sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

MALI

Derrotar a invasão imperialista francesa!

DECLARAÇÃO DO COMITÊ DE LIGAÇÃO PELA IV INTERNACIONAL

in English (page 24)
O imperialismo francês invadiu o Mali (mais de dois mil soldados no início de janeiro aos quais se somam aviões bombardeios de guerra franceses), com apoio britânico nesta moderna disputa pela África. Após a pilhagem bem sucedida da Líbia, uma divisão de trabalho foi aparentemente acordada como parte de uma estratégia de longo prazo. A França vai invadir e ajudar seus títeres nesta região, tendo previamente lidado com a Costa do Marfim, reeditando a política neocolonialista conhecida como Françafrique [1].

De seu lado, a Grã-Bretanha espera ajuda da França para ocupar a Somália que logo será a bola da vez. Isto tudo sob a liderança global dos EUA que estão logisticamente ocupados com suas guerras geopolíticas no Afeganistão e no Iraque, enquanto aumentam o cerco contra a China, o rival contra quem prepara-se para travar a Terceira Guerra Mundial. Israel, Arábia Saudita, Qatar e Turquia, no momento, tratam do enfrentamento com a Síria e o Irã.

A CONFERÊNCIA DE BERLIM (1884-85) desencadeou a primeira disputa colonial pela África e pelos mesmos objetivos são travadas as guerras atuais – para garantir matérias-primas e mercados e impedir que seus rivais o façam. Nesta conferência foi acordado que o continente tinha de ser realmente ocupado para que houvesse reconhecimento internacional, daí a disputa por quem ocupa. É difícil que se chegue a um acordo hoje e mesmo que ele ocorra não vai impedir a guerra inevitável entre os rivais imperialistas. O imperialismo ocidental hoje é liderado pelos EUA que tem a Grã-Bretanha e França como seus principais aliados. Estas nações imperialistas se confrontam com um bloco de nações lideradas pela Rússia e pela China, sendo a capacidade nuclear russa mais avançada em muitos aspectos e a China a nação mais importante porque está expandindo sua influência na África como em outras partes do hemisfério ocidental. O alerta urgente de Obama para que Cameron não retire a Inglaterra da Comunidade Européia [2] é motivado pelo medo de uma quebra da União Europeia empurrará a Alemanha e seus aliados mais próximos a ficarem muito tentados a abandonar o euro e olharem para o leste em direção a Rússia e China, deixando a Espanha e Itália enfrentando dilemas cada vez mais duros sobre qual campo imperialista rival deverão optar.

“MALI EM CHAMAS! – O AFEGANISTÃO AFRICANO” é o nome de um artigo do Times Online asiático pelo jornalista brasileiro Pepe Escobar nos informa: “Mali faz fronteiras com Argélia, Mauritânia, Burkina Faso, Senegal, Costa do Marfim e Guiné. O espetacular delta do Níger está no centro de Mali – ao sul do Saara. O Mali transborda de ouro, urânio, bauxita, estanho, ferro, manganês e cobre. E,... gasodutos em combustão! - Há abundância de petróleo inexplorado no norte do Mali "[3].

É claro que a intervenção militar não atingirá apenas o Mali, isto já adquiriu o caráter de uma guerra regional envolvendo Mali, Argélia, Líbia e todos os países da região. Aqui o ouro é um dos mais importantes minerais extraídos. E ele é extraído da maneira mais primitiva, com a utilização de trabalho infantil. A Human Rights Watch produziu um relatório em 6/12/2011: “Trabalho infantil no Mali na exploração de ouro: trabalho perigoso, intoxicação por mercúrio e doenças”. Ele revela que:
“O TRABALHO INFANTIL ARTESANAL NA EXPLORAÇÃO DE OURO é comum em muitos países ao redor do mundo, especialmente no cinturão da África ocidental, que abrange Burkina Fasso, Costa do Marfim, Gana, Guiné, Nigéria e Senegal. Mali é o terceiro maior produtor de ouro da África... crianças menores de seis anos cavam veios de ouro, trabalham no subterrâneo, levantam pesados fardos de minério bruto, e carregam, esmagam e arrastam esse minério. Muitas crianças também trabalham com mercúrio, uma substância tóxica, para separar o ouro do minério bruto. O mercúrio ataca o sistema nervoso central e é especialmente prejudicial às crianças...números obtidos pelo Human Rights Watch do Ministério Maliano de Minas coloca o montante de ouro artesanalmente anual por volta de quatro toneladas métricas, com valor aproximado de 218 milhões de dólares nos preços de novembro de 2011. Muito desse ouro é exportado para a Suiça e Emirados Arabes Unidos e principalmente para Dubai.”

