontem tinham a confiança política destes marinheiros. De outro modo, a população de Kronstadt assumiria o assunto como se eu tivesse tomado 'vingança' sobre eles por ter votado contra mim durante a discussão do partido" (Trotsky, "Algo Mais Sobre a Repressão de Kronstadt").

Já as operações de ofensiva contra Kronstadt foram lideradas pessoalmente pelo notável oficial Mikhail Tukhachevsky, comandante do Sétimo Exército em Petrogrado. Apesar disso, Trotsky assumiu total responsabilidade pelo resultado final dos eventos, diferentemente dos covardes makhnovistas que assassinaram dezenas de legítimos comunistas, trabalhadores e judeus, e negaram cinicamente sua responsabilidade.

ANARCO-BOLCHEVISMO: O AVANÇO DO ANARQUISMO

Há quem insista no caráter sectário dos bolcheviques contra os opositores de "esquerda" durante os primeiros anos da revolução. Por mais que teimam, os críticos demagogos não podem negar o fato de que os bolcheviques foram demasiadamente tolerantes no tratamento aos partidos políticos não-bolcheviques durante os primeiros anos do governo. Os periódicos dos social-revolucionários, mencheviques e anarquistas tiveram plena liberdade de divulgação até agosto de 1918, mesmo tecendo críticas ao regime soviético e advogando por seu declínio. Evidentemente que para tudo há um limite, e nos dias trágicos em que sucedeu o assassinato de Volodarsky e Uritsky, bem como a tentativa de homicídio contra Lênin, a "brandura" e a paciência da revolução transformou-se em tolerância zero (acertadamente!).

Embora tenham tomado o poder sozinho em outubro de 1917, os bolcheviques demonstraram boa vontade em cooperar com outros partidos soviéticos, e com eles entraram em negociações. Os primeiros anos da revolução foi uma coalizão entre bolcheviques e social-revolucionários (representantes do campesinato no governo). Foram estes últimos, e não os bolcheviques, que romperam a coalizão após o Tratado de Brest-Litovsk, partindo de mala e cuia para o terrorismo e a reação Branca. Outros, porém, continuaram fiéis à revolução, os militantes esseristas mais valorosos e abnegados lutaram lado a lado com os bolcheviques contra toda a tentativa de golpe. O caso mais conhecido - não sendo, portanto, uma exceção - foi o de Yakov Blumkin, social-revolucionário de esquerda e um dos mais destacados membros da Cheka. Blumkin foi responsável por ter assassinado o embaixador alemão Conde Von Mirbach durante as negociações de Brest-Litovsk, agindo de acordo com as diretrizes de seu partido, na qual desejava provocar uma guerra entre Alemanha e Rússia. Mais tarde Blumkin se arrependeria deste ato imprudente e seria perdoado pelo regime soviético, retornando às suas funções na Comissão Extraordinária com a total aprovação de Dzerzhinsky. Blumkin destacou-se maravilhosamente na guerra civil, tornando-se um bolchevique responsável e capaz. Na década de 1920, denotou profundas simpatias pela única fração que representava a chama viva de outubro: a oposição trotskista. Quando Trotsky esteve exilado na Ilha de Prinkipo, Blumkin o visitou secretamente e voltou a Moscou com uma mensagem sua para a oposição, entretanto, antes de conseguir entregar a mensagem, foi preso e fuzilado pelo regime stalinista. Morreu gritando em alto e bom som: "LONGA VIDA A TROTSKY!". Blumkin foi um genuíno revolucionário, um chekista de primeira linha que jamais será esquecido pela história.[56]

Outro social-revolucionário intimamente ligado aos bolcheviques foi Mark Andreyevitch Natanson (Brobov), antigo dirigente populista e organizador do "Círculo Tchaikovsky". Exilado na província de Arkhangel, organizou em 1876 a "Sociedade dos Populistas do Norte" (uma seção dos narodniks), de cunho totalmente conspirativo. No verão do mesmo ano organizou e dirigiu um outro grupo que realizou a fuga de Kropotkin da prisão. Natanson foi um dos fundadores do "Zemlia i Volia" ("Terra e Liberdade"), tornando-se depois líder da "Narodnaia Volia" ("Vontade do Povo"), após a cisão. Preso em 1881, cuja implicação ligava-o diretamente ao assassinato do Czar Alexandre II, foi condenado a 10 anos de exílio na Sibéria. Em 1891, organizou com Viktor Chernov o partido "Narodnie Pravo" ("Os Direitos do Povo"), sendo preso em 1894. Natanson foi um dos fundadores do Partido Social-Revolucionário, membro de seu Comitê Central e chefe de sua ala esquerda desde 1905. Durante a Primeira Guerra Mundial, comportou-se como um legítimo internacionalista (diferentemente da maioria dos social-revolucionários). Natanson comandou os social-revolucionários de esquerda após a cisão de 1917, concedendo total apoio à aliança com os bolcheviques. Em oposição à política anti-bolchevique de seus companheiros após o tratado de Brest-Litovsk, Natanson encabeçou um grupo conhecido como "comunistas-revolucionários", apresentando-o como alternativa aos social-revolucionários de esquerda. Natanson foi totalmente contrário à criação de uma Assembléia Constituinte, apoiando a decisão de dispersá-la.

