matando a sede com água salgada
Editorial d'O Bolchevique #10
Gravura retratando a crise econômica de 2008 |
Estímulo ao
crédito, redução do IPI, redução de juros bancários, ‘PAC das compras do
governo’,... as medidas anti-crise de Dilma, de pesadas transferências de
recursos estatais ao grande capital, expropriando trabalhadores através do
arrocho salarial e do super-endividamento das famílias, ao mesmo tempo que
retardam também potencializam a crise no Brasil
Na década passada, o governo Lula tentou
blindar os capitais instalados no Brasil dos efeitos das crises econômicas
(2001 e 2008), reorientando parte das exportações de commodities do país, que
antes se dirigia a Europa e EUA, para a China, que no mesmo período suplantou
os EUA como “locomotiva” da economia internacional.
Esta reorientação nas exportações, embora
tenha retardado paliativamente a chegada da crise no Brasil, apenas acentuou o
caráter semi-colonial agro-exportador do país. A aposta na China, que
converteu-se no principal parceiro comercial do Brasil, favoreceu setores da
classe dominante ligados ao extrativismo, como a Vale do Rio Doce, os magnatas
da Soja associados a Monsanto, Eike Batista, etc., que acumularam enormes
fortunas assim como os banqueiros.
Quanto à produção de bens de consumo, que até
2008 estava voltada para a exportação e ficou prejudicada com o estouro da
crise internacional, o governo do PT apresenta como saída, o escoamento através
do estímulo ao consumo em cascata: expansão do crédito das empresas e da
população, renúncia fiscal e por fim antecipação e aumento das compras às
indústrias pelo próprio Estado.
No começo de 2012, saltando de júbilo pelo
estímulo ao consumo, o burguês que por muito tempo reinou como dono do maior
oligopólio varejista do país, Abílio Diniz, comemorou: “O Brasil não é o País
do futuro, é o de agora”, acreditando que o país estaria safando-se da crise ao
trocar o “consumo externo pelo interno”. Todavia, indicando qual a perspectiva
do crescimento econômico “brasileiro”, poucos meses depois, Diniz transfere
definitivamente o controle acionário do grupo que inclui o Pão de Açúcar, as
Casas Bahia e o Ponto Frio, para o controle da multinacional francesa Casino.
Sob os efeitos da crise e do aumento dos
custos de produção, a “fábrica planetária” chinesa começou a desacelerar. Vale
destacar que a China encareceu porque foi forçada pelo crescimento dos protestos
salariais operários, por um lado e, por outro, através do estímulo ao consumo
interno e criação de um mercado e de uma pequena burguesia que dê escopo a sua
recriada sociedade burguesa.
Diante do declínio da demanda por commodities
como o ferro e o petróleo brasileiros por parte da China, o governo Dilma dobra
a aposta no consumo interno, aumenta o preço dos combustíveis, facilita o
crédito e, através do “pleno emprego”, estimula o aumento da massa salarial do
conjunto da população sem aumentar os salários, precarizando o trabalho e
criando a escravidão por dívida da população trabalhadora. Disto trataremos
mais adiante.
UM CANTEIRO DE OBRAS INÚTEIS
SOB UM “REGIME ESPECIAL DE CONTRATAÇÃO”
Assim como ocorrera nos EUA, também no Brasil
uma parte do crédito expandido inflou a bolha imobiliária, alavancando a
expansão da construção civil. É necessário destacar também que país virou “um
canteiro de obras” para conter a queda da taxa de lucro, investindo em uma
valorização de capitais que não competem no mercado mundial no sentido de que
não se exportam e, por outro lado, que não têm que competir com as mercadorias
importadas, impulsionando os chamados, setores ‘não trançáveis’.
