O Brasil está prestes a entrar em um novo tipo de ditadura militar, cujo similar mais próximo talvez seja o processo recente do Egito 1, com eleições de fachada para um regime militar de fato, defendendo draconianamente os interesses do imperialismo, das grandes corporações multinacionais, do capital financeiro, tendo, em nosso caso, a Globo como porta voz todo poderosa para embelezar a tragédia. Muitos acreditavam que a “senha” para prender Lula seria prender antes algum político burguês figurão do lado de lá, um Alckmin, Serra, FHC, Temer. Alguém que se equiparasse ao quilate de Lula. Isso não ocorreu antes. Mas tende a ocorrer agora e não por causa da prisão de Lula, mas porque o mecanismo do golpe tem outra dinâmica, definida pelo imperialismo de estabelecer outro regime político, militarizado, sobre os escombros do atual.
O PT, que tardiamente reconheceu o golpe, não avaliou o significado da disputa que ocorreu no judiciário um dia antes de Moro decretar a prisão de Lula e menos ainda estava preparado para essa última. O Supremo Tribunal Federal se identifica com os interesses dos partidos da direita do atual regime político, PMDB, PSDB, DEM. Gilmar Mendes, por exemplo, é homem do PSDB. Todavia, estranhamente o STF possuía uma maioria de 6 X 5 a favor da concessão do pedido de Habeas Curpus de Lula. Isso expressa uma resistência de uma fração do STF ao avanço da máquina golpista, que devora seus homens, como fez com Eduardo Cunha. Ao retardar a prisão de Lula, se retardava a próxima etapa do Golpe. Tanto é verdade que, para facção de Carmen Lúcia não perder a votação e liberar a prisão de Lula foi necessária uma intervenção inédita das FFAA desde a redemocratização, ameaçando explicitamente o STF, especificamente a juíza Rosa Webber, e virar o quadro contra o Lula e a favor do recrudescimento o Golpe. O discurso incoerente da juíza antes de proferir o voto demonstra que agiu sobre forte pressão. Consumada a prisão de Lula, segue em ato contínuo a próxima etapa do golpe. Em breve, serão a bola da vez. PSDB, PMDB e DEM são os “Carlos Lacerdas” desse golpe 2.
Como viemos dizendo há cinco anos: há um golpe militar em andamento no país e a prisão de Lula encerra a fase jurídico-parlamentar do regime de exceção com roupagem pseudo-legal. Isso não quer dizer que a próxima etapa não lance mão dos instrumentos do judiciário e do legislativo que lhe forem úteis, mas que o elemento predominante será o da preparação de uma guerra civil preventiva contra o povo e onde a repressão seletiva vai estar engatilhada contra qualquer foco de resistência ao regime. As eleições já começam fraudadas com a exclusão do candidato em que a população deseja votar e serão ainda mais fraudadas (com a facilidade do mecanismo da urna eletrônica), elegendo dezenas de militares e provavelmente o presidente (ver artigo "Candidato General?").
Fica então evidente, pela luta entre as facções burguesas contra e pró avanço da lava-jato, que a operação golpista segue uma estratégia que vai além do alijamento do PT do poder político, quando o derrubou e agora impede a sua volta através da anulação da candidatura Lula. O Imperialismo precisa que seus lacaios golpistas cumpram uma completa destruição do regime político democrático-burguês instituído pela Nova República que se fundamentou após as greves que acuaram a Ditadura Militar e firmaram a Constituição de 1988.
A militarização do regime ainda não é uma posição homogênea nas FFAA. O comando da aeronáutica, através do brigadeiro do ar Nivaldo Luiz Rossato, tirou uma nota em resposta ao comando do Exército, defendendo que os militares não devem impor sua vontade ao país e que oficiais da reserva e da ativa das FFAA não devem se empolgar em prejuízo das instituições. O documento reivindica respeito a constituição e momentaneamente o alto comando da aeronáutica toma distância do alto comando do Exército (link).
Porém, a ordem do Imperialismo aos golpistas é clara: destruir o antigo regime, seus velhos partidos, os velhos políticos, além esmagar o movimento operário e popular, para então consolidar um novo regime ditatorial com aparências de legalidade, uma nova ordem institucional baseada nova ditadura civil-militar disfarçada de democracia-burguesa.
A partir de agora nossa reação não poderá ser outra: Frente Única de ação entre os sindicatos, movimentos e partidos de esquerda para impedir que essa ditadura se consolide. Unidade da esquerda revolucionária, socialista, reformista e progressista para derrotar o Golpe e libertar Lula e defender qualquer outra liderança que venha ser perseguida e encarcerada.