Mas não foram apenas militantes social-revolucionários de base que aderiram aos bolcheviques e lutaram do seu lado contra a reação. O mesmo ocorreu com os anarquistas, aos quais Lênin e Trotsky chegaram a estudar a possibilidade de brindá-los com uma área geográfica, com o consentimento da população local, para que assim pudessem pôr em prática suas experiências de uma ordem social sem Estado. Infelizmente, o estouro da guerra civil e as ações daninhas de Makhno impediram de levar adiante esta proposta.

Não foram poucos os anarquistas que apoiaram os bolcheviques e a ditadura do proletariado. Lênin chegou a tecer elogios à postura revolucionária desses notáveis militantes classificando-os como "os mais dedicados apoiadores do poder soviético", segundo suas próprias palavras:

"Numerosos operários anarquistas passam agora a ser os mais sinceros partidários do poder dos sovietes e, portanto, nos dão a prova de serem nossos melhores camaradas e amigos, os melhores revolucionários, que não eram inimigos do marxismo senão como conseqüência de um mal entendido... ou melhor dizendo, não como conseqüência de um mal entendido, mas da traição do socialismo oficial da Segunda Internacional ao marxismo, de sua queda no oportunismo e de sua falsificação da doutrina de Marx em geral e das lições da Comuna de Paris de 1871 em particular" (Lênin, Obras Completas, tomo XXIX, pág 567; Sochineniia, 2nd ed., 31 vols., Moscou, 1931-1935, XXIV, 437).

De fato, havia uma enorme diferença de princípios e métodos entre os diversos grupos de tendência anarquista, alguns bastante condescendentes e solidários, outros extremamente conservadores e sectários. Muitos militantes das fileiras anarquistas, os mais capazes e honestos, participaram nos sovietes em conjunto com os bolcheviques e decidiram que poderiam servir à causa da revolução entrando para as fileiras do partido:

"Numerosos militantes anarquistas são atraídos fortemente pelo bolchevismo no início da revolução: o russo americano Krasnotchekov e o franco russo Kibálchich, aliás, Victor Serge, unem-se ao Partido Bolchevique; outros, sem chegar a filiar-se, colaboram assiduamente. Este é o caso do ex-presidiário Sandomirsky e de seu companheiro Novomirsky, do anarco sindicalista Schapiro e, sobretudo, do antigo líder do sindicato revolucionário americano IWW (Industrial Workers of the World), o russo americano Bill Shatov, que será um dos fundadores da República Soviética do Extremo Oriente e do Exército Vermelho. O próprio Alexander Gay participará na guerra civil no bando Vermelho, sendo fuzilado pelos Brancos em 1919" (Pierre Broué, idem).

Bill Shatov foi um dos mais notórios anarco-sindicalistas apoiadores do regime soviético, colaborou ativamente com os bolcheviques durante a Guerra Civil Russa e criticou o "anti-bolchevismo" de seus companheiros mais próximos. A história deste intrépido militante revolucionário é fascinante: quando jovem, Vladimir ("Bill") Shatov havia emigrado para os EUA onde representou o papel de agitador do IWW, entretanto, voltou a Petrogrado assim que estourou a Revolução de Fevereiro, participando ativamente do movimento operário. Em outubro de 1917, foi eleito membro do Comitê Militar Revolucionário do Soviete de Petrogrado, presidido por Trotsky, e, juntamente com outros militantes bolcheviques, organizou a insurreição contra o governo de Kerensky, visando à tomada do Palácio de Inverno. Durante a guerra civil foi nomeado oficial do Décimo Exército Vermelho no outono de 1919, defendendo Petrogrado contra o avanço do general Yudenich. Em virtude de seus trabalhos militares foi condecorado com a Ordem da Bandeira Vermelha. No ano seguinte, em 1920, tornou-se Ministro dos Transportes da República Soviética no Extremo-Oriente da Rússia. Este grande herói da Revolução de Outubro e da guerra civil foi fuzilado sem julgamento pelo stalinismo, e não por Lênin e Trotsky.

Shatov deixava bem claro a Emma Goldman sua posição frente à Revolução de Outubro: "Eu apenas quero dizer a você que o Estado comunista em ação é exatamente aquilo que nós anarquistas havíamos sempre proclamado que se tornaria: um poder altamente centralizado, ainda mais rígido pelos perigos que corre a revolução. Em tais condições, não se pode fazer o que se bem entende. Não se pode simplesmente pular sobre um trem e viajar clandestinamente, ou talvez montar em pára-choques, como eu fazia nos Estados Unidos. Tem que ter permissão. Mas não pense que eu perdi minhas ?maldições? americanas. Entretanto, estou pela Rússia, pela revolução e por seu glorioso futuro". E Emma Goldman continua: "A experiência russa havia ensinado a ele (Shatov) que nós, anarquistas, 'éramos os românticos da revolução, totalmente esquecidos dos sacrifícios impostos, do preço assustador que os inimigos impunham e todos os métodos diabólicos que eles recorriam para destruir os ganhos obtidos pelo proletariado. O ser humano não pode lutar sob lógicas e justiças idealistas. Os contra-revolucionários combinaram isolar e subjugar a Rússia pela forme, e o bloqueio estava levando uma assustadora porcentagem de vidas humanas. A intervenção e a destruição imperialista seguia seus rastros, os numerosos ataques Brancos custaram oceanos de sangue; as hordas dos chefes militares Brancos - Denikin, Kolchak, Yudenich -, seus pogroms, vingança bestial, e a destruição geral impuseram à revolução uma guerra que seus mais sagazes intérpretes jamais haviam sonhado'" (citado por Paul Avrich, "Os Anarquistas na Revolução Russa", 1973).