Inclusive o crescimento da construção civil,
um ramo produtivo, não esteve dirigido à realização de obras infra-estruturais,
de transportes ou energia, mas voltado primeiramente ao desvio de recursos
estatais para acumulação privada através do superfaturamento das obras – não
por acaso a Delta é a principal empreiteira do PAC, do qual Dilma é “mãe”, e o
pivô do maior escândalo de corrupção em evidência no momento – em nome da
construção de obras inúteis para o desenvolvimento estrutural do país, como
estádios de futebol e construções de luxo. Daí porque também o governo Dilma
tenha realizado uma escandalosa legalização dos esquemas de corrupção através
da criação de “regimes especiais de contratação”.
Quando acabar a festa, provavelmente com o
fim dos Mega-eventos, os trabalhadores da “6ª economia mundial” vão sentir a
ressaca com força, descobrindo que o país perdeu competitividade no mercado
mundial e ganhou uma crise com efeitos como os que hoje são sentidos por nossos
irmãos gregos e espanhóis.
Ao mesmo tempo em que a China desacelera, a
Petrobrás revelou dados menos superestimados do Pré-Sal, deixando claro que o
grande negócio que tornaria o país não só auto-suficiente, mas também “potência
petrolífera mundial”, não passa de propaganda enganosa da era frente populista.
Em conjunto com esta revelação, se evaporaram em 2 dias 14 bilhões de reais do
valor de mercado em ações das empresas do mega-especulador tupiniquim Eike
Batista, cujas empresas super-alavancadas por negócios como o do Pré-Sal já
haviam “perdido” R$23 bilhões de valor de mercado em 2011.
Apesar do Pré-Sal responder por nada mais do
que 5% dos 2,02 milhões de barris diários produzidos no País, quase metade
(49%), ou US$ 43,7 bilhões, dos investimentos totais na área de produção da
Petrobras (http://www.petrobras.com.br/pt/) “vai para a camada do pré-sal”,
segundo o Plano de Negócios da empresa até 2016, anunciado no dia 25/06. O
Petróleo brasileiro é caro e pobre e o país não possui refinarias. Mas o PAC
atenuará este problema? Veremos: Por exemplo, as obras da Refinaria Abreu e
Lima, no Estado de Pernambuco, estão com atraso de três anos. Foram orçadas em
US$ 2,3 bilhões em 2005 e não sairão por menos de US$ 20,1 bilhões, quase dez
vezes mais. As revelações foram feitas pela nova direção da Petrobrás para se
cacifar diante da direção anterior indicada por Lula, como parte da luta
intestina no interior da burocracia estatal frente populista. Sob o domínio do
capital mais uma vez os grandes capitalistas donos dos grandes conglomerados de
empreiteiras e o capital financeiro drenarão muito capital para seus bolsos e
as refinarias continuarão a não existir assim como apesar do potencial
energético o país continuará dependente também na área petrolífera.
ATÉ O AUMENTO DA PRODUTIVIDADE DO TRABALHO,
ESTAGNADA HÁ 30 ANOS, DEPENDE DA REVOLUÇÃO
SOCIAL
Além de perder competitividade e manter seus
“gargalos estruturais”, há 30 anos a produtividade anual da força de trabalho
do Brasil possui uma evolução desprezível em relação ao crescimento mundial no
mesmo período, ou seja, está estagnada. “Levantamento feito com 17 países da
América Latina mostra que a produtividade do trabalhador brasileiro — medida
pelo quociente entre PIB e pessoal ocupado — está entre as mais baixas: na 15ª
colocação, segundo dados da instituição de pesquisa americana The Conference Board.
No ranking mundial o Brasil aparece na 75ª posição. Com uma produtividade de
US$ 19.764 por trabalhador no ano passado, o Brasil vai ficando para trás: de
um ano para o outro, é estimado um avanço de 1,4% — abaixo da média da América
Latina (2,1%) e aquém da mundial (2,5%). Nos países ricos, a produtividade
alcança US$ 105 mil nos EUA e US$ 78 mil na Alemanha. ‘Esse indicador é a
síntese da baixa qualificação do trabalhador brasileiro, dos gargalos
estruturais e do baixo investimento. Também está refletido nesses números o
modelo econômico do país, calcado na produção de commodities. Não investimos em
produtos de maior valor agregado. Nessas condições, não há como crescer 4%,
4,5% de forma sustentada’, analisou Marco Tulio Zanini, professor da Fundação
Getulio Vargas (FGV).” (Globo Economia, 18/03/2012).