A prisão política de Lula
A prisão de Lula foi uma derrota, que poderia ter sido evitada pela direção da CUT e do PT e pelo próprio Lula. Foi uma derrota parcial na guerra contra a instauração de uma ditadura no Brasil. Nos próximos dias veremos o quanto essa derrota animará a reação e ao fascismo e o quanto desmobilizará os lutadores sociais que se opunham a prisão de Lula e consequentemente contra o fascismo. A disposição de luta da massa foi demonstrada nas centenas de manifestações que ocorreram em todo país, mas sobretudo, pela presença de milhares de pessoas acampadas desde o momento do despacho de Moro (5/4) até a rendição de Lula no sábado pela manhã (7/4) em torno da sede do sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo, muitos dos quais operários metalúrgicos, trabalhadores da região e sem tetos.
Essa derrota consuma a falência da estratégia do PT de ininterruptamente alimentar ilusão na possibilidade de resoluções parlamentares ou jurídicas favoráveis. Em nenhum momento, Lula e a direção do PT fez uma campanha de massas para evitar a prisão pela via da ação direta. Desde o despacho de Moro cujo teor buscava evitar a criação de qualquer fato político maior com a massa, ficou claro que dificilmente a PF invadiria o Sindicato, o QG da da resistência, se Lula não se entregasse. Nesse aspecto, a política consequente deveria ser ampliar a condição de fato político da prisão, resistir para imputar ao regime a violência da prisão. Nenhuma organização política, do PT, MTST adotou qualquer linha nesse sentido. O chamado a “não deixar prender” dos cartazes do PCO, ficaram no cartaz, e a decisão da capitulação ficou inteiramente na mão do próprio Lula, contrariando também a afirmativa do próprio PCO de que deveria ser evitada a prisão de Lula mesmo se ele desejasse se entregar. Enquanto os partidos das Frentes Brasil Popular e Povo sem Medo foram centralizados por Lula, centenas de pessoas fizeram uma barreira em frente a garagem do sindicato e evitaram a saída da comitiva de Lula. O ex-presidente chegou a descer do carro e voltar para dentro do prédio. Depois de minutos de insistência comemorados pela multidão e pelo país afora, Gilberto Carvalho e Gleisi Hoffman apelaram para o fato de que era Lula que iria sofrer caso ele não se entregasse, pois, a partir de então iria sofrer uma ordem de prisão preventiva.
A direção do PT estava em seu limite, já tinha ido além de onde queria em seu caminho na ruptura com a pseudo- legalidade golpista. Os trabalhadores que construíram aquele cinturão humano em volta do Sindicato, estavam dispostos “assumir o inimigo” e a fazer a guerra, pressionavam o PT para ir além de sua própria estratégia tradicional de métodos conciliatórios com os algozes.
O PT é um partido de funcionários de algum aparato institucional seja sindical, partidária ou do próprio Estado capitalista. Durante os sucessivos governos, converteu-se em um partido burguês, de esquerda, com influência de massas. Mas, os ataques que vem sofrendo desde 2013 vem obrigando o PT a ir à esquerda e a mobilizar as massas.
No Sindicato dos Metalúrgicos, cercado por operários e sem teto, ficou evidente que houve sim uma disposição das massas operárias e populares para reagir, que apesar da letargia recente e das orientações equivocadas das direções do PT ou da CUT, da auto sabotagem da resistência à prisão, mostraram que havia uma tendência reação à direita por via até mesmo de uma luta física se fosse necessário. A direção do PT se entregou quando se encontrava nas condições mais favoráveis de resistência à prisão. Saído das mãos do povo, rodeado por todos os seus apoiadores para entrar no inferno de seus algozes. Já nos comentários do voo no translado para Curitiba, se viu o que vem por aí. Os fascistas que o conduziam comentam impunemente um para o outro “manda esse lixo janela abaixo” em áudio confirmado pela FAB (o que lembra a forma como a ditadura argentina matou milhares de presos políticos, jogando-os do alto das aeronaves ao mar). Lula é posto em quase confinamento solitário, sem acesso aos outros presos, pouco sol, e quase sem permissão de visitas. Descobre-se que enquanto parlamentares da esquerda são barrados na visitação a Lula, um apoiador de Bolsonaro tinha livre trânsito junto aos guardas da sede da PF onde Lula está preso (com qual objetivo? Envenená-lo ou só armar uma situação de desmoralização para uso propagandístico midiático?), enquanto isso, no dia seguinte, 10 governadores que foram visitar Lula tiveram acesso negado.
Nas condições em que nos encontramos hoje, ali no sindicato era o melhor local para fazer a luta política, foi perdida uma grande chance e seus algozes farão de tudo para que da prisão ele não saia mais em condições de fazer política.
Que Boulos e Manuela apoiem a candidatura de Lula preso!
Cada vez mais feliz com a possível saída de Lula do páreo, Ciro Gomes, querendo se cacifar junto ao regime golpista, cretinamente declarou em um fórum chamado pelos golpistas que Lula não era um preso político.
O PSTU, por sua vez, depois que atravessou o Rubicão ao apoiar o Golpe e a prisão de Lula, arrastou a Conlutas junto declarando “A CSP-Conlutas não participará de atos contra a prisão de Lula, reafirmando sua posição de que a justiça deve ser feita para todos. Que sejam presos todos os corruptos e corruptores, que seus bens sejam expropriados e o dinheiro devolvido aos cofres públicos.”. Isso aponta para o Andes e para o Bloco de oposição que está dentro da Conlutas repensar sua estadia dentro de uma central cuja direção a converteu em quinta coluna do golpismo e na necessidade da reorganização e reunificação do movimento operário, sindical e popular de esquerda no país.
