segunda-feira, 25 de julho de 2016

“MAIS” – RUPTURA DO PSTU

O apoio à contrarrevolução na URSS foi para o MAS argentino o que o apoio ao Golpe de Estado no Brasil está sendo para o PSTU

“Aqueles que são incapazes de defender as posições tomadas, nunca conquistarão outras novas”. Leon Trotsky

Segundo o PSTU brasileiro, no final dos anos 80,
“o MAS se transformou no maior partido trotskista do mundo, chegando a contar em suas fileiras entre sete e nove mil militantes. Isso se expressava diretamente na venda do Solidariedade Socialista, com uma média de 20.000 exemplares semanais, alcançando picos de 80.000 periódicos vendidos. ” (O Movimento ao Socialismo, da Argentina, foi um dos maiores partidos trotsquista do mundo, 30/09/2014). [1]
Se tomarmos como verdadeiros os números fornecidos pelo PSTU acerca de seu partido mãe e levarmos em conta que a população argentina tem sido em média 1/5 da população brasileira, nove mil militantes na Argentina equivaleriam a 45 mil militantes no Brasil. O PSTU, nascido em 1994, embora seja o maior partido da LIT hoje, nunca chegou a reunir 1/3 dos militantes que reuniu o MAS argentino em seu período áureo.

O MAS acreditava que a contrarrevolução na URSS e no Leste Europeu eram na verdade revoluções políticas, “revoluções democráticas”. O “detalhe” é que junto com o stalinismo perecia a maior conquista do proletariado mundial, o primeiro Estado operário da história. Esse processo abriu caminho para uma ofensiva ideológica anticomunista inédita do imperialismo. O morenismo, naquela época unificado, apresentava que aquele processo contrarrevolucionário era uma “revolução grandiosa” e “um tremendo fator progressivo para o processo mundial” [2] que abriria o caminho para o trotskismo deixar de ser uma corrente marginal para tornar-se dirigente do movimento de massas no planeta.

Trotsky havia advertido que o maior crime do stalinismo era vender derrotas como vitórias:

“A emancipação dos trabalhadores só pode ser obra dos próprios trabalhadores. Não há, pois, crime maior do que enganar as massas, apresentar as derrotas como vitórias, os amigos como inimigos, subornar os líderes dos trabalhadores, fabricar lendas, encenar falsos julgamentos, em suma, fazer o que fazem os stalinistas.” (Leon Trotski - A Nossa Moral e a Deles, 1938) [3]

Entre o final da década de 80’ e 1992 a contrarrevolução capitalista liquidou com quase todos os Estados operários. O MAS não resistiu a desmoralização diante da realidade adversa criada a partir de então contra o proletariado mundial e fragmentou-se em dezenas de partes. A maior parte dos então 9 mil militantes renunciou a luta política.

Essa derrota, de escala planetária, não foi influenciada em nada pelo programa do MAS nem por qualquer setor do trotskismo mundial. Toda a esquerda mundial retrocedeu como parte do retrocesso da consciência e da organização das massas proletárias, enquanto a população mundial, inclusive o número de operários cresceu e a barbárie imperialista se acentuou, a vanguarda militante decresceu em termos absolutos e relativos. Mas esse tema, fundamental para virarmos a mesa e retomarmos a ofensiva revolucionária no futuro será alvo de outros debates e documentos.

Todavia, não há dúvida que o programa ufanista do morenismo desarmou o partido para a ofensiva ideológica anticomunista que viria, e agravou a desmoralização e a crise terminal do MAS.

“Em 1992, no entanto, ocorre uma primeira importante divisão no MAS, que abre um processo de profunda crise política interna, que finalmente desembocou na ruptura do MAS com a LIT-QI em 1997.” (O Movimento ao Socialismo, da Argentina, foi um dos maiores partidos trotsquista do mundo, ...).

Como parte desta desmoralização, um episódio ficou muito marcado na memória da vanguarda trotskista argentina, em um debate televisivo, Silvia Díaz, então dirigente do MAS, de um lado, e Adelina de Viola, da UCeD menemista do outro. Díaz opinava que os trabalhadores alemães haviam derrubado o muro porque queriam o socialismo com democracia. Viola, aproveitou-se da fantasia de Diaz para replicar: “socialismo las pelotas” e caricaturar aos trotskistas como gente delirante sem noção da realidade. Havia triunfado o capitalismo e o muro caía junto com as conquistas dos trabalhadores de todas as nacionalidades, incluindo os da Argentina.

