quinta-feira, 7 de junho de 2018

1968: MEMÓRIA

Governo golpista apoiou o terrorismo
do Comando de Caça aos Comunistas

Reproduzimos abaixo o importante relato do camarada Fausto Barreira Filho acerca da batalha da Rua Maria Antônia, um dos mais conhecidos conflitos de rua entre a esquerda e a direita fascista realizado em São Paulo, durante a ditadura militar, em 1968, envolvendo os terroristas do CCC (Comando de Caça aos Comunistas) e estudantes. Aquele regime golpista, imposto pelo imperialismo e pelo empresariado, apoiou a ação fascistoide, paramilitar, do CCC contra os estudantes e trabalhadores. O relato abaixo foi publicado no jornal REPÓRTER, de São Paulo (outubro/1978).


Ao jornal REPÓRTER:

Li a reportagem do REPÓRTER n. 15 sobre o CCC e sua atuação em São Paulo, em 1968. Naquela época, eu era estudante da Faculdade de Economia da USP, situada próximo à rua Maria Antônia, onde se deram os acontecimentos que culminaram com a destruição do prédio da Faculdade de Filosofia da USP pelo CCC e o assassinato de um estudante; assim, pude acompanhar os fatos de perto.

Por meio de um artigo de minha autoria, na época, para o jornal do Centro Acadêmico Visconde de Cairu (da Faculdade de Economia) descrevendo os acontecimentos daqueles dias, creio que ficará claro o acobertamento que a polícia (a Força Pública, na época) e o governo do Estado deram ao CCC.

Eis o artigo:


Governo apoiou mesmo o Terrorismo do CCC



Parte da imprensa insiste em caracterizar os acontecimentos como sendo o resultado de uma rixa entre os estudantes da Filosofia da USP e do Mackenzie. Mas os fatos são mais graves: tudo começou quando estudantes universitários e secundaristas realizavam, na rua Maria Antônia, pedágio com o fim de arrecadar recursos para a realização do 30º Congresso da UNE - União Nacional dos Estudantes. Enquanto promoviam o pedágio, os estudantes foram agredidos com ovos e pedras partidos do prédio do Mackenzie. Deve-se levar em conta que essa agressão não foi ocasional, mas fazia parte de um plano visando impedir a realização do Congresso da UNE. Com o revide aos ataques, teve início a batalha de pedras e caramurus, que durou um dia inteiro.

No segundo dia de luta, tudo ficou mais claro. O Comando de Caça aos Comunistas - organização terrorista, paramilitar, ocupou o alto de um prédio em construção, ao lado do Mackenzie, com a intenção de destruir a Faculdade de Filosofia. Com armas privativas do Exército - essa denúncia está no jornal O Estado de S. Paulo -, com bombas de gás lacrimogêneo - fato também documentado pela imprensa - passou à agressão com a cobertura da Força Pública. Os estudantes da Faculdade de Filosofia, ajudados por secundaristas, professores e, inclusive, mackenzistas, improvisaram defesas para responder à agressão. O estudante secundarista José Guimarães, que se encontrava na rua, em frente à Faculdade, foi assassinado a tiros, pelo CCC.

Ao cair da tarde, os assassinos do CCC passaram a jogar bombas incendiárias sobre o prédio da Filosofia; os bombeiros tentaram entrar pela porta principal, mas foram apedrejados de cima do prédio ocupado pelos terroristas. Vendo que a Faculdade de Filosofia estava sendo destruída, seu diretor - professor Erwin Rosenthal - pediu aos alunos que evacuassem o prédio, no que foi atendido; comunicou o fato ao governador Abreu Sodré e pediu que a Força Pública interviesse prontamente para evitar a destruição de um patrimônio do Estado. O secretário da Segurança Pública, Helly Lopes Meirelles, prometeu atender, mas, passadas duas horas, com a Faculdade de Filosofia totalmente vazia e a Força Pública a apenas cem metros do local, nenhuma providência havia sido tomada. Pude testemunhar o instante em que o deputado federal Israel Dias Novaes telefonou da Faculdade de Economia para o secretário de Segurança Pública, exigindo providências e ameaçando denunciar o fato no Congresso.

Ao ver que não encontravam resistência policial, os terroristas incendiaram a entrada principal da Faculdade de Filosofia; com foguetes afastaram a multidão que estava próxima, e, ao som do Hino Nacional, hastearam a bandeira brasileira. A Força Pública, já no local, nada fez. Porém, aproximadamente 300 pessoas, que se encontravam nas proximidades, vaiavam e atiravam pedras nos agressores. Nesse momento, a Força Pública agiu prontamente, perseguindo a multidão. Mais de 100 pessoas refugiaram-se na Faculdade de Economia, próxima do local, e trancaram a porta de entrada. Os policiais abriram-na com rajadas de metralhadoras, invadiram a Faculdade, atiraram bombas em todos os andares, quebrando portas, prenderam indiscriminadamente pessoas que lá estavam ? inclusive professores - e violaram o arquivo do Centro Acadêmico Visconde de Cairu.

Para saber mais sobre o assunto:

Documentário "A batalha da Maria Antônia", dirigido pelo Renato Tapajós.

Trailer do documentário