A nossa tarefa agora é reorganizar essa base nos comitês de luta contra o Golpe e contra a Prisão de Lula. Ir além disso criando uma Frente Única, entre PT, MTST, MST, PSOL, PCdoB e PCO e todos os movimentos, em combate aos golpistas com um calendário de manifestações, paralisações, greves e até mesmo ações direta se for necessário para defender uma liderança ou um ataque à um acampamento ou sindicato.
Quanto às eleições de 2018, fica evidente que sem Lula, as eleições serão uma fraude com aparência legal, e por isso qualquer candidatura de alguma partido de esquerda dentro dessas eleições só servirá para legitimar o novo regime que se inicia com a escalada do Golpe. Por isso é necessário exigir que tanto Guilherme Boulos do MTST e PSOL quanto Manoela D’avila do PCdoB retirem suas candidaturas em favor de uma candidatura única de apoio ao Lula, mesmo preso pelo novo regime de exceção.
Construir comitês populares e sindicais de base da Frente única antifascista e antigolpista apoiados na FBP e FPSM!
Notas:
1. A DITADURA MILITAR COM ELEIÇÕES NO EGITO - Após o período da chamada "Primavera Árabe" em 2011 (que no Brasil correspondeu as nossas “jornadas de junho” de 2013), onde uma série de rebeliões simultâneas operaram mudanças de regime político em vários países da região, o governo de décadas do ditador Hosni Mubarak chegou ao fim. O processo foi extremamente contraditório e em disputa, as massas se levantaram contra as consequências da crise econômica de 2008, ao imperialismo interessava fazer uma reciclagem dos governos fantoches, através da política de “regime change” e não havia uma direção que se opusesse a infiltração e desvio do movimento. Pelo contrário, essa infiltração, em muitos processos, baniu a esquerda e suas bandeiras dos mesmos em nome do apartidarismo. Estranhamente toda primavera não contagiou a Palestina, a região com maior tradição de luta anti-imperialista. mas o imperialismo tratou de sequestrar desviar e manobrar os destinos da primavera pela falta de uma direção política anti-imperialista que assumisse com respaldo a direção do movimento. Mohamed Morsi tornou-se o primeiro chefe de Estado eleito democraticamente no país. Tornou-se presidente pelo Partido da Liberdade e da Justiça, partido político fundado pela Irmandade Muçulmana, a organização social mais popular do país e inspiradora da fundação do Hammas em 1987. No entanto, em 3 de julho de 2013, manipulados pela mídia mundial e redes sociais e sob a justificativa de combater a tentativa de implementação da sharia como lei oficial do país, milhões de manifestantes saíram às ruas contra Morsi. O general Abdul Fatah Khalil Al-Sisi, deu um golpe de Estado militar, suspendeu a Constituição e assumiu, frente aos militares, o comando do país. Uma "comissão", de 50 membros, foi formada para modificar a Constituição egípcia, que foi publicada mais tarde para votação pública e foi adotada oficialmente em 18 de janeiro de 2014. Em 2013, a Freedom House classificou os direitos políticos no Egito um país "parcialmente livre". Durante os confrontos entre a polícia e partidários do ex-presidente Mohamed Morsi, pelo menos 595 manifestantes civis foram mortos no Cairo em 14 de agosto de 2013, quase todos da Irmandade Muçulmana, foi o pior assassinato em massa da história moderna egípcia. Os escritórios das Nações Unidas para os direitos humanos e várias ONGs expressaram um "alarme profundo" após um tribunal penal egípcio condenar 529 pessoas à morte em uma única audiência de 25 de março de 2014. Os condenados eram apoiadores do ex-presidente Morsi. A sentença de punição coletiva foi condenada como uma violação de direito internacional. Em maio de 2014, cerca de 16 mil pessoas (número que pode chegar a 40 mil de acordo com estimativas independentes), em sua maioria membros ou apoiadores da Irmandade Muçulmana, foram presos, sendo a organização rotulada como terrorista pelo governo egípcio interino.
2. CARLOS LACERDA: Confiando que após o a destituição de Jango, do qual foi um dos maiores entusiastas entre os golpistas civis, em breve o regime militar iria convocar eleições facilmente vendidas por ele, Lacerda se desiludiu com o Golpe quando percebeu que o plano dos militares era outro e organizou uma Frente Ampla com JK e Jango pela redemocratização do país. Lacerda foi caçado, preso e morreu do coração em 1977, coincidentemente poucos meses depois de JK (acidente de carro) e Jango (também do coração, sob suspeita de envenenamento). O fato de três líderes da Frente Ampla terem morrido em datas próximas levantou uma teoria de que essas mortes pudessem estar relacionadas.