A tentativa de entrar em concordância com a revolução deixando de lado a atitude hostil para com a ditadura do proletariado teve uma certa expressão entre o grupo conhecido como "anarco-universalistas". Entre eles encontrava-se um anarquista chamado Gordin (inspirador do Movimento Anarquista Pan-Russo e organizador da Federação Anarquista de Moscou), que sustentou na ocasião que "o período transitório é inconcebível sem uma ditadura. Se a violência desorganizada pode ser utilizada contra burgueses individuais, por que então a violência organizada não pode ser utilizada contra eles como uma classe? Sem uma ditadura durante o período de transição não poderá haver nenhuma transição à anarquia e à liberdade".[57] Os anarco-universalistas chegaram a organizar legalmente um Clube onde reuniam-se diversos militantes políticos, hostis e não-hostis aos bolcheviques, com plena liberdade de discussão e reunião. Desgraçadamente, quando a rebelião de Kronstadt estourou, a fração mais hostil aos bolcheviques apoiaram-na freneticamente conclamando em seus folhetos uma insurreição contra o governo soviético. Como conseqüência muitos deles foram encarcerados e o Clube deixou de existir já no ano de 1921.

O Clube dos Universalistas era composto por diversas facções, entre eles, social-revolucionários de esquerda, anarquistas de diversos matizes políticos, maximalistas e individualistas. Alguns defendiam o regime comunista como um estágio inevitável para o "período transitório" enquanto que outros (ou seja, os elementos mais extremados e sectários) condenavam veementemente os bolcheviques. Segundo Alexandre Berkman, os defensores argumentavam que "a ditadura era necessária para assegurar o completo triunfo da revolução; os bolcheviques haviam sido compelidos a recorrer aos confiscos e requisições dos excedentes da produção agrícola porque os camponeses se recusavam a apoiar o Exército Vermelho e os operários. Para eles, a Cheka era, portanto, necessária para suprimir a especulação e a contra-revolução" (Alexandre Berkman, "O Mito Bolchevique"). Em suas memórias, Berkman fala ainda da Conferência Anarquista no Clube dos Universalistas, citando a oratória do renomado anarco-bolchevique Yuda Grossman-Roshchin: "Os Universalistas, uma nova e diferente corrente russa, tomou uma posição de Centro, não concordando inteiramente com os bolcheviques como os anarquistas do moderado grupo 'Golos Truda', mas menos antagonista do que a ala extrema. O mais interessante discurso foi improvisado por Yuda Roshchin, um popular conferencista acadêmico e velho anarquista. Com sarcástica ironia, ele castigou a esquerda e o centro por suas atitudes indiferentes e hostis para com os bolcheviques. Ele elogiou o papel revolucionário do Partido Comunista e chamou Lênin de 'o maior homem do século'. Ele discorreu longamente sobre a missão histórica dos bolcheviques, e defendeu que eles estavam conduzindo a revolução em direção à sociedade anarquista, que garantiria a plena liberdade individual e o bem-estar social. 'É o dever de todo anarquista trabalhar sincera e cordialmente com os comunistas, que são a guarda avançada da revolução', ele declarou. 'Deixem suas teorias de lado e façamos o trabalho prático para a reconstrução da Rússia. A necessidade é grande, e os bolcheviques os acolherão de braços abertos'" (idem). Yuda Roshchin outrora havia pertencido ao grupo anarco-terrorista "Chernoye Znamya" ("Bandeira Negra") e era completamente hostil aos bolcheviques, porém, este notável anarquista progrediu consideravelmente durante a guerra civil. De acordo com Victor Serge, seguindo uma linha política baseada na realidade, Roshchin tentou encontrar um "sinal de convergência entre a teoria anarquista e a ditadura do proletariado" elaborando assim uma doutrina da "ditadura libertária do proletariado".

Internacionalmente a coisa não era diferente, o anarquista alemão Erich Mühsam da fortaleza de Augsbach expressou um ponto de vista próximo aos bolcheviques: "As teses teóricas e práticas de Lênin sobre a realização da revolução e as tarefas comunistas do proletariado têm dado uma nova base à nossa ação (...) Já não existem obstáculos insuperáveis para uma unificação da totalidade do proletariado revolucionário" (Erich Mühsam, Bull. Com., 22 de julho de 1920). Mas pode-se dizer que o anarquista britânico Guy Aldred foi um dos maiores responsáveis por apoiar os bolcheviques com extremo vigor fora da Rússia. Em 1920, Aldred escreveu sobre a necessidade de um período de transição durante a qual os trabalhadores deveriam proteger a revolução e organizar o esmagamento da contra-revolução: "Toda a ação da classe trabalhadora durante esse período precisa ser organizado através da ditadura", dizia ele. Enquanto a maioria dos anarquistas rejeitava a ditadura do proletariado e defendia sua total abolição, Aldred respondia: "A classe trabalhadora não poderá alcançar sua emancipação sem o estabelecimento da ditadura do proletariado (...) Esses anarquistas que se opõem à ditadura do proletariado como um meio de transição, prestam perigosamente um grande serviço à causa dos reacionários, embora seus motivos sejam ainda maiores. Como creio na classe trabalhadora, não compartilho dessa obsessão pela liberdade abstrata em detrimento da liberdade social real" (órgão "The Spur", junho-setembro de 1920; citado em "Anti-Parliamentary Communism - The movement for workers councils in Britain, 1917-45").