http://www.youtube.com/watch?v=KLpHQGExt68

Comentando o artigo de Pepe Escobar, Te Pu Win, de Toronto, define as rivalidades inter-imperialistas em seu devido contexto:

“A CHINA É O MAIOR PARCEIRO COMERCIAL DA ÁFRICA E AGORA TEM CERCA DE 200 EMPRESAS INVESTINDO NO MALI. Essa turbulência coloca a China em apuros e a forma como os líderes chineses vão lidar com esta situação vai ser crucial para suas imensas necessidades de abastecimento a partir da África. Com a crescente complexidade dos conflitos, a China está investindo no aumento da capacidade de suas tropas de resposta rápida em caso de perigos para os trabalhadores chineses expatriados em terras longínquas. Seu Y-20 avião super-transportador ainda não está pronto, ele poderá transportar até 99 tanques.”

Muitos conflitos étnico / religiosos nesta parte da África tem raízes históricas profundas – desde a invasão árabe no século 13. Isto agora é agravada pelo neo-colonialismo e o chamado Conselho de Segurança das Nações “Unidas”, uma entidade racista e imperialista que, devido à sua superioridade (nuclear) militar pode intervir com a impunidade em qualquer lugar que considere que seus interesses estão "ameaçados".


Pepe explica as forças em disputa no Mali e como elas chegaram a atual situação:

Tudo começou com um golpe militar em março de 2012, há apenas um mês antes de uma eleição presidencial no país, quando foi derrubado o então Presidente Amadou Toumani Touré. Os golpistas justificam seu golpe como uma reação à incompetência do governo na luta contra os tuaregues.
O líder do golpe foi um certo Capitão Amadou Sanogo Haia, que não por acaso tinha sido muito bem preparado pelo Pentágono, o que incluiu quatro meses de curso básico de formação como oficial de infantaria em Fort Benning, na Geórgia, em 2010. Resumidamente, Sanogo também foi preparado pela AFRICOM, um projeto que combinava o Programa de Cooperação no Contraterrorismo do Trans-Sahara do Departamento de Estado e a Operação Liberdade Duradoura do Pentágono. Vale ressaltar que todo este verso de “defesa da liberdade” tem sido sempre o "fiel aliado" do tal “contraterrorismo, combatendo (pelo menos teoricamente a Al Qaeda) no Magreb islâmico (AQIM).

NOS ÚLTIMOS ANOS, WASHINGTON ADQUIRIU KNOW HOW EM OPERAR ESTES GIROS DE 180 GRAUS. Durante o segundo mandato de George W. Bush, as Forças Especiais foram muito ativas em estreita colaboração com os tuaregues e argelinos. Mas, durante a primeira administração de Obama, começaram a apoiar o governo de Mali contra os tuaregues.

Muammar Kaddafi sempre apoiou o movimento de independência dos Tuaregs. Desde 1960, a Agenda do NMLA tem sido liberar o Azawad (Mali do Norte) do governo central em Bamako. Depois do golpe em 2012, o NMLA parece que alcançou seu objetivo. Eles colocaram sua própria bandeira nos poucos edifícios governamentais, e em 05 de abril anunciaram a criação de uma nova e independente nação Tuareg. A comunidade internacional tratou-os com desprezo, o NMLA foi marginalizado inclusive na sua própria região, mas não por três grupos islamitas; Ansar El Dine (“Defensores da Fé”) ; o Movimento pela Unidade e Jihad na Africa Ocidental (MUJAO), e o Al-Qaeda no Magreb Islamico (AQIM).

AGORA, O IMPERIALISMO OCIDENTAL É CONFRONTADO COM AS CONSEQÜÊNCIAS DE APOIAR OS ISLAMITAS NA LÍBIA. Seus antigos aliados agora são seus inimigos no Mali. Sua vitória com a derrubada de Kadafi para golpear os ambiciosos investimentos chineses e russos na Líbia espera obter mais sucesso na Síria. A aposta gananciosa nos saqueadores do “Exército Livre da Síria” resultou na crescente influência da Al-Qaeda dentro da oposição síria. No Mali o imperialismo ocidental teme que os chineses ampliem seu domínio oferecendo infraestrutura de escolas e hospitais. Esta estratégia promoveu a imagem da China em outras partes da África e contrasta com a exploração totalmente parasitária do imperialismo ocidental. Lógico que o bloco chino-russo é tão brutal quando trata-se de golpear a classe operária como vimos na África do Sul, Tanzânia, Zâmbia etc.

OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO OCIDENTAIS DESTACAM A IMPOSIÇÃO DA LEI ISLÂMICA, A SHARIA, NAS ÁREAS CAPTURADAS PELOS GUERRILHEIROS ISLÂMICOS. Estes relatórios podem e devem ser suspeitos, mas não buscamos a negar o caráter reacionário das forças da Al Qaeda, sua opressão brutal sobre as mulheres, gays e lésbicas e sua vontade de prestar serviços ao imperialismo sempre que a oportunidade se apresenta. Sua estratégia é manobrar entre blocos imperialistas rivais para avançar os privilégios para suas próprias elites. Os mulás "revolucionários" do Irã são agora multi-bilionários que oprimem as massas no Irã, sempre que possível, em aliança com o imperialismo. Eles são, na verdade, anti-imperialistas reacionários. Mas, quando eles estão em guerra contra as forças do imperialismo, devemos apoiá-los nessa guerra. Nós nunca podemos esconder a realidade de seu atraso reacionário – a fotografia dos dois adolescentes enforcados no Irã por serem gays tem contribuído muito mais para ajudar a propaganda imperialista do que qualquer coisa que Obama, Cameron ou Hollande poderiam dizer – mas nós sabemos que a África subsaariana, como o resto do mundo semi-colonial, está morrendo de fome porque o imperialismo, o capital financeiro em aliança com os multinacionais globais estão sugando o sangue da vida do "Continente Negro".

Pepe narra os truques e preparativos reais para a guerra:

Já em fevereiro de 2008, o vice-almirante Robert T Moeller estava dizendo que a missão do AFRICOM era proteger "o livre fluxo dos recursos naturais da África para o mercado global", sim, ele referia-se diretamente a China, declarado-a culpada de "desafiar interesses dos EUA".

AVIÕES DE ESPIONAGEM DA AFRICOM "OBSERVARAM" O MALI, A MAURITÂNIA E O SAARA DURANTE MESES. Em tese, a procura de combatentes da AQIM. A coisa toda é supervisionada por forças especiais dos EUA, que atuam sob o condi-nome de operação Sand Creek, baseada na Burkina Faso. Não espere detectar qualquer estadunidense aí, onde eles são maioria dos estrategistas, mas não usam uniformes militares.

Na prática, trata-se de uma ocupação militar ocidental (com Washington "liderando na retaguarda") versus os sedutores investimentos chineses na África. No Mali, o cenário ideal para Washington seria um remix do Sudão; como a recente divisão do Sudão entre o Norte e o Sul do país, que criou uma dor de cabeça de logística extra para Pequim. Por que não então uma divisão do Mali para explorar melhor as suas riquezas naturais? A propósito, o Mali era conhecido como Sudão Ocidental até sua independência em 1960.

No blog Activist Post somos informados:

ENQUANTO ISSO, NA REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DO CONGO OS REBELDES DO M23 estão se preparando para marchar para a capital e derrubar o governo. Relatórios da ONU confirmam que Washington apoia os rebeldes. Em dezembro de 2012, um influente especialista sobre a África, Dr J Peter Pham, publicou um artigo, "Para salvar o Congo é preciso fragmentá-lo". Ele argumenta que o Congo é uma "entidade artificial" que é "grande demais para ter sucesso", e, portanto, a direção política tomada pelos EUA deveria ser a de promover a balcanização:

O que Pham está sugerindo é a política de levar a nação congolesa ao colapso, criando pequenas pequenas entidades etno-nacionalistas demais para resistir às corporações multinacionais. O sucesso da investida do M23 certamente deve ter abalado a estabilidade do Presidente Kabila, cujo pai chegou ao poder com o apoio do Uganda e de Ruanda, em 1996, regimes, empregando as mesmas estratégias que o M23 usa hoje.

Kambale Musavuli, de Washington – Capital Federal onde é sediada a ONG “Amigos do Congo” – está certo ao afirmar:
As pessoas precisam ter claro contra quem estamos lutando no Congo... Estamos lutando contra potências ocidentais, contra os Estados Unidos e o Reino Unido, que estão treinando, armando e equipando as forças armadas de Ruanda e Uganda. [4]

E COMO É QUE O RESTO DA ESQUERDA REAGIU À ESTA INVASÃO DO MALI? Todos a condenaram (embora ninguém faça apologia dos rebeldes desta vez), mas suas conclusões são débeis e impotentes para resistir a pressão de suas próprias classes dominantes.

