“Se em 1985 a
peãzada pôs os capitães do mato da GM no 'chiqueirinho' e arrancou a histórica redução
da jornada, em 2013, com a colaboração da Conlutas, a GM 'enchiqueirou' os operários sob a chantagem das demissões e impôs o aumento da jornada, a redução do salário e a demissão de centenas de pais de família”
Para contribuir com a reorganização
combativa do operariado hoje a partir do resgate do passado de lutas fabris o Jornal
O Bolchevique da Liga Comunista entrevistou o advogado do Sindicato dos Metalúrgicos
de São José dos Campos (SJC) na época da greve de ocupação da fábrica da General
Motors (GM) em 1985, o Dr. João Neto. O camarada foi contratado um mês após a
greve para reforçar o jurídico do Sindicato nas ações de reintegração no
emprego dos líderes grevistas (reclamações trabalhistas), ocasião em que também
foram contratados outros advogados para fazer a defesa criminal dos
trabalhadores (Luis Eduardo Greenhalhg e Dra. Mary), nas ações promovidas pelo
Ministério Público Estadual. Ao fazer este resgate histórico não podemos deixar
de comparar a vitória de 1985 com a derrota de 2013, pelas mãos da
Conlutas/PSTU, denunciando o recente Acordo Escravocrata assinado pela
Diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos de SJC com a multinacional dos EUA, que
está na contramão desta perspectiva.
JOB – Dr. João Neto, qual foi o
motivo da greve ?
JN. – A greve foi deflagrada pela
redução da jornada para 40 horas semanais, sem redução de salário. Este foi o
principal motivo. A jornada semanal do trabalho do operário horista passava de
60 horas.
JOB – Você falou que o principal
motivo da greve foi a luta pela redução da jornada para 40 horas, sem redução de
salário. Houve outros motivos?
JN. – Sim. Os trabalhadores
sempre reclamaram da violência da GM. Os operários sempre eram importunados
pelos seguranças da empresa, os quais os obrigavam a passar por revista (tinham
os bolsos e os embrulhos revistados) na saída, onde havia até detector de
metais. Os encarregados espionavam os metalúrgicos até nos banheiros.
Além disso, havia sempre a ameaça
de demissão. A rotatividade de mão-de-obra. A GM tinha uma “tradição” de no
início e no final do ano demitir trabalhadores. Não pagava adicional de
insalubridade, nem cumpria a norma de salário igual para trabalho igual. Não
fornecia Equipamento de Proteção Individual – EPI, no caso o sapato de segurança.
O trabalhador horista, apesar de trabalhar pesado, comia refeição inferior,
servida em bandejão, sendo que quando repetia, somente podia pegar arroz e
feijão, ainda assim, muitas vezes era censurado. Havia discriminação, por parte
da empresa, entre horista e mensalista, sendo que estes tinham tudo do bom e do
melhor (restaurante com refeição à la carte, hotel de luxo dentro da própria
empresa, viagens pagas para o exterior, etc.). Tal discriminação era uma forma
de tentar dividir os trabalhadores, motivo pelo qual a GM impedia aos
mensalistas de participarem da Comissão de Fábrica, alegando que tinham um
canal direto para reivindicar. O sistema de funcionamento da GM, segundo os
metalúrgicos, parecia o de um quartel.
JOB – Quem dirigiu e organizou a
greve de 1985?
JN. – A greve foi dirigida pela
diretoria do Sindicato, formada por militantes do Partido dos Trabalhadores (da
direção majoritária – posteriormente chamada de Articulação e hoje CNB – e da Convergência
Socialista), a Comissão de Fábrica, os cipeiros e militantes combativos do
Sindicato que formavam o comando da greve.
O comando de greve era muito
organizado, determinado e combativo. Havia a “TV Vaca Brava – Canal 40 horas no
ar: greve também é cultura.” Por outro lado, a mídia na época, como o “O Estado
de S. Paulo”, falava que havia uma suposta “milícia metalúgica.”
JOB – Como foi a greve ?
JN. – A greve foi pacífica por
parte dos trabalhadores, mas houve truculência da empresa e da repressão da
Polícia Militar, as quais montaram uma verdadeira operação de guerra contra os
metalúrgicos, desde o início da greve no dia 11 de abril até o seu término no
dia 8 de maio de 1985. Importante frisar que, no dia 25 de abril, a fábrica da
GM foi ocupada por decisão da Assembleia dos trabalhadores.