Um país que assegura o desenvolvimento da
produtividade do trabalho domina aqueles que possuem uma baixa produtividade. A
revolução burguesa resolveu para um conjunto de países capitalistas a questão da
criação de condições para uma maior produtividade do trabalho. A era frente
populista acentua esta atrofia colonial, exaure como nunca antes as riquezas
energéticas e a força de trabalho do proletariado a serviço dos capitalistas
aqui instalados. Por esta incapacidade histórica de todas as variantes de
governos burgueses em realizar as tarefas da revolução burguesa pendentes, é
evidente que somente uma revolução proletária pode também na questão da
produtividade do trabalho libertar o Brasil do parasitismo imperialista pago a
um altíssimo custo pelo proletariado.
O endividamento das famílias é o maior em
sete anos. Segundo último levantamento do Banco Central, dívidas consomem quase
43% da renda anual da chamada classe média e dos trabalhadores em geral.
A expansão do crédito e do consumo interno é
um recurso “anticíclico” (contra os efeitos da sobreacumulação de capitais e da
queda tendencial da taxa de lucro) aplicado retardatariamente por grande parte
dos chamados países periféricos depois de ter sido esgotado nos EUA e EU.
Note-se que os países periféricos seguem tardiamente a crise dos centrais
detonadas precisamente pela expansão de crédito (bolha imobiliária em 2008 nos
EUA e agora das dívidas na UE). Nações “emergentes” que através do desenvolvimento
desigual e combinado haviam sido menos afetadas pela crise passada e até obtido
alguma vantagem comparativa com a crise nas metrópoles, agora tendem a imergir
em uma nova crise.
No último relatório do BIS (Banco de
Compensações Internacionais) a instituição alerta para o risco de que Brasil,
China, Turquia e Indonésia possam ser as bolas da vez porque o crédito tem
crescido muito mais do que o PIB destes países. “A diferença entre o
crescimento dos empréstimos e o da produção, o ‘gap do crédito’, chegou a 13,5
pontos percentuais nos últimos três anos no Brasil.” (Estado de São Paulo,
26/06/2012). Durante o governo Dilma, o endividamento da população trabalhadora
com o sistema bancário passou de 6% do PIB para mais de 16%. Isto reflete a
perspectiva de esgotamento da política de estímulo ao consumo e expansão do
crédito pelo governo Dilma.
MARX E O SISTEMA DO CRÉDITO:
ALAVANCANDO A SUPER-ESPECULAÇÃO AOS SEUS
LIMITES EXTREMOS
O BIS, conhecido como “banco central dos
bancos centrais”, obviamente não está preocupado com o endividamento das
famílias trabalhadoras, mas tão somente com a bolha que tende a estourar a
partir de sua inadimplência. O BIS e os analistas burgueses também não se
dispõem a explicar porque a expansão do crédito, uma varinha mágica capaz de
dinamizar o consumo, provoca crise, além do que todos os comentaristas tratam
de fazer, que é incutir culpa na “irresponsabilidade” do trabalhador ou
trabalhadora que sem salário suficiente capaz de custear sua vida, tomou
emprestado e não foi capaz de controlar suas economias, algo quase impossível
diante da agiotagem do capital financeiro. Todavia, este fenômeno é conhecido
dos marxistas há mais de um século. Como nos ensinara Marx em sua principal
obra:
“Se o sistema de crédito aparece como
alavanca principal da superprodução e da super-especulação no comércio é só
porque o processo de reprodução, que é elástico por sua natureza, é forçado
aqui até seus limites extremos, e é forçado precisamente porque grande parte do
capital social é aplicado por não proprietários do mesmo, que procedem, por
isso, de maneira bem diversa do proprietário, que avalia receosamente os
limites de seu capital privado, à medida em que ele mesmo funciona. Com isto
ressalta apenas a valorização do capital, fundada no caráter antitético da
produção capitalista, permite o desenvolvimento real, livre, somente até certo
ponto, portanto constitui na realidade um entrave e limite imanentes a produção
que são rompidos pelo sistema de crédito de maneira incessante... Ao mesmo
tempo, o crédito acelera as erupções violentas desta contradição, as crises e,
com isso, os elementos da dissolução do antigo modo de produção” (O papel do
crédito na produção capitalista, O Capital, Volume III, Tomo I).
