Camboja, Vietnã, Laos e Etiópia
Mao esmagou a greve dos trabalhadores que saudaram o ingresso de seu
"Exército Vermelho" em Pequim, em 1949. Sob a influencia maoísta, o
Camboja / Kampuchea não era um Estado operário deformado até sua invasão pelo
Vietname, em 1978. Por isso, Peng Shuzi está errado quando raciocina assim:
“Em nossa opinião é a de que sob o regime de Pol Pot, o
Camboja foi muito contraditório. Por um lado, Pot havia confiscado as
propriedades da burguesia e estabelecido relações de propriedade socialistas;
sobre este ponto básico, era um Estado operário. Mas, por outro lado, uma vez
que ele foi o mais estúpido e mais brutal entre os burocratas stalinistas, um
açougueiro que matou mais de um milhão de pessoas, o seu regime era uma
ditadura brutal profundamente odiada pelo povo cambojano. Do ponto de vista
dialético, a progressividade das suas nacionalizações da propriedade não pode
ser negada, e deve ser apoiada. Mas o seu aventureirismo cego por abolir toda a
moeda e interromper todo o comércio devem ser criticados; assim como a seu terrível
dominio burocrático, ele deve ser duramente desmascarado e denunciado. Mas o
SWP possui opiniões diferentes. Ele ressaltou os crimes da ditadura burocrática
e negou o fato do confisco da propriedade privada por Pot, sendo assim definiu
o Camboja como um país capitalista. Tal ponto de vista é estranho, porque um
país capitalista sem propriedade privada e sem comércio nunca existiu no mundo.
Como Cuba apoiou ao Vietnam, o SWP também seguiu a burocracia castrista e também
apoiou o lado do Vietnã neste conflito. [I]
Tropas vietnamitas invadem o Camboja em 1979 |
Antes da invasão do Vietnã o Camboja não era um Estado
operário, não só porque Pol Pot não mobilizou a classe trabalhadora de forma
alguma para derrubar as relações de propriedade, mas porque ele imediatamente
dizimou não só aos capitalistas, mas também a classe trabalhadora; na verdade
seu primeiro ano no poder já destruiu toda a cultura moderna do país. Peng diz:
"Tal ponto de vista é estranho, porque um país capitalista sem propriedade
privada e sem comercio nunca existiu no mundo". Mas um Estado operário sem
uma classe trabalhadora ou comércio nunca existiu e nunca poderá existir. Pol
Pot fez com que o país retrocedesse ao barbarismo pré-capitalista. Como Wikipedia
relata: "ele havia deixado a República Popular de Kampuchea [fundada pela
Frente de Salvação, em 1979, após a invasão vietnamita - nota do SF] com muito pouco
para recomeçar, pois não havia aparato repressivo policial, escolas, livros, hospitais,
correios, telecomunicações, sistema jurídico e nem mercados, seja estatal ou
privados". [A].
Peng também não conseguiu ver a situação de conjunto, a
invasão por parte do Vietnã foi historicamente progressista e, sem dúvida, a
República Popular do Kampuchea (1979-1989) se tornou um Estado operário
deformado sob o governo da Frente de Salvação. Foi apoiado pela URSS, Vietnã e
Cuba, mas enfrentou a oposição da China, Grã-Bretanha, dos EUA e os países da
ASEAN, o que o impediu de obter um assento na ONU e reconhecimento internacional.
As "democracias", servilmente apoiadas pela China, continuaram a
apoiar os restos do exército de Pol Pot e duas outras forças guerrilheiras
pró-imperialistas até que o regime não suportou a instabilidade e capitulou
inteiramente. O Estado tornou-se abertamente capitalista em 1989. O chamado
marxismo-leninismo foi abandonado como ideologia de Estado em 1991. A monarquia
foi restaurada em 1993. Tailândia e China forneceram ao genocida Pol Pot grandes
quantidades de armamentos concedidos pelo ocidente imperialista.
Já em 1986 o Vietnã foi reconvertido em Estado
capitalista, sendo o primeiro Estado Operário Deformado a ser abolido “à frio”
no período do "colapso do comunismo".