Guy Aldred repudiou as críticas de Emma Goldman ao regime soviético em seu órgão "The Commune", escrevendo que "seus julgamentos sobre os bolcheviques eram semelhantes às da propaganda Branca". Entre outras coisas, Aldred a chamava de "fura-greve revolucionária" e "ex-anarquista", de acordo com ele: "Goldman deveria ser boicotada e condenada por todos os trabalhadores por sua infame associação. Ela é uma traidora da luta dos trabalhadores e deveria ser 'chutada' com entusiasmo de todas as assembléias proletárias!".[58] As páginas do "Spur" também traziam freqüentes críticas a Makhno, sobretudo no momento em que este se recusou a atender ao pedido dos bolcheviques em deslocar suas forças ao front polonês, onde a República Soviética estava sendo golpeada com severidade pelo ditador Pilsudsky. O artigo é de autoria de Robert Minor e foi publicado originalmente no periódico norte-americano "The Liberator" em novembro de 1920: "Se a história for verdade, isso significa que o Exército Vermelho soviético foi derrotado na Polônia enquanto 75.000 homens vagabundeavam no Sul. Makhno poderia tê-los ajudado!". Com sua afiada ironia, Aldred satirizou a posição de Makhno afirmando: "Makhno prova seu heroísmo revolucionário servindo como um general dos Guardas Brancos poloneses, um testa-de-ferro da reação francesa!" (Aldred, "The Commune", junho de 1920).

Como militante de longa data, Guy Aldred foi membro da Federação Social-Democrata, abandonando-a logo depois e ingressando na Federação Comunista Anti-Parlamentar (APCF). Fundador da "Bakunin Press" em Londres, e autor de diversos panfletos anarco-comunistas, Aldred organizou o conhecido "Grupo Anarquista de Glasgow". Enquanto o anarco-chauvinista Kropotkin apoiava os Aliados e o Governo Provisório de Kerensky na sangrenta guerra imperialista, Aldred conduziu uma campanha antiguerra na Grã-Bretanha, chegando inclusive a ir à corte marcial e preso por ter se recusado a servir nas forças armadas. Aldred rompeu com a CNT quando o sindicato espanhol abraçou a frente popular, empreendeu uma dura luta não só contra o sindicato espanhol, mas também contra aqueles que, sob o manto do anarquismo, defendeu sua política nefanda no estrangeiro. Assim, Emma Goldman não haveria de ser deixada em paz:

"Sua liderança estrangeira regozija-se na idéia de poder. Emma Goldman falou ao 'Manchester Guardian' como representante dos governos de Barcelona e Valência e defende a posição de Montseny. A direção da CNT não pode ser defendida de jeito algum, pois eles traíram o anarquismo (...) Quando Emma Goldman veio para a Inglaterra, ela teve a incumbência de destruir o movimento anti-parlamentar daqui e estabelecer um controle ditado pelo bureau anarquista, defendido pelos capitalistas e todos os bureaus stalinistas defensores de assassinos. Mas isto não é anarquismo, assim como stalinismo não é comunismo ou socialismo" (Guy Aldred, New International, vol.4, nº 3, março de 1938, pp.80-82).

Segundo Aldred, Emma Goldman queria simplesmente explorar a Guerra Civil Espanhola a fim de "recuperar a posição que havia perdido através de seu carreirismo pequeno-burguês" (carta de Guy Aldred para Andre Prudhommeaux, 15 de outubro de 1936, Aldred Collection). Para ele, "o slogan do governo oficial na Espanha é 'a república democrática'. Isto significa exploração, mesmo que seja uma forma de opressão menor que a de Franco. Assim, este slogan não expressa as aspirações das massas espanholas na guerra civil. Eles querem, não o capitalismo democrático, mas nenhuma forma de capitalismo; eles querem fazer a revolução dos trabalhadores e estabelecer o coletivismo dos trabalhadores" (Aldred, "News From Spain", 1º de maio de 1937). Mesmo com suas posições anti-parlamentaristas, Aldred advogou (na época de Lênin e Trotsky) pela criação de uma organização anarco-comunista na Inglaterra que deveria filiar-se à Terceira Internacional. Aldred criticou a postura de certos stalinistas ingleses, como Gallacher, que antes citavam Lênin e Trotsky e, após a morte de Lênin, passaram a ter uma atitude hostil para com Trotsky, esquecendo cinicamente seu heróico passado revolucionário. Também não poupou críticas aos anarquistas ingleses em plena década de 20:

"Na Inglaterra, o anarquismo se degenerou em reformismo industrial e trade-unionismo (...) Os anarco-comunistas ingleses gastam mais tempo odiando Marx e admirando Bakunin do que pregando o atual socialismo ou tentando organizar a classe trabalhadora" (Guy Aldred, Workers' Liberty, Sixty Years of Defiant Struggle).

Em 1933, Guy Aldred deixou o APCF e criou o Movimento Socialista Unido (USM), apelando para a unidade revolucionária ele se expressou da seguinte forma: "Eu apelo aos meus camaradas do APCF, à Liga Comunista de Oposição e ao Partido Trabalhista Independente para juntos formarmos hoje a Quarta Internacional. Trotsky está certo: nós precisamos ter um proletariado unido!" (idem). Quando Trotsky foi expulso da Rússia pelo stalinismo bonapartista, tendo sido forçado a mover-se de país a país até chegar ao México, Guy Aldred prestou todo o seu apoio e solidariedade ao velho dirigente bolchevique, dizendo que "ele tinha todo o direito de engajar-se em qualquer agitação política onde quer que fosse, e tinha todo o direito de retornar à Rússia pela virtude de seu heróico papel na revolução" (Guy Aldred, "Spur", Agosto de 1920).