Obviamente Marx tinha em mente a Inglaterra do
final do século XIX que no momento era o centro do capitalismo mundial. Então
como esta formulação pode se aplicar ao Brasil de hoje, uma semi-colônia
periférica responsável por menos de 2% da produção de riquezas do planeta?
Primeiro precisamos entender que Marx aponta neste mesmo capitulo dO Capital
que o sistema de crédito é necessário para equalizar a taxa de lucro sobre a
qual se assenta toda a produção capitalista.
A ‘FINANCEIRIZAÇÃO’ NÃO É A CAUSA,
MAS UM DOS EFEITOS DA CRISE
Mas que os leitores não deduzam daí que a
crise tem como causa motriz a expansão do crédito, recaindo na tendência do
senso comum completamente estranha à economia política marxista a explicar a
crise mundial pela “financeirização” do capital, pelo “desprendimento do
capital financeiro especulativo da produção real”, pela “hegemonia do capital
financeiro”, por ataques especulativos e outras bobagens bem em moda dentre
muitos que se proclamam marxistas. A “financeirização”, o que Marx já chamava
de “super-especulação”, é uma conseqüência da expansão do crédito, um recurso
“anti-cíclico” artificial para conter a queda tendencial da taxa de lucro a
partir de uma contra-tendência.
As crises capitalistas não têm suas causas em
fatores externos ao processo de valorização e acumulação de capital. O capital
financeiro é a fusão do capital bancário com o industrial e não existe isto de
“capital bom”, o produtivo-industrial e o “capital mau”, o
especulativo-bancário. O teórico e militante trotskista Abraham Leon destacava
que a tese maniqueísta que acabamos de refutar já servira também de argumento à
reação fascista para justificar o confisco do “capital usurário judeu”.
Se a causa da crise fosse a especulação
financeira, como cacarejam muitos pseudo-marxistas, a saída para a mesma
estaria dentro da própria economia capitalista, seria a reorientação econômica
para investimentos na “economia real”, industrial produtiva, como advogam o
reformismo oportunista. A LC rompeu com estas concepções bastante comuns no
pseudo-trotskismo, dedicando-se a aprender a economia política marxista,
ferramenta essencial do materialismo histórico e dialético e, portanto do
programa do partido revolucionário do proletariado.
A EXPANSÃO DO CRÉDITO É ÁGUA SALGADA,
QUE AGRAVA A SEDE AO CONTRÁRIO DE SANÁ-LA,
MAS NÃO É ELA A CAUSA DA SEDE
A chave da depressão que atingirá o Brasil
deriva dos ciclos de recessão e crescimento da produção de capitais da
indústria de manufaturados dos EUA, que corresponde a 1/3 da indústria mundial
e que determina o padrão de rentabilidade, de preços e de concorrência
mundiais. A vantagem relativa da qual os capitais instalados no Brasil se
beneficiaram vem se esgotando após sofrer o impacto da retomada da produção
industrial nos EUA nos últimos três anos. A inundação do mercado mundial com
novas remessas de dólares combina-se com a pauperização da força de trabalho
estadunidense, a expansão do exército de desempregados e a desvalorização
brutal da massa salarial para pressionar para baixo o preço das mercadorias,
exigindo medidas de ampliação da demanda por parte dos países capitalistas
periféricos, medidas que resultam em efeitos distintos quando aplicadas a
economias tão distintas como a Rússia, a China, países dependentes ou o Brasil
semi-colonial.*
A própria retração econômica não passa de um
efeito e não causa da crise que decorre justamente do fenômeno inverso, a
sobre-acumulação de capitais e a influência das altas e quedas da taxa de lucro
sobre as economias. É então que para tentar evitar a depressão os capitalistas
recorrem, dentre outros truques paliativos, à expansão do crédito buscando
ampliar as bases da demanda e dinamizando a velocidade da circulação monetária.
