Rússia e China
NÃO são Estados imperialistas
Declaração do Comitê de Ligação pela Quarta Internacional - CLQI
Junho de 2014
Declaração do Comitê de Ligação pela Quarta Internacional - CLQI
É necessário polemizar contra a
justificativa ideológica adotada tanto pela posição pró-imperialista quanto pelo "terceiro-campismo" de “nem Moscou nem EUA/UE/OTAN, mas com a classe trabalhadora internacional!”;
que qualifica a Rússia e a China como países imperialistas (“Imperialismo
Oriental”). Portanto, para os que pensam assim qualquer conflito entre China e Rússia, ou de ambos, contra o
imperialismo global dominado pelos EUA (“Imperialismo Ocidental”) não passaria de
um conflito entre potências imperialistas rivais e, portanto, os socialistas
revolucionários não deveriam apoiar nenhum dos dois lados nessa guerra. Deveríamos, seguindo essa concepção errônea, defender o derrotismo revolucionário tanto para nós como para a classe operária
russa/chinesa, ou seja, eles deveríam defender a derrota de sua própria burguesia,
a fim de combater o chauvinismo imperialista que varre as massas em tempos de
guerra através de seus principais instrumentos dos tempos modernos, os partidos
trabalhistas, social democratas e a burocracia sindical.
Acreditamos que isso está
fundamentalmente errado, ou seja, acreditamos que nem a Rússia nem a China são potências
imperialistas no sentido marxista e que, portanto, diante de qualquer conflito
entre o imperialismo e estes Estados é necessário formar uma Frente Única
Anti-imperialista separadamente ou em conjunto com eles caso sejam
simultaneamente atacados.
O equilíbrio de forças a nível
internacional não é equivalente aos períodos anteriores à Primeira ou Segunda
Guerra Mundial, quando blocos de poder do imperialismo aproximadamente iguais
enfrentaram-se uns aos outros; agora o poder econômico e militar está
esmagadoramente com o imperialismo dos EUA e seus aliados da OTAN.
Hoje dizemos que neste conflito
na Ucrânia o derrotismo revolucionário é semelhante ao chauvinismo nacional nos
países imperialistas ocidentais porque nem a Rússia nem a China são países
imperialistas, como temos demonstrado politicamente. Alertamos aos camaradas
mais novos contra as falácias sobre o termo “imperialismo” de grupos como o AWL
que imita a mídia burguesa. Em termos marxistas, “imperialismo” tem um
significado preciso que é o domínio do capital financeiro. Tomamos esta citação
de Trotsky em 1939, quando os antigos impérios semifeudais da pré-Primeira
Guerra Mundial encontravam-se na lata de lixo da história:
“A história conheceu o “imperialismo”
do Estado romano, baseado no trabalho escravo, o imperialismo da propriedade
feudal da terra, o imperialismo do capital industrial e comercial, o
imperialismo da monarquia czarista etc. Sem dúvidas, a força propulsora da
burocracia de Moscou é a tendência em expandir seu poder, seu prestígio, seus
investimentos. No sentido amplo da palavra, este é o elemento de
“imperialismo”, que no passado era próprio de todas as monarquias, castas
dirigentes, Estados e classes medievais. No entanto, na literatura
contemporânea, pelo menos na literatura marxista, se entende por imperialismo a
política expansionista do capital financeiro, que possui um conteúdo econômico
perfeitamente definido. Utilizar a palavra “imperialismo” para a política
externa do Kremlin – sem esclarecer perfeitamente o que significa – equivale,
simplesmente, a identificar a política da burocracia bonapartista com a
política do capitalismo monopolista, baseados no fato de que tanto uma como a
outra utilizam sua força militar para a expansão. Semelhante identificação,
capaz unicamente de semear a confusão, é muito mais própria de democratas
pequeno-burgueses do que de marxistas.” [ 1 ]
“MENTIRAS, MENTIRAS DESCARADAS E ESTATÍSTICAS” DE MICHAEL
PRÖBSTING
“Há 3 tipos
de mentiras:
Mentiras, mentiras descaradas e estatísticas”
Mark Twain
|
Mas como demonstrá-lo de modo
econômico? Michael Pröbsting da RCIT austríaca produziu um enorme panfleto para
provar, em nome de toda a trupe terceiro-campista, o quão errado a LCFI está e
como eles são pró-imperialistas. Em seu trabalho, ele chama a Rússia de “grande
potência imperialista”, com um desenho do Tio Sam na capa enfrentando um
furioso urso russo que está prestes a arrancar sua cabeça. Gostaríamos de
lembrar que isso é um uso ilegítimo de propaganda imperialista em uma revista
que se autoproclama marxista.