Apesar das diferenças que Guy Aldred tinha com Trotsky em relação ao caráter do Estado operário soviético, ele e alguns de seus companheiros ajudaram a distribuir o órgão trotskista norte-americano "The Militant" na Inglaterra, sem ligar para o que diziam os anarquistas sectários e ultra-esquerdistas. Infelizmente, devido à proporção que tomou os mitos em torno de Makhno e Kronstadt na década de 30, Aldred voltou atrás em relação às suas posições anteriores, abraçando de corpo e alma os mitos criados pela escola de falsificação anarquista. Mas nem por isso deixou de solidarizar-se com Trotsky e a criticar seus próprios companheiros anarquistas por sua conduta sectária. Se Aldred estivesse vivo nos dias de hoje, teria visto com seus próprios olhos a afluência de materiais encontrados que confirmam as posições de Lênin e Trotsky, e não há dúvidas que teria dado razão a ambos.

Por fim, nestes noventa anos da Revolução Russa é preciso trazer à memória um dos mais importantes heróis da guerra civil, um legítimo marinheiro de Kronstadt que lutou bravamente pela defesa do Estado operário e morreu no front de Odessa como um verdadeiro mártir, o anarquista Anatoly Grigorievitch Zhelezniakov.

Apelidado de "procelária" (um tipo de ave marinha que, em bandos, prenunciam tempestade), Zhelezniakov havia trabalhado num navio mineiro na base naval de Kronstadt durante o regime czarista. Foi sentenciado a quatorze anos de prisão pelo governo "democrático" de Kerensky por defender seus camaradas que haviam tomado a Vila de Dunorvo e a transformaram num local para leituras, discussões e lazer. Este intrépido marinheiro teve a incrível façanha de conseguir escapar da "prisão republicana" e, em 25 de outubro de 1917, ser eleito delegado pelo Segundo Congresso dos Sovietes pela tripulação do navio mineiro. Como internacionalista, organizou uma manifestação de marinheiros de Kronstadt na Embaixada norte-americana para protestar contra a sentença imposta a Tom Mooney em São Francisco. Em outubro de 1917, cooperou ativamente com os bolcheviques em todo o processo revolucionário pela derrubada do Governo Provisório, participando no ataque ao Palácio de Inverno e comandando um contingente de marinheiros que expulsou definitivamente Kerensky do poder. Sob as ordens dos bolcheviques, Zhelezniakov liderou um destacamento da Guarda Vermelha para dispersar a Assembléia Constituinte que havia sido organizada pelos social-revolucionários de direita. Durante a guerra civil, comandou um trem blindado no interior do Exército Vermelho e lutou contra os generais Brancos (entre os quais estavam Denikin e Krasnov) e contra os cossacos do Don do Ataman Kaledin. Diferentemente de Makhno, Zhelezniakov comandou um regimento no Exército Vermelho e jamais utilizou seus destacamentos para atacar militarmente as unidades bolcheviques, nem mesmo quando esteve temporariamente ausente de suas fileiras por discordar da inclusão dos especialistas militares (por sinal, uma opinião conservadora e preconceituosa compartilhada até mesmo por Stálin e Voroshilov, aos quais seriam eles próprios os traidores da chama revolucionária de Outubro). Neste período, Zhelezniakov comandou uma milícia operária de Guardas Vermelhos contra o Exército Branco, empreendendo táticas de guerrilha. Percebendo as limitações dessas pequenas forças militares, e compreendendo que os ex-oficias czaristas estavam sob o estrito controle operário, Zhelezniakov retornou ao exército regular com todo o gás de um jovem revolucionário de 24 anos de idade. No ano de 1919 retomou o comando no trem blindado, tendo sido designado para liderar a campanha militar contra os Brancos em Odessa. Na região, lutou ainda contra a rebelião do Ataman Grigoriev, a qual Makhno havia aderido por questões táticas e oportunistas. Zhelezniakov foi morto em 26 de julho de 1919 perto da cidade de Ekaterinoslav pelos Guardas Brancos de Denikin, cuja campanha havia oferecido uma recompensa de 400.000 rublos por sua cabeça. Os bolcheviques organizaram para ele um funeral digno e construíram uma estátua em sua homenagem na fortaleza de Kronstadt. Na época, muitos artistas dedicaram-lhe poemas e canções, abordando suas incríveis façanhas contra o Exército Branco. Hoje em dia, Zhelezniakov praticamente caiu no esquecimento, não vemos os anarquistas reivindicarem seu legado senão por mais meia dúzia de calúnias e falsificações. É profundamente lamentável como os grandes mártires (Zhelezniakov, Bill Shatov e Yuda Roshchin) são caluniados ou esquecidos pela historia cedendo lugar aos bandidos da contra-revolução. Está claro que a UNIPA e a maioria dos anarquistas de hoje não se identificam com os anarquistas que lutaram para defender a Revolução Russa, mas com aqueles que lutaram contra ela, exercendo um papel reacionário.[59]

A GUERRA CIVIL ESPANHOLA:
ÀS BARRICADAS, ÀS BARRICADAS, PELO TRIUNFO DA CONTRA-REVOLUÇÃO!