A classe trabalhadora das metrópoles nunca vai quebrar suas próprias cadeias e sair em socorro da parte Sul empobrecida do globo, se eles não forem capazes de romper com a sua fidelidade para com sua própria classe dominante e suas guerras e intervenções estrangeiras. E para isto é preciso conceber de modo consciente e marxista a construção da Frente Única Anti-Imperialista, sem apoiar políticamente nenhum ato reacionário das guerrilhas fundamentalisas anti-imperialistas contra a sua própria classe trabalhadora e os seus pobres, mas sim uma frente unida contra os ataques imperialistas e seus lacaios locais de qualquer parte.

Em 16 de janeiro, no site do Novo Partido Anti-Capitalista francês 2013, Paul Marciais concluiu com o seguinte pensamentos ironicamente abaixo de um subtítulo “Torne-se um internacionalista”:

"Nossa posição entra em choque com um quase todas as outras posições políticas da nação francesa. Alguns podem ter sido levados pela emoção legítima contra a barbárie dos jihadistas e o sofrimento da população, mas agora as coisas se tornam mais claras, é claro que a guerra será longa, cara e difícil. Talvez a França faça parte do problema e não da solução. Na verdade, desde a independência dos Estados africanos, a França não deixou de apoiar as piores ditaduras, os piores massacres, as piores guerras, de estar envolvida no genocídio de Ruanda e certamente não é a nação mais recomendada para defender os direitos dos povos da África. Nós só podemos denunciar a Françafrique, o seu apoio a ditadores, o fato de que Hollande recebe Bongo, Deby, Compaore, o fato de que ele não emitiu um único protesto contra a violência das forças de repressão em Togo contra os manifestantes. Reafirmamos a nossa solidariedade para com as forças progressistas da África e do Mali que se opõem à intervenção francesa."

Então, a questão não é conformar uma Frente Unida Anti-Imperialista contra a invasão francesa, mas limitar-se a apoiar aos agrupamentos de esquerda e as forças progressistas enquanto o imperialismo pode bombardear e mandar para o inferno os reacionários e assim se pode aproveitar-se da nação e de seus recursos realmente sem qualquer objeção uma vez que se trata de uma guerra contra os tais reacionários.

O Partido Socialista dos Trabalhadores da Argélia (PST, seção argelino do Secretariado Unificado da IV Internacional, o SU) em 17 de janeiro de 2013 emitiu uma declaração semelhante evitando também tratar deste ponto crucial [5]. Ele concluiu com o que poderíamos chamar de uma série de demandas liberais democráticas que de modo algum podem ser chamadas de revolucionárias.

“Solidariedade com o povo do Mali e com os refugiados!, Por uma solução política para garantir os direitos democráticos e o desenvolvimento para todos os componentes do povo de Mali!”

E também é essa a posição do COREP e da maioria dos outros grupos franceses e mundias que se dizem de esquerda e trotskistas.

De nossa parte proclamamos:

• Pela derrota da Invasão Francesa no Mali
• Por uma Frente Unida Anti-Imperialista com todas as forças de combate a invasão imperialista no Afeganistão, no Iraque e no Oriente Médio e África!
Notas
 
 [1] O termo "Françafrique" foi usado pela primeira vez em 1955, pelo títere presidente da Costa do Marfim, Félix Houphouët-Boigny, que defendia a manutenção de uma relação estreita com a França, enquanto defendia a independência formal de seu país. François-Xavier Verschave e o Survie associação, da qual foi presidente até sua morte, em 2005, reutilizaram a expressão de Houphouët-Boigny, a fim de nomear e denunciar todas as ligações ocultas entre França e a África. Mais tarde, ele definiu Françafrique como "a criminalidade secreta nos altos escalões da política e economia francesas, onde uma espécie de República subterrânea se oculta"
[2] A Grã Bretanha hoje já não faz parte da Eurozona, ou seja, não adota o Euro como moeda.
[3] Online Asia Times 19 de janeiro
http://nakedempire2.blogspot.co.uk/2013/01/pepe-escobar-burn-burn-africas.html
[4] Mensagem Ativista, http://www.activistpost.com/2013/01/congos-m23-conflict-rebellion-or.html
[5] O Partido Comunista Francês (PCF) e do Parti de Gauche (PG) de Mélenchon, organizações líderes da Frente de Esquerda (FDG) reproduzem cada um a seu modo os interesses de sua própria burguesia: condenam apenas formalmente a intervenção mas não dizem nada sobre o direito legítimo de determinação do povo nem reconhecem a MNLA Tuareg como força beligerante. O PCF justifica sua posição pelo simples fato de que a intervenção não estar sob a bandeira das Nações Unidas, o PG argumenta que a invasão militar francesa deveria limitar-se a "impedir" o avanço dos rebeldes para Bamako.