Portanto, ao alavancar a superprodução e a super-especulação, como aponta Marx,
a expansão do crédito, de uma só vez retarda a erupção ao passo que acentua as
dimensões do caráter antitético da produção capitalista e, portanto, potencia a
crise que foi retardada.
Na origem do retardo da recessão nacional
está o impacto combinado e desigual da crise no Brasil. A crise detonada pela
expansão do crédito nos EUA em 2008 e agora na Europa produziu recessão e
demissões em massa. O relativo deslocamento de investimentos dos países
centrais para o Brasil abriu 2,5 milhões de vagas de trabalho em 2010, ano
apontado como ápice da escalada do emprego no país, quando atingiu-se o auge do
que o governo falsamente denomina de “pleno emprego”.
Todo este capital monetário excedente
combina-se com os mega-eventos fomentando uma grande especulação imobiliária, a
valorização da renda da terra e agudizando o “problema da habitação” através do
encarecimento do crédito hipotecário pela elevação do preço dos imóveis,
enquanto aparentemente tenta seduzir a população trabalhadora com a redução das
taxas de juros. Quem não pode participar deste cassino é desalojado, como é o
caso das populações pobres que moram precariamente e dos que não conseguiram
pagar o preço da casa própria. Não por acaso, a PLR, um engodo capitalista, que
compromete o operário com o lucro que os patrões obtêm à custa de sua
super-exploração, converteu-se em uma das principais demandas das campanhas
salariais, principalmente entre o proletariado fabril, simplesmente porque esta
quantia que corresponde a 2 ou 3 meses de salários alivia o sufoco das famílias
soterradas em dívidas.
AS MEDIDAS ANTI-CRISE DE DILMA ARMAM
UMA BOMBA DE TEMPO CONTRA O PROLETARIADO
Como anunciou Marx no Manifesto do Partido
Comunista: “De que maneira consegue a burguesia vencer essas crises? De um
lado, pela destruição violenta de grande quantidade de forças produtivas; de
outro lado, pela conquista de novos mercados e pela exploração mais intensa dos
antigos. A que leva isso? Ao preparo de crises mais extensas e mais
destruidoras e à diminuição dos meios de evitá-las.” Os efeitos colaterais do
remédio que vem retardando o ingresso do Brasil na crise a potenciam, fazendo
com que ela possa chegar com mais força no Brasil quando acabar a festa. Isto
demonstra o quanto são frágeis as bases materiais sobre as quais se assentam os
setores da chamada classe média que tomaram crédito e no afã de ter um negócio
próprio montaram empreendimentos de pequena e média escala que em sua imensa
maioria acabam em falências miseráveis quando o ciclo de acumulação capitalista
no país se conclua e com ele a era petista.
No dia seguinte à divulgação no Brasil do
relatório do BIS, em uma tentativa de ofuscar a má notícia que se soma à
estagnação industrial e às perspectivas de um crescimento do PIB inferior a 2%,
foi lançado um novo pacote de medidas para estimular a economia. O ministro
Guido Mantega (Fazenda) anunciou que a União comprará neste ano R$ 6,6 bilhões
a mais do que o previsto no Orçamento de 2012 em máquinas e equipamentos e bens
produzidos no Brasil. No total, serão R$ 8,4 bilhões. Segundo o ministro, a
União comprará 8.000 caminhões, a um custo de R$ 2,2 bilhões, 3.000 patrulhas
agrícolas (com tratores e outros equipamentos), 3.500 retroescavadeiras e
motoniveladoras, 50 perfuradoras para poços em época de seca, 2.100
ambulâncias, 160 vagões de trens urbanos, 500 motocicletas, 40 blindados para o
Ministério da Defesa, 30 veículos lançadores de mísseis, 8.700 ônibus escolares
e cerca de R$ 450 milhões em móveis escolares, entre outros. Associadas a estas
compras, foi reduzido de 6% para 5% ao ano a TJLP (Taxa de Juros de Longo
Prazo), referência dos empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social, a chamada Bolsa BNDES. Todavia, o montante adicional de
compras anunciado fará pouco efeito sobre o PIB, uma vez que representa o
acréscimo de 0,22% em 2012. O mercado financeiro recebeu friamente o PAC das
compras do governo. Só para comparação, a restituição do Imposto de Renda feito
no mês de junho foi de R$2,4 bilhões. Este ano já está perdido e cada vez mais
as previsões apontam para baixo, para algo entre a estagnação e a recessão.