A experiência revolucionária das massas trabalhadoras espanholas em 1936-37 foi tão magnífica quanto a experiência da Revolução Russa, entretanto, foi completamente abortada pela burguesia republicana e os desprezíveis stalinistas, com a ajuda inestimável dos anarco-sindicalistas da Confederação Nacional do Trabalho (CNT). Só em 1936 a CNT possuía um milhão de membros e era a tendência que tinha mais apoio entre a classe trabalhadora. A revolução espanhola fracassou, não por culpa das massas que lutaram com uma coragem inaudita e com auto-sacrifício imenso, mas por culpa dos dirigentes pelegos, traidores do povo. Os anarco-stalinistas da CNT entraram descaradamente para a equipe ministerial burguesa e cumpriram todas as exigências da burguesia reformista e do stalinismo. De um lado estava o governo da frente popular, comprometido com a defesa da propriedade privada e da ordem social capitalista; do outro, as massas trabalhadoras que desejavam livrar-se do jugo capitalista e construir seu próprio governo e exercer sua ditadura. O que se produziu na Espanha foi semelhante ao poder dual na Rússia durante a Revolução de Fevereiro, só que aqui o Partido Bolchevique dirigiu a revolução, com Trotsky e Lênin à cabeça, enquanto que na Espanha os trabalhadores estavam representados pelos traidores do proletariado: anarco-reformistas, stalinistas, socialistas moderados, poumistas e a social-democracia republicana. A política destes senhores foi claramente reformista, contra-revolucionária e objetivamente criminosa para o proletariado e a revolução.

O Partido Comunista Espanhol (stalinista) obedecia religiosamente a política imposta por Stálin, que, por sua vez, tentava não alarmar os governos francês e britânico, seus aliados imperialistas. O dilema sobre o proletariado exercer ou não sua ditadura apresentou-se de forma dramática e oportunista aos dirigentes cenetistas, García Oliver dizia então: "ou a colaboração ou a ditadura anarquista". Mas para os trabalhadores só havia uma única opção: a ditadura do proletariado - a qual os "anarquistas soviéticos" haviam defendido lado a lado com os bolcheviques. Não é preciso dizer que os energúmenos dirigentes da CNT escolheram a colaboração de classes e, no final das contas, Franco acabou triunfando. Naquele período, Ricardo Sánz resumiu todo o problema do seguinte modo: "A partir do instante em que o movimento tivesse se responsabilizado por tudo, todo o mundo teria tido que obedecer nossas ordens. Que isso significa senão ditadura? Certamente, a ditadura não formava parte do programa anarquista, mas era a força das circunstâncias o que havia ditado nossa proposta (a tomada do poder), que naquele momento nos parecia uma saída. Mas não poderia ser... Por que não? Porque a CNT se opunha". Estes anti-bolcheviques ajudaram generosamente a burguesia e os stalinistas a dissolverem os comitês operários e as milícias armadas, bem como a reprimir os assaltos dos operários contra a propriedade privada, reconstruindo o Estado burguês da República espanhola e pavimentando o caminho para a vitória da ditadura nazi-fascista de Francisco Franco. Entre os anarco-ministros da CNT que entraram de bagagens para o governo da república burguesa, presidido por Francisco Largo Caballero, estavam: Juan García Oliver (Ministro da Justiça), Juan López (Comércio), Federica Montseny (Saúde) e Juan Peiró (Indústria). Até hoje todos esses canalhas são exaltados pela maioria dos anarquistas por suas "progressivas reformas"... BURGUESAS!

A frente popular espanhola sequer concedeu a independência nacional ao Marrocos, cuja libertação não agradava às potências imperialistas: "A principal base de operações de Franco era o Marrocos, uma colônia subjugada pela Espanha após muitos anos de violentas batalhas no deserto. Até mesmo do ponto de vista da democracia burguesa, a República poderia ter proclamado a independência do povo oprimido da colônia. Estrategicamente, na luta contra Franco, era o que deveria ter feito se queriam ganhar o apoio marroquino contra o fascismo. Mas Stálin e Azaña temiam alarmar os governos britânico e francês, que possuíam vastos impérios coloniais na África. Então, a República defendeu a exigência imperialista espanhola de governar o Marrocos" (Trotsky, "A Revolução Espanhola", 1931-39). A coalizão burguesa-anarco-stalinista governou as colônias espanholas do mesmo modo que a monarquia: através da Legião Estrangeira e dos mercenários nativos. O povo marroquino não viu nenhuma diferença entre o governo "democrático republicano" e a ditadura franquista, que conseguiu ocupar a colônia em 17 de julho de 1936, tendo servido desde então como base militar para as forças de Franco durante os primeiros seis meses da guerra, de onde fornecia tropas e provisões militares. O intrépido libertador nacional Abd-el-Krim, que estava exilado na França, ainda pediu ao governo frente-populista da Espanha que interviesse ao governo francês para permitir o seu retorno ao Marrocos com a finalidade de dirigir uma insurreição contra Franco. Ao temer a revolução proletária mais do que o próprio Franco, ambos os governos de frente popular rechaçaram este pedido. Os trotskistas foram os únicos a defenderem uma política revolucionária de libertação nacional ao povo marroquino, catalão e basco!