Voltemos então ao Brasil de hoje, o PSTU, o maior partido da LIT, nunca revisou seu apoio a contrarrevolução restauracionista no Leste Europeu, nunca aprendeu com a derrota de sua corrente histórica. Pelo contrário, para se desresponsabilizar pelo crime de ter saudado a maior derrota do proletariado mundial, reescreveu a história dizendo que a contrarrevolução na URSS havia sido anos antes, em 1986 [4], com Gorbachov e a Perestroika, uma profunda desonestidade intelectual. Tamanho cretinismo confundiu mais que elucidou as causas da crise. Em seguida, o PSTU e a LIT negaram que Cuba e Coréia do Norte seguissem sendo Estado operários, países onde apesar da direção stalinista, ainda que deformadamente e com capitulações o Estado segue defendendo e reproduzindo as formas de propriedade nacionalizada da maioria dos meios de produção criadas pela expropriação revolucionária das respectivas burguesias.

O PSTU e a LIT passaram a ser contumazes embelezadores de esquerda das políticas de reação democrática e “regime change” do imperialismo, uma espécie de sectarismo pró-imperialista. Todavia, essa política deu um salto de qualidade quando a partir do contraataque imperialista a expansão comercial dos BRICS pós crise de 2008 e da chamada “primavera árabe” a LIT passou a apoiar também a reação não democrática do imperialismo, na Líbia, Egito, Síria, Ucrânia,... Brasil:

“o PSTU e alguns satélites (como a MRT-LER, MNN, ES) boicotam as manifestações antigolpisas e subestima a reação: ‘não estamos na eminência de um golpe da direita como sinalizam algumas organizações’. Curiosamente, o PSTU é entusiasta do golpismo imperialista mundo afora, aprensentando-o como ‘revoluções populares’ a todos os processos golpistas, da Líbia a Ucrânia, passando pelo Egito. Juntamente com a oposição burguesa reacionária brasileira, o PSTU criminalizam aos Black Blocs e se opõe a que médicos cubanos atendam a centenas de milhares de pacientes brasileiros, enquanto apoiam mercenários da CIA, como a ‘blogueira’ cubana Yoani Sanches e a ‘rebelde’ síria Sara Al Suri, ou ONGs bancadas pela CIA, como o Batay Ovriere do Haiti.” (Por uma frente única antigolpista internacionalista no primeiro de maio! Por um primeiro de maio de luta contra o imperialismo e o golpismo! 08/04/2014) [5]

Como destaca Mário Maestri, a continuidade dessa política, resultou em um:

“O monumental erro de avaliação, por mais de três décadas, sobre a destruição dos Estados operários, não se explica certamente apenas por insuficiências metodológicas ou empíricas. As sequelas sociais daquele processo foram de dimensão suficiente para por fim a quaisquer dúvidas. Uma avaliação tão excêntrica e de tão longa duração expressou certamente desvios de classe, com destaque para as concessões ao democratismo e ao formalismo pequeno-burguês, fortalecidos no contexto contrarrevolucionário dominante. E essa abnormidade interpretativa teve consequências gravíssimas não apenas quanto à educação da militância. Ela transformou-se em apoio indiscutível à contrarrevolução. Nas últimas décadas, o apoio à restauração capitalista dos Estados operários degenerados espraiou-se para outros domínios da luta nacional e de classe. Através do mundo, direções trotskistas saudaram os fedayins de Osama Bin Laden como paladinos da liberdade, mesmo quando degolavam comunistas afegãos. Replicaram os sinos enquanto a Iugoslávia e a Sérvia eram demolidas pelos bombardeiros da OTAN, pois significava o fim dos herdeiros de Tito. O arrasamento do Iraque e da Líbia valiam a queda de Saddam e Kadafi. Agora, apoia-se o esfacelamento da Síria, pelo imperialismo e pela Arábia Saudita, já que Assad não é um presidente democrático.” (PSTU: Os Significados de uma Ruptura, 12/07/2016) [6]

Ao contrário do que caracterizam alguns, essa orientação sectária favorável ao imperialismo da LIT e de algumas correntes morenistas ou satélites do morenismo conduziu o PSTU ao apoio de vários golpes de Estado. Não poderia ser distinto quando a ofensiva golpista do imperialismo chegou ao Brasil. A partir daí o PSTU não conseguiu explicar a causa do golpe, a dinâmica do golpe e o golpe mesmo. Sua análise programática se chocou com a realidade e nem sequer reconheceu até agora que ocorreu um golpe de Estado no Brasil. Esse foi o fermento da crise interna que sofreu e que deu origem a maior ruptura de sua história.