A ação mais radicalizada da greve
ocorreu quando o conjunto dos trabalhadores, todos os trabalhadores colocaram
os prepostos da GM (chefes, supervisores, seguranças, etc.) num local da
empresa, perto do Hotel de Luxo que havia dentro da fábrica, local esse que
ficou conhecido como “chiqueirinho”. Os prepostos da empresa chegaram a dormir
ao relento.
Em 27 de abril foi formado o
Fundo de Greve dos Metalúrgicos de São José do Campos e Região, para dar
condições materiais ao desenvolvimento da luta.
JOB – Qual foi a posição da patronal?
JN. – A GM recusou-se a negociar
com os trabalhadores. Inicialmente demitiu 93 metalúrgicos (diretores de
sindicato, membros da comissão de fábrica, cipeiros e militantes combativos),
sendo que ao final demitiu 403 trabalhadores.
JOB – E os governantes da época?
JN. – O governador da época,
Franco Montoro, mandou abrir inquérito para apurar “quem eram os criminosos da
greve.”
JOB – Qual o balanço da greve de
ocupação de 1985 ?
JN. – A greve conquistou a
histórica jornada de 44h quando a maioria da categoria trabalhava muito mais do
que isto, como dissemos, chegava a 60h enquanto a jornada legal na época era de
48h30 min. e somente com a Constituição Federal de 1988 é que passou a ser 44
horas. A avaliação que faço é a de que a greve foi importante para o
desenvolvimento da luta de todos os trabalhadores pela redução da jornada e em
particular para a luta do Sindicato contras os patrões, preservando empregos e
o fortalecimento da categoria, colocando a questão de quem é o verdadeiro dono
da fábrica com a ocupação ocorrida na greve de 1985.
Logo em seguida houve a adaptação
do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e da CUT com uma política de conciliação
de classes. Assim, o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos
tornou-se a vanguarda da Categoria, numa região estratégica onde havia, na
época, indústria aeronáutica e de armamentos.
JOB – E o acordo atual do
Sindicato com a GM ?
JN. – Primeiramente é preciso
destacar que não houve por iniciativa do sindicato nada parecido com a greve histórica
que tratamos aqui. O centro de atuação do PSTU (herdeiro da antiga CS) e da
Conlutas não foram os métodos da classe e muito menos as ações radicalizados que
derrotaram a GM em 1985. O PSTU optou por fazer admoestação aos governos patronais
de Dilma, Alckmin e Cury. Com métodos estranhos aos da classe o resultado só
poderia realmente ser um Acordo escravocrata, que aumenta a jornada, reduz o
piso salarial e permite a demissão de centenas de metalúrgicos.
A diretoria justifica que
qualquer acordo nos marcos do capitalismo é nocivo, querendo dizer, como na
música de Chico Buarque e Ruy Guerra, que “não existe pecado do lado de baixo
do Equador”. Mas na verdade há acordos e acordos. Acordo traidor é
injustificável. Se pequenas concessões levam a grandes derrotas, imagine uma
traição dessas. Isso tudo demonstra o grau de burocratização e degeneração da
diretoria atual, que deve ser substituída pela categoria. Se em 1985 a peãzada
pôs os capitães do mato da GM no chiqueirinho e arrancou a histórica redução da
jornada, em 2013, com a colaboração da Conlutas, a GM ‘enchiqueirou’ os
operários sob a chantagem das demissões e impôs o aumento da jornada, a redução
do salário e a demissão de centenas de pais de família.
JOB – O Sr. deseja falar mais
alguma coisa ?
JN. – Eu só quero agradecer a
vocês e desejar que a categoria supere a atual direção do Sindicato, sem
permitir que setores da oposição de direita do movimento, tradicionalmente ligados
ao PT e PCdoB, mais ainda ligados a patronal, tomem conta do mesmo. A atual
direção se tornou imprestável para o desenvolvimento da luta devido a sua
degeneração política, sendo certo que Partido Socialista dos Trabalhadores
Unicado (PSTU), ao qual pertence a diretoria do Sindicato, com esse Acordo
Escravocrata, com a posição pró-imperialista na Líbia e na Síria, atravessou o
rubicão, tornando-se inimigo da classe operária, o que coloca aos seus
militantes honestos e revolucionários que rompam com sua direção, visando
construir uma partido operário comunista marxista e revolucionário.