Na ocasião, ao responder o artigo de Trotsky de 1938 ("Muito Barulho por Kronstadt"), Emma Goldman teve a cara-de-pau de afirmar que "os princípios anarquistas estão sendo confirmados na Espanha (...) O construtivo trabalho empreendido pela CNT e a FAI é algo que o regime bolchevique jamais imaginou em todos os anos de seu poder!" (Emma Goldman, "Trotsky Também Protesta Muito", 1938). Só podemos dar boas risadas diante desse arremedo de piada! Para justificar a adesão da CNT à frente popular, esta grande anarco-comediante diria ainda que "tais ações não foram de sua escolha ou fantasia; foram impostas a eles pelo desenvolvimento da luta" (Address to the International Working Men's Association Congress). Ou seja, numa linguagem clara e objetiva: "porque as circunstâncias exigiram"... as circunstâncias burguesas, é claro! Enquanto Emma Goldman repudiou a postura dos anarquistas que apoiaram incondicionalmente o governo revolucionário de Lênin e Trotsky, ela deu todo o apoio à atitude subserviente da CNT em relação à frente popular e ao Estado burguês. A diferença, como já dissemos anteriormente, é que os anarquistas soviéticos exerceram cargos políticos num Estado operário, numa República Soviética, defendendo-a contra todas as investidas sangrentas da contra-revolução, enquanto que os dirigentes anarco-stalinistas da CNT exerceram cargos num Estado capitalista, numa República burguesa, cujo objetivo principal era paralisar a ascensão das massas e sua luta histórica contra o capital.

Os genuínos trotskistas, que estavam organizados através do Partido Bolchevique-Leninista da Espanha (seção da Quarta Internacional), formaram um bloco com os anarco-bolcheviques espanhóis representados pelos "Amigos de Durruti" (AdD), entretanto, ambos eram ultra-minoritários dentro do movimento de massas e foram esmagados pela vitória dos traidores frente-populistas. Desta vez, o ônus da culpa concernente à repressão desencadeada contra os anarquistas não caem sobre Lênin e Trotsky, mas nos próprios dirigentes anarquistas, que foram fiéis companheiros da burguesia e seu assessor internacional, Josef Stálin. O Comitê Regional da CNT, apesar de alardear sua ultra-democracia e opor-se aos métodos bolcheviques de organização, decidiu excluir de suas fileiras a única fração que ainda mantinha acessa a chama de seus ideais: todos os militantes do AdD foram expulsos num só dia e acusados de "agentes provocadores" pelos dirigentes cenetistas. Enquanto isso, o governo republicano censurava os periódicos da CNT e do POUM, sufocava a revolução proletária e fuzilava revolucionários! Diante de toda essa situação trágica, qual era a principal preocupação dos anarquistas estrangeiros? Mas é claro que era Kronstadt e Makhno, afinal de contas, era necessário defender seus companheiros cenetistas desviando o foco das atenções!

Qual devia ser a posição dos revolucionários no processo dual na Espanha ante a traição da frente popular? M. Casanova (militante trotskista da Quarta Internacional que participou ativamente de todo o processo da Guerra Civil Espanhola) nos dá a resposta:

"O emprego da violência é inevitável numa revolução, não somente violência revolucionária contra os fascistas e os inimigos declarados do proletariado, mas também, numa certa etapa do desenvolvimento revolucionário, contra as correntes reformistas e conciliadores dentro da classe operária. Todo o problema consiste nisto: em que sentido a violência deve ser empregada e a que fins políticos deve servir? Os stalinistas também empregaram a violência, mas à serviço de uma política contra-revolucionária que se orientava com a burguesia. Mas se no lugar da direção da CNT tivesse existido na Espanha não os charlatões anarco-ministros, mas jacobinos revolucionários, essa direção deveria ter empregado em maio de 1937 a violência revolucionária para desbaratar a provocação stalinista" (M. Casanova - pseudônimo de Mieczyslaw Bortenstein -, "A Frente Popular Abriu as Portas a Franco").

Todo marxista-revolucionário sério e conseqüente tinha plena consciência de que um fenômeno tão reacionário como o fascismo não podia ser detido por aqueles que o criaram, ou seja, a burguesia. A Quarta Internacional deu continuidade àquilo que a Terceira Internacional na época de Lênin havia proposto: uma Frente Única Operária (FUO), cuja tática não propunha uma aliança com as organizações burguesas e pequeno-burguesas que pretendiam "derrotar o fascismo freando a revolução", mas conformar uma frente dos trabalhadores contra seus inimigos de classe, uma linha classista onde a tática era "golpear juntos porém marchar separados", levando adiante as tarefas práticas para o triunfo revolucionário das massas proletárias. Não é preciso dizer que tanto os trotskistas espanhóis como os anarco-bolcheviques do AdD adotaram esta linha, convocando os trabalhadores a sublevar-se contra o fascismo, a burguesia republicana e os quinta-colunas stalinistas. Os Amigos de Durruti chegaram a clamar pela formação de uma "Junta Revolucionária" para "fuzilar todos os culpados que agrediram o povo", e ainda sustentaram que "todas as revoluções eram totalitárias por natureza". Os militantes trotskistas e os Amigos de Durruti foram, ambos, perseguidos pelo governo frente-populista e a GPU de Stálin; ambos solidarizaram-se um com o outro;[60] ambos romperam implacavelmente com a contra-revolução, quer estivesse representada por Stálin ou por seu vassalo García Oliver; ambos estiveram incondicionalmente ao lado do proletariado; já a CNT não podemos dizer o mesmo! Tanto os anarco-reformistas da CNT como os dirigentes do POUM ficaram do lado oposto da barricada, e pagaram muito caro por isso!