OS PRIMEIROS PASSOS DO
“MOVIMENTO POR UMA ALTERNATIVA INDEPENDENTE SOCIALISTA”

Segundo relato do camarada Davi, do jornal Folha do Trabalhadora, que esteve no ato nacional de fundação do MAIS, pouco mais de mil pessoas se agruparam no dia 23 de julho no Club Homs, em São Paulo. Na plateia, poucos operários e muitos setores de classes média e estudantes. Estiveram presentes também representantes do PSOL, PCB, MES, NOS. As palavra de ordem predominantes no ato foram “Fora Temer e Eleições Já!” e “Fora Temer, Fora PT!” Romperam supostamente contra o apoio do PSTU ao impeachment, mas nem em seus documentos nem no ato, o grupo reconhece que o impeachment foi um Golpe. O que é preocupante pois a derrubada de Dilma, estabeleceu um governo infinitamente pior para os direitos e conquistas históricas dos trabalhadores que o do PT. Sem reconhecer a existência do golpe, o “Fora Temer!”, vira um slogan populista inócuo, para capitalizar eleitoralmente o descontentamento com o governo golpista da mesma forma que já vem sendo usado pelos oportunistas do PT e PCdoB que abortaram a luta de rua e de massas contra o golpe, a única que poderia derrotar o governo golpista. Nesse sentido, o novo MAIS, assim como os velhos PT, PCdoB e o PSTU tem acordo em torno do “Fora Temer, eleições gerais!”. A diferença reside em torno do arco de alianças para as próximas eleições municipais e para as pretensas eleições gerais. O MAIS defende a reedição da Frente de Esquerda montada em 2006 com o PSOL e PCB. Assim como outros agrupamentos esse também parece crer miticamente que a unidade da esquerda em si, através da confluência e combinação de programas confusos, já resolveria a sua crise política.

O MAIS segue reivindicando a concepção morenista de “revoluções democráticas”, que o morenismo traficou do stalinismo para o trotskismo, concepção que nega teórica e praticamente a revolução permanente.

O manifesto dos mais de 700 militantes que deixaram o PSTU segue reivindicando as posições históricas principais e as recentes do morenismo. Não faz a mais elementar autocritica de sua posição em relação a guerra dos Balcãs, da “primavera árabe”, dos golpes de Estado na Líbia, Egito, Ucrânia, quando sua corrente matriz apoiou golpes de estado e ditadura sangrentas inclusive lideradas por neonazistas assumidos, segue apoiando os mercenários da CIA na Síria... Apesar de rever progressivamente a restauração capitalista de 25 anos atrás, segue renegando a defesa dos Estados operários hoje existentes: Cuba e Coréia do Norte. Isso não fazem os autores do manifesto e sua revisão limita-se ao terreno platônico. Também, em nenhum momento reconhecem que houve um golpe no Brasil. Apenas se opõem ao chamado da direção majoritária ao desastroso "fora todos!" e ao impeachment de Dilma, o que, formalmente, Zé Maria e a linha oficial já havia feito.

Relembramos que a principal ruptura que sofreu o MAS, o MST da Argentina (Movimento Socialista dos Trabalhadores) em nenhum momento revisaram as análises programáticas gerais do MAS acerca da contrarrevolução no Leste Europeu, seguiram a mesma trilha stalinofóbica e democratizante e defendem mais entusiasticamente que a própria LIT toda política contrarrevolucionária do imperialismo. O principal objetivo do MST é se apresentar como uma nova esquerda que se identifica com os movimentos sociais pós-modernos por sobre uma análise classista da sociedade.

O elemento mais progressivo da ruptura está contido nesse parágrafo do manifesto “É preciso arrancar alegria do futuro” [7]

“Acreditamos que as dificuldades enfrentadas pelos revolucionários neste início de século 21 encontram sua explicação mais profunda no impacto reacionário da restauração capitalista na URSS, leste europeu, sudeste asiático e Cuba. A ofensiva política, econômica, social, militar e ideológica do imperialismo, os discursos sobre “o fim da história” e a adaptação da esquerda reformista à ordem burguesa não passaram sem consequências. O movimento de massas retrocedeu em sua consciência e organização. E os revolucionários sofreram os efeitos desses anos de confusão e crise.”

Neste parágrafo, 25 anos depois, se delimitam do principal crime do morenismo, o apoio a contrarrevolução na URSS e no Leste Europeu. Mas o fazem como quem busca limpar a própria ficha confessando um crime bem anterior, acreditando que o mesmo já tenha prescrevido, para assim encobrir sua claudicação aos crimes do presente, como o de contar como fato consumado a restauração capitalista em Cuba e Coreia do Norte.

Se fosse consequente, tal revisão serviria para o novo grupo reorientar-se programaticamente, para levá-lo a romper com toda a política internacional da LIT durante duas décadas e meia em que o partido apresentou e apoiou as derrotas como sendo "vitórias”. Um exemplo bastante significativo dessa política desastrosa e pró-imperialista foi o caso da chamada guerra nos Bálcãs, onde Croácia, Bósnia e Kosovo foram usados como peões do imperialismo contra o Estado operário multiétnico iugoslavo. Na época, 1994, uma fração internacional, o CITO, rompeu com a LIT denunciando essa capitulação.