O trabalho de Pröbsting é repleto
de extensos gráficos e tabelas para provar estatisticamente o seu ponto de
vista de que a Rússia e a China são as novas potências imperialistas emergentes
prestes a dominar o planeta e que os EUA é o poder em declínio, prestes a ser
eclipsado pelas ameaças do urso e dos amarelos, que são os inimigos que
representariam de fato o perigo real. A grande parte do trabalho prova apenas
que são sociedades desiguais, como eram os antigos estados operários deformados
e degenerados, mas não tão desiguais como estão os seus sucessores estados
capitalistas hoje. Entretanto, mesmo as estatísticas e gráficos mais relevantes
são unilaterais e bastante enganosas (“Há 3 tipos de mentiras: Mentiras,
mentiras descaradas e estatísticas”, como diria o escritor e humorista
estadunidense Mark Twain), assim como as reais relações econômicas entre a
Rússia e a China e o imperialismo global, que representa os perigos militares.
MONOPÓLIOS RUSSOS
Pröbsting diz:
Em suma, em menos de duas décadas,
formaram-se uma série de monopólios russos que estão exercendo um controle
total da economia do país. O capitalismo na Rússia é provavelmente mais
monopolizado do que na maioria das outras economias imperialistas. Como veremos
detalhadamente a seguir, esses monopólios estão envolvidos em todas as formas
de negócios – começando com a extração de gás e petróleo, mineração e
fabricação de metais, e até o financiamento. A definição de Lênin de uma
potência imperialista é, obviamente, aplicável ao tratar-se do capital
monopolista da Rússia. [ 2 ]
Mas devemos perguntar a quem
pertence esses “monopólios da Rússia”? Na gigante de energia Gazprom, por
exemplo, apenas 50% é propriedade do Estado, o restante das ações está
majoritariamente nas mãos do capital estrangeiro. E o resto dos principais
“monopólios” da Rússia e China que estão listados como “propriedade estatais”
são consideravelmente menores que 50%, representando 25% e, em alguns casos,
ainda menor que 13%. É claro que os imperialistas ocidentais queixam-se
amargurados que isto é um abuso [assim como queixam-se do regime de partilha
usado pelo governo Dilma no Brasil na privatização do campo de petróleo de
Libra]. Reclamam que deve ser permitido o livre acesso a compra de 100% das
ações e não apenas para as ações “B” que são de capital aberto. E Pröbsting
poderia referir-se aos investimentos estrangeiros diretos (IEDs) internos e
externos da Rússia ou ao “round-tripping” (engenharia financeira de venda e
recompra de títulos) de fundos oligárquicos através do Chipre etc. para que
assim eles possam reinvestí-los na Rússia livre de impostos, mas ele sempre
evita todo o panorama global em sua ânsia de fazer valer a sua caracterização
de imperialismo.
Por exemplo, a China e o Japão
são de longe os dois maiores detentores de ações e títulos do governo
estadunidense, os quais são obrigados a comprar para desovar seus excedentes de
dólares e manter em aberto o mercado consumidor dos EUA, de longe o maior do
mundo. Mas essas ações e títulos pagam apenas entre 1% a 2% de juros ao passo
que os IEDs dos EUA na Rússia e na China rendem mais de 20% de juros. E o dólar
como moeda de negociação não só do petróleo, mas também da maioria das outras
commodities do planeta dá aos EUA uma enorme vantagem; alguns diriam que isso é
a coisa mais importante que detém o mercado mundial. [Tendo o dólar como
garantia, em finanças: lastro, o domínio militar imperialista sobre o globo] a
contínua ameaça a esse monopólio global pode ser razoavelmente compreendida
como a principal causa para a guerra contra o Iraque em 2003, contra a Líbia em
2011 e contra a Ucrânia em 2014. Se os EUA perderem essa imensa vantagem, seus
dias de império estarão realmente contados.