PAUPERIZAÇÃO RELATIVA ATRAVÉS DA ESCRAVIDÃO
POR DÍVIDA
O leitor verá na edição número 10 d’O
Bolchevique, no artigo “‘Crédito fácil’ de Dilma: Dando ‘mais corda para o
enforcado’”, a sobre endividada população trabalhadora, e enforcando mais aos
bancários” alguns elementos do que estamos falando, onde resgatamos caros
conceitos marxistas que fundidos à análise da realidade das massas atual nos
servirão de ferramenta para construir o programa revolucionário para o nosso
tempo.
Ao contrário do “crescimento virtuoso” tão
propalado pelo Ministro da Fazenda, o país entrou em um círculo vicioso em que
cada vez mais tratou de criar a situação que o BIS alerta como preocupante: a
de compensar a estagnação da produção comprometida, tanto pela estratégia
agro-exportadora quanto pela crise econômica mundial, com a expansão do
crédito, inflando as bolhas do endividamento das famílias e imobiliária.
A população sofre duas formas de empobrecimento:
a pauperização relativa (aumento da distância entre o valor produzido pelo
trabalhador e a parcela dessa riqueza produzida da qual este se apropria) do
operariado estruturado e dos trabalhadores assalariados em geral que estão
empregados e a pauperização absoluta de uma parte do Exército Industrial de
Reserva, constituída por vítimas da grande indústria, mutilados por acidentes
de trabalho ou adoecidos mentalmente pelo assédio moral e extrema
super-exploração quando estavam empregados, imigrantes indocumentados levados à
opressão extrema, camponeses expulsos de suas terras, órfãos, filhos de pobres
que já nascem mendigos, que são arrastados em direção ao lumpemproletariado,
para os quais foram criadas drogas que os definham e ceifam suas vidas como o
crack. A luta contra a pauperização seja ela absoluta ou relativa é um combate
onde se traça o destino da humanidade, trata-se de defender da ruína a classe
revolucionária dentre os escravos contemporâneos, a classe que dá sustentação a
toda humanidade e que precisamos impedir que caia na ruína, tornando-se “O Povo
do Abismo”, expressão lapidar que é título do livro de Jack London.
Boa parte da popularidade do governo Dilma se
assenta nas ilusões e no entorpecimento disseminados pelo endividamento fácil
em favor da especulação imobiliária, da indústria automobilística e para a aquisição
de bens simbólicos de ascenso social como celulares, tablets, eletrodomésticos
(mini-máquinas), criando a ilusão na população trabalhadora de “ingresso na
classe média” mediante a compra por super-endividamento de alguns “sonhos de
consumo”, quase sempre, artificialmente estimulados.
Contra estas ilusões é preciso explicar às
massas trabalhadores que todos os seus “sonhos de consumo” são produto de seu
trabalho e a ela devem pertencer. É preciso formular um programa correspondente
a estas demandas, que coloque ao lado da luta por um salário mínimo vital: a criação
do 14o salário que incorpore definitivamente aos rendimentos fixos o que hoje é
pago em forma de PLR, tendo como referência o teto máximo já conquistado, a
abolição de todas as dívidas dos trabalhadores com o pagamento de sua casa
própria e expropriação dos especuladores imobiliários, assim como o
congelamento dos aluguéis, juros negativos com o capital comercial e com o
capital financeiro, rumo à estatização de todo os bancos, grandes redes de
supermercado, lojas comerciais e do grande capital imobiliário sob o controle
dos trabalhadores.