No VI Congresso Nacional do Partido Comunista do Vietnã,
em dezembro de 1986, políticos reformistas substituiram o governo da "velha
guarda" por uma nova direção. Os reformadores foram conduzidos pelo velho Nguyen
Van Linh, de 71 anos, que se tornou o novo secretário-geral do partido. Linh e
os reformadores implementaram uma série de reformas de livre mercado -
conhecido como đối moi ("Renovação") – que conseguiu realizar cuidadosamente
a transição de uma economia planificada para uma "economia socialista
orientada para o mercado". Embora a autoridade do Estado tenha permanecido
incontestada sob đối Moi, o governo incentivou a apropriação privada de
fazendas e fábricas, a desregulamentação econômica e do investimento
estrangeiro, mantendo controle sobre setores estratégicos. A economia
vietnamita passou posteriormente por um forte crescimento na produção agrícola
e industrial, construção, exportações e do investimento estrangeiro. No
entanto, estas reformas também causaram um aumento na desigualdade de renda e disparidades
entre os sexos. [II]
Os Estados operários deformados foram transformado nos Estados
capitalista do Vietnã e do Camboja, controlado por "governos
marxista-leninistas" quando decidiram promover o capitalismo como a fonte
de seus privilégios e o planejamento estatal foi dirigida a esse objetivo.
Embora o Vietnam efectivamente controlasse o Estado do Camboja através de sua
influência sobre a Frente de Salvação, eles foram incapazes de restaurar um
Estado capitalista lá até 1989, porque a guerra contínua contra os EUA / China
/ exércitos guerrilheiros tailandesas na fronteira com a Tailândia tornou até
então impossível um compromisso com o imperialismo. O fato de que o imperialismo foi capaz de forçar aos "marxista-leninistas" dirigentes no Camboja a resistir por mais tempo à restauração, mas não no Vietnã ou no Laos não altera a dinâmica da situação.
Agora resta-nos observar o proceso no Laos para completar
o quadro no sudoeste asiático. O Laos tornou-se um Estado operário deformado em
1975 com a queda da monarquia constitucional de Sisavang Vong, derrubado pelo
movimento comunista Pathet Lao com o apoio do Vietnã. De todo o planeta, o Laos
é a nação que sofreu mais fortemente bombardeios per capita de sua população:
Durante a Guerra do Vietnã, os EUA estendeu as operações
de combate ao vizinho Laos. Secretamente, os EUA bombardeou de forma generalizada
quase todos os cantos do país... O Laos perdeu mais de 30.000 vítimas durante os bombardeios, mais de 20.000 pessoas morreram após o fim dos bombardeios em 1974 devido aos restos de munições não detonadas. Muitas outras dezenas de
milhares foram desnecessariamente evacuadas. Um relatório da ONU observa que o Laos
é per capita o país mais bombardeado do planeta, tendo 0,84 toneladas de
explosivos sido lançada por pessoa, entre 1965 a 1974. [III]
O artigo da Wikipedia sobre o Laos afirma:
Defendemos que só Cuba e Coréia do Norte são agora Estados
operários deformados e que a China, Vietnã e Laos já são Estados capitalistas
governados por "partidos marxista-leninista", e que o conjunto do seu
aparato burocrático do Estado incentiva e desenvolve a propriedade capitalista
relações na economia. Na China, uma nova burguesia surgiu, principalmente dos
filhos dos melhores burocratas do Partido Comunista que são milionários e
bilionários agora. Isso não tem progredido nessa medida no Vietnã e Laos, mas
ele está se movendo nessa direção muito claramente.
A nova Constituição do Laos, de 1991 contém uma cristalina
indicação de que o Estado tornou-se burgués, indentificando quais as relações
de propriedade o Estado protege e defende [ Para o Comitê de Ligação pela IV
Internacional, composto pela LC, TMB e SF, a natureza de classe de um Estado é determinada pelas relações de propriedade que ele defende
e / ou se esforça para desenvolver ]:
Poster de propaganda comunista do Laos |
Houve oposição ao dominio do país pelo partido único para
chancelar um parlamento burgués no Laos. No entanto, o principal representante político
desse movimento foi derrotado.
"Em 1990, o vice-ministro da Ciência e Tecnologia
Thongsouk Saysangkhi demitiu-se do governo e do partido, reivindicando uma
reforma política. Ele morreu na prisão em 1998" (Wikipedia). Agora o
artigo da Wikipedia nos informa sobre as consequências da restauraçao: o Laos é
um membro da OMC, desapareceu o monopólio do comércio exterior e foi criada uma
bolsa de valores no país:
O Laos é um membro do Acordo de Asia-Pacific Trade
(APTA), da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), East Asia Summit
e La Francophonie. O Laos solicitou a adesão à Organização Mundial do Comércio
(OMC) em 1997, e em 2 de fevereiro de 2013, foi concedida sua adesão plena...