Combinado a isso estão os
sucessivos ataques de Quantitave Easing, ou seja, de desvalorização do dólar
que reduz o valor das reservas em dólar da China e Rússia, em particular, mas
também do Japão, dos Estados do Golfo, do Brasil etc. E há a questão da
exploração de ouro. Há rumores de que os EUA saquearam as reservas de ouro da
Líbia no final da guerra em 2011, não devolveu para a Alemanha a suas barras de
ouro como Merkel solicitou no final de 2012 e ainda por cima acabaram saqueando
toda a reserva de ouro da Ucrânia em 7 de março de 2014, cerca de 1,8 bilhão de
dólares. Por esses mecanismos o mundo inteiro é forçado a subsidiar a economia
dos EUA.
O COMPLEXO MILITAR INDUSTRIAL
(MIC)
Uma grande parte desse subsídio, drenado para enriquecer os EUA, é patrocinado pelos parceiros comerciais estrangeiros e passa pelo exército
estadunidense, que por sua vez é usado para ameaçar e/ou invadir qualquer país
que ameace seriamente esse monopólio. Os elevados gastos militares dos EUA são
mantidos pelo poderoso complexo industrial militar (MIC), no qual o presidente
Dwight D. Eisenhower alertou em 1961:
Essa conjunção de um imenso
establishment militar e uma grande indústria de armas é nova na experiência
norte-americana. A influência total – econômica, política e até espiritual – é
sentida em todas as cidades, em todos os prédios dos governos estaduais e em
todos os gabinetes do governo federal. Nós reconhecemos a imperiosa necessidade
desse desenvolvimento, embora não deixemos de perceber suas graves implicações.
Nosso trabalho, recursos e meios de subsistência estão todos envolvidos; assim
é a própria estrutura da nossa sociedade. Nos conselhos de governo, temos de
nos precaver contra a influência que o complexo industrial-militar venha a ter,
sem qualquer justificativa, deliberadamente buscada ou não. Isto conduzirá a
ascensão desastrosa de um poder desproporcional. [ 3 ]
O MIC é agora muito mais poderoso
do que era em 1961 e cada senador dos EUA e quase todos os representantes são
pagos pelo lobby do MIC, que necessita de guerras constantes para manter os
lucros e os altos dividendos a acionistas e seus funcionários, como foi citado
acima por Eric Zuesse.
Pröbsting diz:
Hoje, o setor estatal-capitalista
russo é crucial para a economia. Ele desempenha um papel decisivo entre muitos
monopólios russos. Por exemplo, o Estado manteve “Golden Shares” em 181
empresas. 15 companhias controladas pelo Estado são responsáveis por 62% do
mercado de ações da Rússia.
Mas de acordo com a “Russia
Beyond The Headlines”:
Os investidores estrangeiros
mantêm uma influência determinante sobre o mercado de ações russo. De acordo
com analistas do Sberbank KIB, cerca de 70% das ações russas em circulação
livre estão nas mãos de investidores externos. Mas os investidores russos ainda
estão cautelosos com o mercado de ações após a queda de 2008-2009.
Um terço dos investimentos ativos
na Rússia são fundos dos Estados Unidos, outro um terço da Europa continental e
um quarto vem do Reino Unido. O maior investidor estrangeiro (responsável por
mais de US$ 5 bilhões) é o Norwegian Government Pension Fund, seguido pelo
Vanguard Emerging Markets Stock Index Fund (com cerca de US$ 4,7 bilhões) e o
fundo Oppenheimer (com pouco menos de US$ 3 bilhões investidos em ações
russas).
