sábado, 14 de setembro de 2013

ENTREVISTA – GREVE DOS OPERÁRIOS DA GM DE SJC DE 1985


Para contribuir com a reorganização combativa do operariado hoje a partir do resgate do passado de lutas fabris o Jornal O Bolchevique da Liga Comunista entrevistou o advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos (SJC) na época da greve de ocupação da fábrica da General Motors (GM) em 1985, o Dr. João Neto. O camarada foi contratado um mês após a greve para reforçar o jurídico do Sindicato nas ações de reintegração no emprego dos líderes grevistas (reclamações trabalhistas), ocasião em que também foram contratados outros advogados para fazer a defesa criminal dos trabalhadores (Luis Eduardo Greenhalhg e Dra. Mary), nas ações promovidas pelo Ministério Público Estadual. Ao fazer este resgate histórico não podemos deixar de comparar a vitória de 1985 com a derrota de 2013, pelas mãos da Conlutas/PSTU, denunciando o recente Acordo Escravocrata assinado pela Diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos de SJC com a multinacional dos EUA, que está na contramão desta perspectiva.

JOB – Dr. João Neto, qual foi o motivo da greve ?
JN. – A greve foi deflagrada pela redução da jornada para 40 horas semanais, sem redução de salário. Este foi o principal motivo. A jornada semanal do trabalho do operário horista passava de 60 horas.

JOB – Você falou que o principal motivo da greve foi a luta pela redução da jornada para 40 horas, sem redução de salário. Houve outros motivos?
JN. – Sim. Os trabalhadores sempre reclamaram da violência da GM. Os operários sempre eram importunados pelos seguranças da empresa, os quais os obrigavam a passar por revista (tinham os bolsos e os embrulhos revistados) na saída, onde havia até detector de metais. Os encarregados espionavam os metalúrgicos até nos banheiros.
Além disso, havia sempre a ameaça de demissão. A rotatividade de mão-de-obra. A GM tinha uma “tradição” de no início e no final do ano demitir trabalhadores. Não pagava adicional de insalubridade, nem cumpria a norma de salário igual para trabalho igual. Não fornecia Equipamento de Proteção Individual – EPI, no caso o sapato de segurança. O trabalhador horista, apesar de trabalhar pesado, comia refeição inferior, servida em bandejão, sendo que quando repetia, somente podia pegar arroz e feijão, ainda assim, muitas vezes era censurado. Havia discriminação, por parte da empresa, entre horista e mensalista, sendo que estes tinham tudo do bom e do melhor (restaurante com refeição à la carte, hotel de luxo dentro da própria empresa, viagens pagas para o exterior, etc.). Tal discriminação era uma forma de tentar dividir os trabalhadores, motivo pelo qual a GM impedia aos mensalistas de participarem da Comissão de Fábrica, alegando que tinham um canal direto para reivindicar. O sistema de funcionamento da GM, segundo os metalúrgicos, parecia o de um quartel.

JOB – Quem dirigiu e organizou a greve de 1985?
JN. – A greve foi dirigida pela diretoria do Sindicato, formada por militantes do Partido dos Trabalhadores (da direção majoritária – posteriormente chamada de Articulação e hoje CNB – e da Convergência Socialista), a Comissão de Fábrica, os cipeiros e militantes combativos do Sindicato que formavam o comando da greve.
O comando de greve era muito organizado, determinado e combativo. Havia a “TV Vaca Brava – Canal 40 horas no ar: greve também é cultura.” Por outro lado, a mídia na época, como o “O Estado de S. Paulo”, falava que havia uma suposta “milícia metalúgica.”

JOB – Como foi a greve ?
JN. – A greve foi pacífica por parte dos trabalhadores, mas houve truculência da empresa e da repressão da Polícia Militar, as quais montaram uma verdadeira operação de guerra contra os metalúrgicos, desde o início da greve no dia 11 de abril até o seu término no dia 8 de maio de 1985. Importante frisar que, no dia 25 de abril, a fábrica da GM foi ocupada por decisão da Assembleia dos trabalhadores.
A ação mais radicalizada da greve ocorreu quando o conjunto dos trabalhadores, todos os trabalhadores colocaram os prepostos da GM (chefes, supervisores, seguranças, etc.) num local da empresa, perto do Hotel de Luxo que havia dentro da fábrica, local esse que ficou conhecido como “chiqueirinho”. Os prepostos da empresa chegaram a dormir ao relento.
Em 27 de abril foi formado o Fundo de Greve dos Metalúrgicos de São José do Campos e Região, para dar condições materiais ao desenvolvimento da luta.