Em cada greve e em cada luta específica é
preciso trabalhar pacientemente, com calma e objetividade, para conquistar as
massas contra a ideologia legalista e conformista burguesa incutida nelas e que
as adormece, sobretudo os setores mais atrasados e despolitizados. Entre os
trabalhadores organizados sindicalmente o centro deste combate é a disputa pela
consciência política da classe operária da influência do lulismo e de seus
apêndices da oposição pequeno burguesa ao governo Dilma (PSOL, PSTU,...), ou
seja, a construção de uma nova direção política particularmente para a classe
operária que participa da produção de riquezas, sobre a qual se assenta toda a
sociedade brasileira. Para isto, é fundamental também furar o bloqueio da
divisão sindical inter-burocrática da classe patrocinada pelo Estado
capitalista, através da construção de oposições classistas na base de todas as
centrais sindicais, combatendo a reforma sindical e defendendo um único
sindicato por ramo de produção e a unidade de toda classe em uma só central.
O conjunto dos partidos burgueses e pequeno-burgueses
da esquerda já no anúncio das coligações eleitorais realizam um verdadeiro
streap tease, descortinando o fino e transparente manto socialista e deixando a
mostra seu cretinismo eleitoral e oportunismo deslavado. As alianças
ultra-oportunistas chocaram muitos que ignoravam que Maluf já era base aliada
do governo federal quando Lula foi beijar o pé do arqui-reacionário corrupto
para consolidar o apoio do mesmo à candidatura petista à prefeitura de São
Paulo. Em medida similar, como adiantamos em primeira mão após o Congresso do
PSOL, o partido de Ivan Valente se coligará com o não menos corrupto PTB e
tutti quanti. O PSTU, por sua vez, salivando por um vereador a qualquer custo,
trata de avermelhar a Frente Popular favorita à prefeitura de Belém composta
pelo carrasco do funcionalismo municipal, Edmilson Rodrigues, do PSOL, e pelo
PCdoB, convertido na era Lula em partido marginal da burguesia. Juntos estes
partidos conspirarão contra as campanhas salariais de correios, bancários,
petroleiros, metalúrgicos,... no segundo semestre. Sem cair no
anarco-sindicalismo estéril, a vanguarda revolucionária dos trabalhadores
precisa construir uma frente única para opor ao eleitoralismo uma ativa
perspectiva classista e revolucionária.
A LC, em sua curta existência, deu passos
importantes, através da construção do Comitê de Ligação pela Quarta
Internacional, para romper com o isolamento nacional que não poupa nenhum
agrupamento da deformação nacional-trotskista. Mas temos plena consciência de
que, residindo a maior parte de nossas pequenas forças militantes em categorias
de trabalhadores que não fazem parte diretamente da produção, um longo caminho
ainda há por percorrer para o recrutamento do proletariado com o qual
construiremos o partido trotskista internacionalista de combate. Mas colocar a
questão de maneira franca, sem enganos e auto-enganos já representa um passo
significativo para o alcance de nossos objetivos organizativos e estratégicos.
Humberto
Rodrigues
* Diferenças entre países capitalistas
dependentes e semi-coloniais: Como países dependentes consideramos aqueles que,
sem emancipar-se da penetração econômica do imperialismo, conservam uma
importante independência política, expressada sobretudo pelo fato de poder
responder militarmente contra as ofensivas das próprias potências
imperialistas, isto hoje em dia compreende aos chamados “Estados nucleares” que
sendo nações burguesas não fazem parte dos centros imperialistas. (Nota de Leon
Carlos da TMB argentina, antecipando um conceito que estamos desenvolvendo no
CLQI e do qual trataremos no futuro).