Isso deixa bastante claro que
longe de serem potências imperialistas, a Rússia e a China nada mais são do que
países semicoloniais, embora sejam grandes e avançados. Eles não estão ligados
à rede mundial do imperialismo estadunidense da mesma forma que os
imperialismos menores como a Holanda e a Bélgica ou seus aliados mais
semelhantes, ainda que subordinados, como o Japão, Alemanha, Itália, Espanha e
Canadá. Não, eles estão em um nível superior de países semicoloniais e se
reconhecem como tal, aliando-se ao BRICS; Brasil, Rússia, Índia, China e África
do Sul. [ 4 ]
CONCLUSÃO
Esboçamos o desenvolvimento de três
correntes distintas dentro da extrema-esquerda, a direita que tomou uma posição
pró-Maidan na Ucrânia, cujos exemplos mais extremos são os signatários da
Declaração da Campanha de Solidariedade Socialista da Ucrânia de Chris Ford;
Labour Representation Committee, Socialist Workers Party, Revolutionary
Socialism 21, A World To Win e Socialist Resistance (FI) e, internacionalmente,
o CWI-CIT (Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores, cuja seção no Brasil é a corrente LSR do PSOL) e o PSTU do Brasil, principal corrente da LIT.
No campo centrista, algumas organizações giraram à esquerda em relação à Ucrânia, aproximando-se dos trotskistas revolucionários que desde o início tomaram uma firme posição
anti-imperialista sobre a Líbia e a Síria. Rechaçamos as teorias de que a luta de classes
internacional está sendo impulsionada pelos conflitos interimperialistas entre
o Imperialismo Ocidental, dos Estados Unidos, e o Imperialismo Oriental, da
Rússia e China (inclusive na Venezuela, onde o LCC – Comitê de Ligação dos
Comunistas – sugere ridiculamente que o conflito é o resultado das incursões da
China no quintal dos EUA).
Por uma campanha de
solidariedade internacional para defender o que é agora a Novorossiya (Nova
Rússia) do leste da Ucrânia e sua classe trabalhadora organizada dirigida pela
União Borotba e pelo Partido Comunista da Ucrânia. Por uma Frente Única
Antiimperialista com o “diabo e sua avó”, incluindo o próprio Putin, como
demandas da classe trabalhadora em relação à Rússia para defendê-la contra o
ataque fascista de Kiev. Por fim, esta orientação é impulsionada principalmente
a fim de construir uma nova direção da classe operária socialista
revolucionária como parte de uma Quarta Internacional reconstruída.
• Defender a União Novorossiya contra os ataques fascistas,
esmagar o ilegal regime de Kiev instalado pelos EUA/CIA!
• Formar milícias operárias armadas para defender as sedes,
edifícios e organizações da classe trabalhadora!
• Nenhuma confiança nos oligarcas corruptos, nacionalizar
suas fábricas, sistemas de transporte e terras!
• Esmagar o regime reacionário e pró-imperialista de Kiev!
• Por uma Frente Única Anti-imperialista com todas as forças
que estão lutando agora contra os fascistas!
• Exigir assistência material de Putin em armas e tropas
para derrotar a conspiração global dos EUA contra a Rússia, China, Síria, Irã e
Venezuela!
• Avançar na construção de uma direção socialista
revolucionária ucraniana, uma seção da Quarta Internacional reconstruída!
Liga Comunista—Brasil
Tendencia Militante Bolchevique—Argentina
Socialist Fight—Britain
4 de junho
de 2014
NOTAS:
[1] Leon Trotsky, In Defence of Marxism, Again and Once More Again on the Nature of the USSR, (October 1939), http://www.marxists.org/archive/trotsky/idom/dm/04-again.htm
[2] Russia as a Great Imperialist Power, The formation of Russian Monopoly Capital and its Empire – A Reply to our Critics, By Michael Pröbsting, Revolutionary Communist International Tendency (RCIT), 18 March 2014, http://www.thecommunists.net/theory/imperialist-russia/
[3] Dwight D. Eisenhower, Speech on Military Industrial Complex, 1961: http://coursesa.matrix.msu.edu/~hst306/documents/indust.html
[4] Source: Russia Beyond the Headlines – January 22, 2014 Anna Kuchma, http://rbth.com/business/2014/01/22/who_owns_the_russian_stock_market_33437.html)