JOB – Qual foi a posição da patronal?
JN. – A GM recusou-se a negociar com os trabalhadores. Inicialmente demitiu 93 metalúrgicos (diretores de sindicato, membros da comissão de fábrica, cipeiros e militantes combativos), sendo que ao final demitiu 403 trabalhadores.

JOB – E os governantes da época?
JN. – O governador da época, Franco Montoro, mandou abrir inquérito para apurar “quem eram os criminosos da greve.”

JOB – Qual o balanço da greve de ocupação de 1985 ?
JN. – A greve conquistou a histórica jornada de 44h quando a maioria da categoria trabalhava muito mais do que isto, como dissemos, chegava a 60h enquanto a jornada legal na época era de 48h30 min. e somente com a Constituição Federal de 1988 é que passou a ser 44 horas. A avaliação que faço é a de que a greve foi importante para o desenvolvimento da luta de todos os trabalhadores pela redução da jornada e em particular para a luta do Sindicato contras os patrões, preservando empregos e o fortalecimento da categoria, colocando a questão de quem é o verdadeiro dono da fábrica com a ocupação ocorrida na greve de 1985.
Logo em seguida houve a adaptação do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e da CUT com uma política de conciliação de classes. Assim, o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos tornou-se a vanguarda da Categoria, numa região estratégica onde havia, na época, indústria aeronáutica e de armamentos.

JOB – E o acordo atual do Sindicato com a GM ?
JN. – Primeiramente é preciso destacar que não houve por iniciativa do sindicato nada parecido com a greve histórica que tratamos aqui. O centro de atuação do PSTU (herdeiro da antiga CS) e da Conlutas não foram os métodos da classe e muito menos as ações radicalizados que derrotaram a GM em 1985. O PSTU optou por fazer admoestação aos governos patronais de Dilma, Alckmin e Cury. Com métodos estranhos aos da classe o resultado só poderia realmente ser um Acordo escravocrata, que aumenta a jornada, reduz o piso salarial e permite a demissão de centenas de metalúrgicos.
A diretoria justifica que qualquer acordo nos marcos do capitalismo é nocivo, querendo dizer, como na música de Chico Buarque e Ruy Guerra, que “não existe pecado do lado de baixo do Equador”. Mas na verdade há acordos e acordos. Acordo traidor é injustificável. Se pequenas concessões levam a grandes derrotas, imagine uma traição dessas. Isso tudo demonstra o grau de burocratização e degeneração da diretoria atual, que deve ser substituída pela categoria. Se em 1985 a peãzada pôs os capitães do mato da GM no chiqueirinho e arrancou a histórica redução da jornada, em 2013, com a colaboração da Conlutas, a GM ‘enchiqueirou’ os operários sob a chantagem das demissões e impôs o aumento da jornada, a redução do salário e a demissão de centenas de pais de família.

JOB – O Sr. deseja falar mais alguma coisa ?
JN. – Eu só quero agradecer a vocês e desejar que a categoria supere a atual direção do Sindicato, sem permitir que setores da oposição de direita do movimento, tradicionalmente ligados ao PT e PCdoB, mais ainda ligados a patronal, tomem conta do mesmo. A atual direção se tornou imprestável para o desenvolvimento da luta devido a sua degeneração política, sendo certo que Partido Socialista dos Trabalhadores Unicado (PSTU), ao qual pertence a diretoria do Sindicato, com esse Acordo Escravocrata, com a posição pró-imperialista na Líbia e na Síria, atravessou o rubicão, tornando-se inimigo da classe operária, o que coloca aos seus militantes honestos e revolucionários que rompam com sua direção, visando construir uma partido operário comunista marxista e revolucionário.