Para derrotar a “austeridade” imperialista que lhe rouba salário,
emprego e conquistas históricas, o proletariado francês precisa aliar-se a seus
irmãos oprimidos africanos
O ministro da Defesa
francês, o “socialista” Jean-Yves Le Drian, declarou sobre a intervenção no Mali: "O objetivo é a
conquista total. Nós não vamos deixar bolsões de resistência". Para bom entendedor, a "conquista total" significa muito mais do que a derrota da resistência. A partir desta campanha militar a luta
inter-imperialista mundial pode ganhar uma nova dinâmica que precisa ser
acompanhada mais de perto sem a exclusão de alternativas até então menos
prováveis.
De certo modo, a crise econômica nos EUA, consumindo grande parte das preocupações da era Obama, que busca manter uma liderança na retaguarda militar dentro da OTAN e pela larga ampliação do uso de drones, substituindo missões com soldados, tem favorecido as iniciativas francesas que expande seus domínios coloniais em meio à crise econômica na UE e os limites históricos pós-II Guerra impostos a maior potência econômica do continente, a Alemanha [1].
De certo modo, a crise econômica nos EUA, consumindo grande parte das preocupações da era Obama, que busca manter uma liderança na retaguarda militar dentro da OTAN e pela larga ampliação do uso de drones, substituindo missões com soldados, tem favorecido as iniciativas francesas que expande seus domínios coloniais em meio à crise econômica na UE e os limites históricos pós-II Guerra impostos a maior potência econômica do continente, a Alemanha [1].
É possível que a partir de um salto de qualidade na África,
da provável retirada da Inglaterra de dentro da UE, e do estreitamento de seus
laços comerciais com a America Latina [2], onde disputa influencia com os EUA em
vários setores industriais, o imperialismo francês busque assumir cada vez mais
o papel de coringa na disputa entre os blocos mundiais. Se o próprio Obama ou
um governo republicano que lhe suceder resolver retomar o protagonismo ianque
no Ocidente, tentando recuperar inclusive áreas onde a França avançou, o
conflito de interesses pode aprofundar-se a uma posição em favor de um
alinhamento oposto, em que Paris avalie que a perda de hegemonia dos EUA lhe
seja imensamente mais vantajoso.
Mas, até agora, com os EUA ocupando um papel secundário no
controle do espaço ocidental por ter deslocado a maior parte de seu arsenal
para a região do pacífico e costa da China, tem sido vantajoso para a França
assumir o protagonismo na região mediterrânea e africana como principal força
militar da OTAN em atividade recolonialista desde 2011. Mas os EUA tratam de
por as barbas de molho, na última semana de fevereiro, Obama ordenou o envio de
tropas e drones para o Níger com a vaga justificativa de "promoção dos
interesses nacionais dos EUA de segurança." [3]. Fato é, como bem
destacara o jornalista John Pilger que uma nova invasão da África de grandes proporções
está em andamento [4].
A França amplia seus domínios na África como aríete do bloco
imperialista ocidental contra a China tomando espaço antes dominados por seus “aliados”
europeus, agora em decadência econômica como a Itália. É bem sabido que a
França se apoderou de imensas fatias de contratos de petróleo e gás da Líbia
que antes pertenciam ao imperialismo italiano.
As legiões estrangeiras francesas não são conhecidas na
África por levar a civilização e boas maneiras. A França terá de impor este
método de ocupação para evitar a retomada do controle secular do deserto pelos tuaregues.
Por isto, a propaganda de guerra da campanha francesa, mais do que apelos
humanitários, precisa da risível justificativa de preservação do patrimônio
histórico da região e o combate ao terrorismo.
O governo “socialista” até se esforça para tentar convencer “nossa
intervenção não tem outro objetivo que a luta contra o terrorismo”, declarou Hollande
no dia 12 de janeiro, mas tem sido impossível ocultar as ambições da 5ª República
que almeja sair da crise econômica ampliando sua rapina imperial. Afinal, o Mali
parece ser um país realmente pobre. Mas não é exatamente assim. É o terceiro
produtor de ouro africano, depois de Gana e África do Sul. A produção anual é 52
toneladas de ouro, o que, segundo especialistas, pode ser aumentada para 100
toneladas em 2-3 anos (para comparação, a Rússia produz anualmente cerca de 200
toneladas). Mali também é o Eldorado do urânio. A francesa Areva, líder mundial
de energia nuclear, já começou a explorar Saraya situada na fronteira
senegalesa. Em 15 de novembro 2012, assinou um acordo com o estudo de
viabilidade do Sul Africano DRA Grupo com foco em produção de prata, urânio e
cobre. Segundo estimativas, os depósitos contêm cerca de 12 mil toneladas de
urânio, quatro vezes mais do que a mina Areva no Níger produzido em 2012.