Essa delimitação desse desvio do passado morenista serve para camuflar a claudicação do MAIS aos crimes do presente, como quando qualificam que “depois de 2012, uma onda revolucionária atravessou o Magreb e o Médio Oriente” [8], quando na verdade o que ocorreu nesse período e nessa região do globo foi uma bárbara recolonização e balcanização a partir da manipulação por parte do imperialismo das manifestações de protesto contra as consequências da crise econômica de 2008 sobre esses povos.

O símbolo do MAIS, um hashtag colorido, diz muito sobre o novo agrupamento, afinal, é a imagem que o grupo quer passar para o mundo sobre si mesmo e, obviamente que tipo de gente quer atrair e agrupar. Pois bem, o símbolo “moderninho” e “antenado” escolhido não representa nada na história do movimento operário, nada. Se o PSTU já havia “se atualizado" abandonando a foice e o martelo, essa refundação morenista abandona agora também o vermelho pelo hashtag colorido.

O MAIS segue qualificando o PSTU de "partido revolucionário" e reivindicando a filiação a LIT. Para além de uma suposta manobra tática a fim de arrastar os retardatários esse é outro elemento que aponta que o MAIS tende a ser menos do que promete. Chamamos a base militante que rompeu com o PSTU, a romper com a LIT e com o morenismo. De outro modo, é impossível que tal ruptura possa ajudar no processo que fará explorados e oprimidos a construírem uma nova ferramenta de luta, um programa sem a mácula de ter contribuído com derrotas históricas de nossa classe. Assim será possível superar o desvio oportunista do PT, seguido pelo oportunismo esquálido do PSOL. Chamamos a frente única de ação para combater o Golpe de Estado do imperialismo contra a classe trabalhadora e em defesa dos direitos, sem alimentar qualquer ilusão em fretes programáticas e eleitorais com os oportunistas, conciliadores de classes ou com a direita golpista e burguesa, como fazem o PT, PCdoB e PSOL, em várias capitais do país.

Acreditamos que após o golpe vivemos uma situação pré-contrarrevolucionária, que o inimigo já anunciou seus ataques mas ainda não reuniu condições política e militares para executá-los contra nós. Se ele vai conseguir executar as ameaças aos principais direitos que conquistamos ao longa da luta de classes da história do país (jornada de 8 horas de trabalho, aposentadoria, 13º salário, sistema único de saúde, universidade pública, etc.) irá depender da luta que está por realizar-se. Esta luta exige um esforço titânico por erguer uma resistência a altura. Tão longo, se estabilize a situação política, através do afastamento definitivo de Dilma e talvez após as eleições municipais, o governo Temer ou o que lhe suceder buscará impor uma situação contrarrevolucionária para executar o programa golpista, até agora só anunciado. Todos e qualquer lutador social defensor dos interesses imediatos e/ou históricos dos explorados e oprimidos deve estar agora se preocupando em como nosso lado vai reunir forças para resistir e virar a mesa. Para isso precisamos reagrupar a vanguarda que agora se encontra dispersa e desmoralizada.

Parafraseando Trotsky, aqueles que entregam de bandeja as posições conquistadas não apenas serão incapazes de conquistar novas posições como sequer se manterão inteiros.

A explosão do PSTU, assim como foi a do MAS, é mais uma prova do quão falso é o “argumento da quantidade”, tantas vezes esgrimado pela direção do PSTU para justificar que a linha política-programática correta é a que agrupa mais militantes e que todos os demais agrupamentos não passavam de pequenas seitas. Desta vez, o maior partido foi o que se mostrou mais sectário e cego diante da realidade e agora está pagando por isso. Por sua vez, disso não deriva automaticamente que os que romperam tenham consciência desse processo e de qual é o caminho correto a seguir, seus primeiros passos, escritos e falas demonstram isso. Parece que saíram do PSTU mas o PSTU ainda não saiu deles.

Convocamos aos camaradas que honestamente buscam superar tanto o oportunismo burguês desmoralizado do PT, PCdoB e PSOL, quanto o sectarismo pró-imperialista do PSTU e seus satélites, para a tarefa de construção de um partido operário e revolucionário no Brasil, tarefa a qual a FCT dedica, desde suas modestas forças e como mais um embrião, seus melhores esforços.

Notas

1. http://www.pstu.org.br/node/21049
2. Em 1991, ano da contrarrevolução na URSS, um dirigente da então Convergência Socialista, agrupamento morenista percussor do PSTU, embeleza os processos restauracionistas no Leste Europeu. Arquivo (1991): Dirigente da Convergência Socialista fala sobre a queda do Muro de Berlim https://www.youtube.com/watch?v=sX2UdI26UQQ
4. http://www.pstu.org.br/node/5668