Em 2009, apesar do fato de que o governo ainda ser oficialmente comunista, a
administração Obama, nos EUA, declararam que consideram que o Laos deixou de
ser um Estado marxista-leninista e suspendeu a proibição de empresas do Laos
que recebem financiamento de os EUA através do Export-Import Bank. Em 2011, o
Lao Securities Exchange começou a funcionar. Em 2012, o governo iniciou a
criação do Portal Trade Laos, um site que reune todos as informação comerciais
necessárias a importação e exportação de mercadorias para o país. [VI]
O Laos já não é um Estado operário deformado, no entanto,
é, com o Vietnã, (e Camboja), uma nação oprimida semi-colonial que deve ser defendida
incondicionalmente contra o imperialismo, mas isso não significa defendê-lo de
forma acrítica ou apoiar a política de seus governos. Temos a obrigação de
defender a Rússia e China contra as tentativas do imperialismo para
desmembrar-los através do apoio a movimentos pró-imperialista na Georgia, Tibet,
etc.
Comício do Partido dos Trabalhadores da Etiópia em 1985 |
Notas
I. Peng Shuzi, Ver Peng Shuzi, críticas sobre o parecer da SWP dos EUA em Cuba, http://www.marxists.org/archive/peng/1982/oncubavswp.htm.A. Nota da LC – Com esta posição superamos a inconsistencia programática da caracterização que herdamos acerca do Camboja, quando acreditábamos que o país havia sido um Estado operário deformado entre 1975 e 1979 e que teria sido destruido pela invasão vietnamita. Na verdade, existiam mais elementos para una nueva construção social entre as Cidades-Estado sumerias que existiram há 6.000 anos atrás, que já possuiam escritura, livros, comércio, etc. que no Camboja sob o regime de Pol Pot, que foi uma expressão extremada do stalinismo criada contraditoriamente a partir das extremas atrocidades cometidas pelo imperialismo na Indochina.
II. Vietnã, Wikipedia. http://en.wikipedia.org/wiki/Vietnam
III. Ataques dos EUA no Laos 1965-1973, http://peterslarson.com/2010/12/15/us-bombings-in-laos-1965-1973/
IV. Wikipedia Laos, http://en.wikipedia.org/wiki/Laos
V. Ibid.
VI. Ibid.
B. Nota da LC e da TMB – Deixaremos para uma análise posterior os casos de Angola, Moçambique, Yemen do Sul, etc. E de como estes países se converteram (ou não) em Estados operários.
C. Ted Grant (1913-2006) foi um dirigente trotskista británico que tem duas tendencias internacionais centristas como seus herdeiros políticos: O CIT, dirigido por Peter Taaffe, é o Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT ou CWI em inglês) tem como seção no Brasil a LSR do PSOL. O CMI (ou IMT, em inglês), dirigido por Allan Woods, é a Corrente Marxista Internacional que tem como seção brasileira a corrente Esquerda Marxista do PT (EMPT). Trata-se de duas tendências internacionais com maior número de seções.
Grant, Taaffe, Woods faziam parte do Militant britânico até a explosão do mesmo em 1991. A raiz da explosão foi a caracterização dos partidos trabalhistas e social democratas. Enquanto a minoria, dirigida por Grant e Woods, seguia caracterizando-os como partidos operários burgueses, o que justificaria seguir com a política de entrismo dentro deles, a maioria, dirigida por Taaffe, afirmava que tais partidos não tinham mais nenhum caráter operário e que, portanto, já eram partidos burgueses sob os quais não era legítima a tática do entrismo. As diferenças se expressaram em vários terrenos, por exemplo, em relação a um imposto criado pelo Partido Conservador, o poll-tax, um imposto per capita contra o qual o Partido Trabalhista não queria lutar. A maioria do Militant, sob a pressão de enormes manifestações de massas, queria derrotar o imposto, enquanto a minoria considerava que não era politicamente conveniente lutar contra o imposto para não ter que enfrentar-se com o Partido Trabalhista. Foi então que o setor majoritário, dirigido por Taaffe, expulsa o setor minoritário de Grant e Woods.
Grant revisou os fundamentos do trotskismo já em 1940, baseado em uma profunda incompreensão do caráter do Estado, um dos elementos centrais do próprio marxismo, revisão que está na base de todo o reformismo da petista EMPT e do psolista LSR. As duas alas herdeiras de seu legado caracterizam aos policiais, carcereiros e agentes de segurança como “trabalhadores de uniforme”, que devem compartilhar dos mesmos sindicatos com os demais servidores públicos, utilizando a velha justificativa oportunista de que assim estaríamos dividindo o aparato repressivo. Assim como assumem posições pró-imperialistas com relação às questões irlandesa, palestina, Malvinas, primavera árabe,...