Não adianta hoje os anarquistas anti-bolcheviques, indiferentes à Revolução Russa, esconder-se por detrás de demagogias ocas como as de Makhno e Kronstadt, tentando assemelhar o governo revolucionário de Lênin e Trotsky com o stalinismo bonapartista. Como já foi exposto, uma parte considerável dos anarquistas não apoiaram nenhuma das duas rebeliões e estiveram lado a lado com os bolcheviques até a trágica morte de Lênin. O fracasso da revolução espanhola é a prova cabal de como o castelo de cartas da falsificação anarquista cai por terra. Como bem disse Trotsky: "Os advogados do anarquismo que pregam por Kronstadt e Makhno não enganam ninguém. Tanto no episódio de Kronstadt como na luta contra Makhno, nós defendemos a revolução proletária frente à contra-revolução camponesa. Os anarquistas espanhóis defenderam, e continuam defendendo, a contra-revolução burguesa frente à revolução proletária. Nenhum sofisma fará desaparecer da história o fato de que o anarquismo e o stalinismo estão do mesmo lado da barricada, e as massas revolucionárias e os marxistas do outro. Esta é a verdade que penetrará para sempre na consciência do proletariado" (Leon Trotsky, "Lições da Espanha: A Última Advertência").


NOTAS:

[44] Shetinov U. A., Krondshtadsky miatez i melkoburzuaznie partii. Kandidatskaia disertazia MGU, Moskva, 1974, p. 91-98.

[45] Shetinov, Kronstadt, março de 1921.

[46] Krondshtadskaia tragediia 1921 goda. Dokumenti v dvuch knigach. Moskva, ROSPEN, 1999, p. 320-321. Em 1994 muitos historiadores tiveram acesso aos arquivos soviéticos abertos pelo governo burguês de Boris Yeltsin (que, no mesmo ano, havia reabilitado os rebeldes kronstadinos). Muitos desses historiadores burgueses ficaram decepcionados por não terem encontrado provas que pudessem incriminar o regime revolucionário de Lênin e Trotsky. Por outro lado, além de terem descoberto um calhamaço de crimes cometidos pelo stalinismo, os documentos secretos revelaram mais uma vez (de forma surpreende para muitos) a natureza contra-revolucionária dos golpistas que tomaram parte na rebelião de Kronstadt. Estes novos materiais foram publicados em 1999 numa coleção de documentos do Arquivo Estatal Russo, editados pela casa editorial ROSSPEN. São dois grossos volumes com o título de "Krondshtadskaia tragediia 1921 goda. Dokumenti v dvuch knigach" ("A Tragédia de Kronstadt, 1921. Documentos em dois Volumes").

[47] Paul Avrich, idem.

[48] Vale ressaltar, como aborda Trotsky em "A Moral Deles e a Nossa", que o decreto não fez fuzilar sequer um único parente dos oficiais, mesmo com as constantes traições destes últimos.

[49] Publicado no "Revolutsionnaya Rossiya", jornal social-revolucionário. No. 8, maio de 1921. Ver também o Izvestia de Moscou, comunista, No.154, 13 de julho de 1922. Lembremos que Chernov era o mesmo demagogo que os marinheiros de Kronstadt pretendiam linchar em 1917 perto do Palácio Taurida, se não fosse pela intervenção de Trotsky frente aos marinheiros. Podemos observar com clareza que as consignas apartidárias dos rebeldes kronstadinos eram exploradas ao máximo pelos social-revolucionários e outras correntes de cunho notadamente reacionário. A demagógica consigna de "Abaixo a Direita e a Esquerda" não era, sem dúvida, exclusividade dos anarquistas. Como já observamos, isso também foi muito comum na Ucrânia.

[50] Citado por Alexandre Berkman, "A Rebelião de Kronstadt"; Revoliutsionnaia Rossiia, 1921, Nº 8, págs. 3-4.

[51] Trotsky, "Algo Mais Sobre a Repressão de Kronstadt", New International, agosto de 1938.

[52] Paul Avrich, idem.

[53] Carta de Petrichenko e seus camaradas a David Grimm, forte "Ino", 31 de maio de 1921, e a Wrangel, 31 de maio de 1921, Grimm Archives e Giers Archives, File 88; citado por Paul Avrich, idem.

[54] Citado por Shetinov em "A Tragédia de Kronstadt".

[55] Carlos I. S. Azambuja, "Trotsky, O Profeta Armado", 15 de fevereiro de 2007, MidiaSemMascara.org - a matéria é um resumo das páginas 84-94 do livro "Cortar o Mal pela Raiz! História e Memória do Comunismo na Europa", de diversos autores sob a direção de Stéphane Courtois, editora Bertrand do Brasil, 2006. Website:  http://www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=5569.

[56] Vale ressaltar que Blumkin não foi reabilitado por nenhum dos governos que sucederam o regime stalinista, sendo considerado até hoje como um "assassino sanguinário da Cheka".

[57] Yaroslavsky, idem.

[58] Ben Annis, idem.

[59] Ao lado de Zhelezniakov, Nicolau Georgevitch Markin pode ser considerado como um dos mais heróicos mártires da Guerra Civil Russa. O primeiro foi um anarquista, o segundo um bolchevique de primeira ordem, ambos foram filhos legítimos de Kronstadt. Trotsky narra a história deste personagem com intensa e emocionante paixão em sua autobiografia: "Este terno amigo que tinha aberto, como igual, sua alma aos nossos filhos, era também um velho lobo do mar e um revolucionário, um verdadeiro herói, como nos mais maravilhosos dos contos" (Trotsky, "Minha Vida"). Markin morreu no front do Volga lutando bravamente contra as investidas dos Brancos. Segundo Trotsky, foi graças a muitos "Markins" que a Revolução de Outubro triunfou.

[60] Os Amigos de Durruti chegavam a ajudar os trotskistas a distribuir sua imprensa nas ruas espanholas!!!