Hollande espera sair da crise econômica atirando para
catapultar a participação francesa na recolonização planetária já dinamizando
sua economia apostando em forças destrutivas [5]. Mas, em seu intento
distracionista da luta de classes internas o “social-imperialista” francês pode
colher efeitos colaterais bem mais convulsivos do que os que vem colhendo os
governos da Grécia, Espanha, Portugal e Itália com seus planos de ataque
econômico contra as massas de seu próprio país. Mas, como muitos analistas já
comentam, o Mali pode se conveter no Afeganistão francês, ou pior. Hollande
pode colher a combinação da revolta proletária interna que estão sendo
executados com a luta anti-imperialista dentro de seu próprio território,
através de levantes populares e ações de guerrilha das imensas comunidades
africanas periféricas, cidadão de 2º categoria de Paris e adjacências ou nem
sequer reconhecidos como cidadãos franceses. Dentre as massas francesas existem
milhares de argelinos, tunisianos, africanos em geral e também muitos trabalhadores
e dezenas de milhares de alunos secundaristas nascidos no Mali ou descendentes
de malineses. No caldo de insatisfações contra a intervenção militar se combinam
razões étnicas, de libertação nacional e de classe.
O neocolonialismo da OTAN e Frankafrica já foi capaz de
realizar proezas maiores em tempo recorde: unificou em uma frente panafricana e
antiimperialista a jihadistas que ajudaram o CNT a derrubar Kadafi com Tuaregs
que eram aliados do regime do caudilho líbio. Foram unidos pela miséria
crescente que a França e seus aliados acentuam por seu parasitismo secular e
suas aventuras militares no continente e agora voltam às armas para seus
antigos generais.
Em sua ultima reportagem sobre o tema a revista Time levanta
dúvidas sobre a saída das tropas francesas anunciadas para este mês de março: “É
cada vez mais improvável que esta intervenção militar da França no Mali será breve.
Apesar de comentários de autoridades francesas no início deste mês que Paris
espera começar a retirar as tropas, em março, parece agora evidente a resistência
enrijecimento dos grupos jihadistas no Sahel – empurrado para fora das cidades
do norte do Mali pela expedição francesa liderada mês passado – vai exigir uma
persistente presença francesa por meses, talvez até anos.” (“The War in Mali: Does France Have an Exit
Strategy?”, Time, 17/02/2013) [6].
Apesar da crise econômica e dos cortes aos gastos públicos
que a União Europeia vem exigindo, Le Drian, o ministro francês da Defesa, informou
que as operações da “conquista total” contra os “terroristas” custaram, até o
momento mais de 100 milhões de euros à França. “Hoje podemos estimar em pouco
mais de 100 milhões de euros [aproximadamente 260 milhões de reais] o que se
gastou a partir de meados de janeiro,” quando começou a intervenção militar no
Mali, disse Le Drian na entrevista concedida à emissora RTL. Se um povo que
oprime outro forja suas próprias cadeias, as cadeias da austeridade que aterrorizam
o proletariado europeu se tornam mais insuportáveis para pagar os esforços de
guerra da burguesia francesa para aumentar seu saque a África. Em janeiro,
centenas de trabalhadores da planta da Peugeot de Aulnay que ocupam a empresa
para evitar seu fechamento se somaram aos e da planta da Renault de Flins que
lutam contra as 7.500 demissões anunciadas pela multinacional automobilística até
2016. Ao contrário de exterminar a resistência no deserto africano o
imperialismo está fustigando os “bolsões de resistência” proletários em suas
próprias cidades.
Mais uma vez o proletariado francês é chamado a lutar contra
suas próprias cadeias e contra as cadeias forjadas da política neocolonial da
república burguesa francesa e constituir uma Frente Única Antiimperialista (FUA) com seus
irmão guerrilheiros e oprimidos africanos.
A quase totalidade da esquerda mundial, refém da pauta midiática
imperialista, já abandonou qualquer referência a luta contra a intervenção
imperialista no Mali, enquanto a esquerda francesa apoia a carnificina em curso.
Como denunciamos em nossa declaração, para o NPA, por exemplo, que se declara
formalmente contra a invasão militar ao Mali, “a questão não é conformar uma
Frente Unida Anti-Imperialista contra a invasão francesa, mas limitar-se a
apoiar aos agrupamentos de esquerda e as forças progressistas enquanto o
imperialismo pode bombardear e mandar para o inferno os reacionários e assim se
pode aproveitar-se da nação e de seus recursos realmente sem qualquer objeção
uma vez que se trata de uma guerra contra os tais reacionários.” (MALI: Derrotar
a invasão imperialista francesa!, Declaração do Comitê de Ligação pela IV Internacional,
25/01/2013) [7]
É somente superando seus próprios “socialistas”, stalinistas
e pseudo-trotskistas cúmplices da campanha de guerra contra os povos oprimidos
africanos que poderemos construir um partido que unifique valentemente a luta
antiimperialista com a luta pela revolução social, seguindo o caminho trilhado
pela Comuna de Paris que as massas francesas demonstrarão mais uma vez que
merecem o posto de “país em cuja história a luta de classes, mais do que em
qualquer outro, foi resolutamente conduzida até o fim” (F. Engels, trecho do
prefácio do 18 Brumario de Marx).
Notas:
[1] Enquanto a França já não possui mais bases aéreas dos
EUA instaladas em seu território desde 1967, é na Alemanha (Ramstein) que está
instalado o centro de operações da Força Aérea estadunidense na Europa. Isto é
um sintoma do grau de independência militar que possuem as duas nações
imperialista em relação aos EUA.
[4] “The
real invasion of Africa is not news and a licence to lie is Hollywood's gift”
em http://www.marchaverde.com.br/2013/02/a-invasao-da-africa-que-nao-esta-nos.html